sábado, 20 de novembro de 2010

O Princípio: Qualquer Coisa de Paz. «Peço a paz e meus pulsos traçam na chuva um rosto e um pão. Peço a paz e o silêncio»

Cortesia de comuniquerp  

Princípio
Não tenho deuses. Vivo
Desamparado.
Sonhei deuses outrora,
Mas acordei.
Agora
Os acúleos são versos,
E tacteiam apenas
A ilusão de um suporte.
Mas a inércia da morte,
O descanso da vide na ramada
A contar primaveras uma a uma,
Também me não diz nada.
A paz possível é não ter nenhuma.
Miguel Torga, in «Penas do Purgatório»


Qualquer Coisa de Paz
Qualquer coisa de paz. Talvez somente
a maneira de a luz a concentrar
no volume, que a deixa, inteira, assente
na gravidade interior de estar.

Qualquer coisa de paz. Ou, simplesmente,
uma ausência de si, quase lunar,
que iluminasse o peso. E a corrente
de estar por dentro do peso a gravitar.

Ou planalto de vento. Milenária
semeadura de meditação
expondo à intempérie a sua área

de esquecimento. Aonde a solidão,
a pesar sobre si, quase que arruína
a luz da fronte onde a atenção domina.
Fernando Echevarría, in «Figuras»


Peço a Paz
Peço a paz
e o silêncio.

A paz dos frutos
e a música
de suas sementes
abertas ao vento.

Peço a paz
e meus pulsos traçam na chuva
um rosto e um pão.

Peço a paz
silenciosamente
a paz a madrugada em cada ovo aberto
aos passos leves da morte.

A paz peço
a paz apenas
o repouso da luta no barro das mãos
uma língua sensível ao sabor do vinho
a paz clara
a paz quotidiana
dos actos que nos cobrem
de lama e sol.

Peço a paz e o
silêncio.
Casimiro de Brito, in «Jardins de Guerra»

Gandhi
Cortesia de jghignone

Cortesia de O Citador/JDACT