Cortesia de historicachilena
Com a devida vénia a Isabel Graes e a Cuadernos de Historia del Derecho, publico algumas palavras.
La figura de este político portugués personifica el humanismo portugués del Siglo XVI. Educado en París, cuando regresa a la Corte portuguesa en 1540 desempeña diversos cargos para el rey, todo ellos relacionados con la cultura: en el archivo real, visitador, reformador de la Universidad de Coimbra, educador de Príncipes o traductor de textos clásicos. Su obra puede clasificarse en tres grupos: textos políticos, textos clásicos y escritos varios. En ellos se traslucen las teorías jurídico-políticas del siglo XVI.
PALABRAS CLAVE: Portugal, siglo XVI, Juan III, António Pinheiro, Humanismo.
(1510?-1582)
Porto de Mós
Cortesia de ucm
I. Introdução
Iniciado em 1521 e caracterizado por momentos de esplendor jurídico e cultural, o reinado de D. João III todavia cedo entraria na sua fase crepuscular. Não era apenas um rei, cujo reinado se revelava agonizante, moribundo, tendo a seu lado permanentemente um leito de morte, era um reino que sucessivamente se via órfão e que desesperado procurava um sucessor.
Ao descrever o período que antecede o desastre de Alcácer Quibir, J.P. de Oliveira Martins (1) define o reinado de D. João III, a quem atribui o epíteto de faraó, como um período onde a ambição deixara de existir, onde havia apenas a «sombra da velhice, o cansaço depois da grande obra, e as consequências dela» (2). Em suma, o reino ávido do poder de outrora, estava agora apático e facilmente se tornava uma presa fácil da corrupção.
É neste contexto e enquanto símbolo de uma corte elitista, receptiva e conhecedora dos ideais do humanismo que surge a figura de D. António Pinheiro.
D. João III
Cortesia de br500tripod
Humanista, estadista, hábil na retórica e na eloquência, mestre de príncipes, capelão e pregador régio, figura presente nos momentos cruciais da política portuguesa do reinado de D. João III ao entrega do poder a Filipe II de Espanha, D. António Pinheiro revelar-se-ia como profundo conhecedor e divulgador do ideário político do século XVII capaz de enaltecer o Venturoso e o Piedoso, mas também persuasivo o suficiente para justificar não só os anseios de um jovem e inexperiente monarca como de fazer aceitar em Portugal o herdeiro de Carlos V.
II. Dados biográficos
Integrado numa corte de validos, de onde se destacam D. Frei Diogo da Sylva, D. Francisco de Portugal, Frei Gaspar do Casal e D. António de Ataíde, evidencia-se o filho de Pedro Braz do Couto e Leonor Alvares Pinheira, nascido supostamente em 1510, na localidade de Porto de Mós. O neto paterno de Braz Annes do Couto, e de Álvaro Fernandes Pinheiro, cedo revelaria uma total aptidão pelas letras o que leva D. João III (3) a decidir enviá-lo para o Colégio de Santa Bárbara, em Paris, onde é reitor Diogo de Gouveia para aí desenvolver os seus conhecimentos na área das ciências humanas.
Tal foi a ascensão do aprendiz que rapidamente se vê a comentar os textos de Quintiliano, situação que não sendo do desconhecimento do monarca português vem a determinar o regresso do humanista ao reino. Não se conhece o momento exacto do seu regresso, apenas se sabe que em 1541 já se encontra em Portugal, pois nesse ano dedica ao monarca, a tradução do Panegírico de Plínio a Trajano. O apreço que o rei lhe tem é notório sendo traduzido com a atribuição de algumas funções, como a de mestre dos jovens fidalgos que então residiam na corte, e em especial a de acompanhar o estudo do príncipe herdeiro, D. João. Tamanha graça régia, não voltaria a ser-lhe concedida, facto que o deixará deveras inconformado.
Capelão, conselheiro e pregador de D. João III, ao lado de Simão Rodrigues, D. Fernando de Meneses e Vasconcelos, D. António torna-se mesmo um dos colaboradores mais próximos do monarca o que lhe permite a presença e intervenção em alguns dos momentos mais determinantes não só da política interna mas também externa neste reinado na medida em que acompanha já a celebração de alguns tratados com a Santa Sé, num período em que os cismas se sucedem. Do mesmo modo, também por alguns autores, como Inocêncio José da Silva, é indicado ter D. António desempenhado as funções de guarda mor do arquivo real, visitador e reformador da Universidade de Coimbra, cujo ministério exercita no ano de 1565, ainda que em relação às primeiras não existam dados conclusivos a esse respeito. Aliás, tudo parece indicar que não terá desempenhado o cargo de guarda mor, pois numa carta que lhe é dirigida de Almeirim por D. Catarina, datada de 19 de Março de 1569 (4) esta pede-lhe notícias do estado em que se achava a crónica de D. João III e lhe promete as cópias dos documentos do arquivo que lhe fossem necessárias, para a prossecução da mesma.
Universidade de Coimbra
Cortesia de agenda
As funções que desempenha na corte não são apenas as de educador de príncipes ou de tradutor de textos clássicos já que são reconhecidos os dotes do exímio mestre na eloquência portuguesa, sendo intitulado o Cícero Português na expressão de Manuel de Faria e Sousa (5), ou de Oráculo daquela idade na classificação de Jorge Cardoso (6). A si se devem algumas das orações de obediência enviadas ao Sumo Pontífice e a intervenção em alguns dos momentos de maior melindre político verificados no reino como sucede em 1562; ou ainda textos em que o teor político acaba por se mesclar com uma redacção epistolar mais pessoal, como ocorre com a prática consolatória que o Humanista dedica ao monarca em virtude do falecimento da sua tão amada filha D. Maria, mulher do príncipe D. Filipe de Espanha.
No entanto é pela construção e divulgação do pensamento político presente em alguns dos seus textos que ora o analisaremos. Os momentos de maior destaque político em que à envolvência teatral, faustosa e aparatosa da cerimónia se associam peças de oratória politica não são muitos, e a sua participação neles denota a importância que o bispo de Leiria tem na corte.
Assim:
- é D. António Pinheiro quem profere a oração solene por ocasião do juramento do príncipe D. João, nas cortes de Almeirim (a 30 de Março de 1544);
- a pregação fúnebre na trasladação dos ossos de D. Manuel e da rainha D. Maria para o Mosteiro dos Jerónimos (1551);
- aquando das exéquias de D. João III;
- à prática na aclamação de D. Sebastião (1557);
- a fala que dirige a D. Catarina para que não se afaste da regência, em 1561;
- a oração nas primeiras cortes celebradas por este monarca, ainda durante a regência de D. Catarina, 1562 (7);
- autoria não só da arenga inicial mas também a resposta que seria proferida pelo Doutor Lopo Vaz (esta segundo a indicação de Bento Farinha);
- a oração dita no capítulo geral da Ordem de Cristo que o rei faz celebrar em Santarém em 1573;
- a pregação na bênção da bandeira por ocasião da partida de D. António Prior do Crato para Tânger (1574);
- a oração de abertura das cortes de Almeirim (1580);
- as orações no auto do levantamento de Filipe II ao trono português e do juramento do príncipe D. Diogo nas Cortes de Tomar (1581).
A sua importância e destaque enquanto figura política no reino rapidamente se revelam. Assim, no ano de 1553 assina como testemunha na escritura pública de renúncia da princesa D. Joana, mãe de D. Sebastião, lavrada em Lisboa a 20 de Dezembro por altura do casamento com o príncipe D. João. Influente, não só junto do monarca mas também da corte, D. António será incumbido pelo infante D. Luís no seu testamento para que proceda à análise do texto daquele documento e verifique se o mesmo está conforme com a razão cristã e segurança da sua consciência, e tudo em que tivesse excedido, ou faltado ao que devia, o corrigisse e emendasse como melhor fosse a serviço de Deus.
Em 21 de Outubro de 1551, prega na trasladação dos ossos d’el rei D. Manuel, sua mulher D. Maria e dos infantes D. Afonso, D. Duarte, D. Maria, D. António e D. Carlos no Mosteiro de Belém; e por determinação de D. João III o fará também nas exéquias deste mesmo rei que se celebrarão no mesmo mosteiro em 14 de Junho de 1557. No âmbito político falará em nome do povo de Lisboa à rainha D. Catarina no ano de 1561 para que não abandone o governo da regência; a que se segue a sua presença nas cortes de Lisboa reunidas a 12 de Dezembro do ano seguinte onde ora em nome do estado eclesiástico e lê a declaração da mesma rainha, a qual se afirma demitir-se do governo da regência.
Vagando o bispado de Miranda pela mudança que D. Sebastião fez de D. Julião d’Alva para seu capelão mor em 1564, o mesmo rei nomeia como bispo daquela cidade o mestre de seu pai. Aí passa a residir, sendo no ano de 1566, convocado pelo arcebispo D. Frei Bartolomeu dos Mártires, que lhe determina na qualidade de seu representante que assista ao concílio de Braga a 23 de Junho (8). Deste período é também conhecido o empenho com que procede a obras de caridade. Tal nomeação visava recompensar D. António por não lhe ter sido atribuído o acompanhamento da educação de D. Sebastião, ao contrário do que D. João III havia feito. A recompensa não o iria satisfazer como faz questão de mostrar à rainharegente (9).
Recorde-se ainda que a este acontecimento não foi alheia a intervenção do confessor de D. Henrique, o jesuíta castelhano Miguel de Torres nem tampouco a da sua camareira mor, D. Joana de Eça, os quais determinaram que a escolha tenha recaído no padre Luís Gonçalves da Câmara, então assistente da província de Portugal em Roma. A 4 de Abril de 1573, estando o cardeal em Salvaterra, este remete uma carta a D. António Pinheiro para que em virtude da bula de motu proprio de Pio V sejam por ele examinados os religiosos e aprovados para confessores. A 8 de Dezembro do mesmo ano profere a oração no capítulo geral da Ordem de Cristo que D. Sebastião fez celebrar em Santarém na igreja de Santa Maria de Marvila; e no seguinte por ocasião da bênção do estandarte que D. António, prior do Crato leva para Tanger, faz a pregação na igreja do Mosteiro de Belém em 15 de Julho.
Cardeal D. Henrique
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Em 12 de Setembro acompanha o mesmo monarca na primeira jornada que este faz a África e aí tece considerações não muito do agrado de D. Sebastião o que parece ter-lhe custado o bispado pois a eleição recai sobre Frei Marcos de Lisboa. No entanto, D. Rodrigo da Cunha refuta a ocorrência de tal episódio (10). Transferido Frei Gaspar do Casal para a igreja de Coimbra no ano de 1579 passa D. António Pinheiro para a mitra de Leiria, que por ele vagara, por nomeação do rei cardeal D. Henrique, de quem era especial valido, sendo um dos juízes que assinaram a anulação da sentença que D. António prior do Crato obteve da sua legitimidade. A sua proximidade relativamente ao cardeal-rei explica o chamamento a Almeirim onde vem a proferir a oração de proposição nas últimas cortes convocadas por este monarca. D. António também tomaria parte na questão que tinha por objecto a escolha do sucessor de D. Henrique sendo notória a sua preferência pelo filho da infanta D. Isabel e de Carlos V ao serviço de quem diz ter colocado lealdade, amor e verdade (como refere numa carta dirigida a Filipe II, que se encontra datada de 21.09.158 (11).
Gravura da batalha
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Assim, e após o desastre de Alcácer Quibir e na qualidade de declarado partidário de Filipe II, cedo se torna alvo de algumas sátiras. Todavia, não altera a opção tomada sendo a sua lealdade reconhecida nas arengas proferidas nas cortes convocadas para a vila de Tomar, bem como no levantamento de rei a 16 de Abril, nas cortes a 20 e no juramento do príncipe D. Diogo a 23 do mesmo mês e ano de 1581.
A data do seu falecimento, tal como a do seu nascimento não são conhecidas, apenas se pode enunciar que terá ocorrido entre 1581 e 1583, pois não se encontra entre os presentes nas cortes que neste ano jurariam o príncipe D. Filipe. Recorde-se ainda que segundo disposição testamentária, era seu desejo ser sepultado na capela de S. Sebastião na igreja paroquial de S. Pedro da Vila de Porto Mós, ainda que o catálogo dos bispos de Leiria informe que jaz na catedral de Leiria.
1 In Temas e Questões, Antologia de Textos, pág. 161 e ss.
2 In História de Portugal, Imprensa nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1988, livro V.
3 Sobre este monarca, vide ANDRADE, Francisco de: Crónica de D. João III, Jorge Rodriguez, Lisboa, 1613; BRANDÃO, Mário: Documentos de D. João III, Casa Tipográfica Alves & Mourão, Coimbra, 1937.
4 In IANTT: parte I do Corpo cronológico.
5 In Comentário de Camões, cantoI, est. 33.Cortesia de Cuadernos de Historia del Derecho, 2008, 15 345-382/JDACT
6 In prefácio do tomo 3 do Agiologio Lusitano.
7 Vide CRUZ, Maria do Rosário de Sampaio Themudo Barata de Azevedo: As regências na menoridade de D. Sebastião, temas portugueses, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 1992.
8 No mesmo sentido se refere Damião de Góis no capítulo 37, parte IV da Crónica de D. Manuel.
9 Vide BPMP, cód. 678; de que há cópia na BGUC, cod. 166, fls. 1-7 e na Biblioteca da Academia das Ciências de Lisboa, ms. Série vermelha 1, 169, fls. 31-36v. Vide ainda a este respeito Diogo Barbosa Machado: Memórias para a História de Portugal que comprehendem o governo d’el rei D. Sebastião, Lisboa Occidental, Officina de António da Sylva, 1736, parte I, livro I, caps. XV e XVI.
10 In Part. II dos bispos do Porto, cap. 39.
11 In BN, códice 3.767, fol. 1v-2; e, Joaquim Veríssimo Serrão: “Fontes de direito para a história da sucessão de Portugal”, in Boletim da FDUC, XXXV, 1960, pp. 195-196. Inocêncio Francisco da Silva: Diccionario bibliographico portuguez, Lisboa, Imprensa Nacional, vol. I, p. 236.
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