(1521-1577)
Lisboa
Cortesia de fundacaooriente
A Infanta dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma princesa renascentista.
A «imagem» da Infanta na historiografia: o estado da questão.
«A decisão de fazer da infanta D. Maria e da sua acção mecenática tema desta dissertação de mestrado começou a esboçar-se depois da realização de um trabalho para a cadeira anual de História da Arte Moderna sobre a Igreja de Nossa Senhora da Luz.
O complexo urbanístico da Luz, com a igreja, convento e hospital, era, sem dúvida, o pólo mecenático mais conhecido da infanta, apesar de nunca ter sido alvo de trabalhos monográficos. Foi a realização desses, sob o prisma arquitectónico, que nos suscitou um genuíno interesse pela personalidade da infanta D. Maria, incrivelmente descurada pela historiografia nacional.
A intenção que presidiu à análise desta personagem passava, inicialmente, por uma procura exaustiva de fontes, uma vez que existia pouca documentação identificada e analisada sobre a vida e a acção da Infanta, que permitisse fundamentar ideias que, de alguma forma, reflectissem os últimos contributos da historiografia nacional e internacional, designadamente nos domínios da biografia, da historiografia sobre as mulheres e sobre o mecenato. Todavia, a imagem da Infanta se encontrava envolta numa névoa de mistério e falsa piedade que nos conduziu a uma inevitável releitura da produção historiográfica tradicional e moderna.
Cortesia de fundacaooriente
Esta capa quase mítica que envolve a figura de D. Maria começou a ser construída poucos anos depois da sua morte. Julgamos que a personalidade da Infanta foi sujeita a um apagamento propositado:
- pela sociedade contra-reformista, que não podia aceitar uma mulher de acção enérgica e ambições próprias, criando o mito de uma falsa modéstia e da sua extrema beatitude, e pelas circunstâncias políticas do novo governo filipino, cuja, necessidade de legitimação passava pelo esquecimento forçado de uma personagem tão marcante da família de Avis.
As suas relações familiares sugeriam uma actuação pouco discreta no palco europeu. D. Maria era, de facto, vista como uma Habsburgo ainda que dentro dos limites da conveniência de cada proposta casamenteira, e a sua presença, essencialmente devida à sua fortuna, foi continuamente disputada por três coroas:
- a portuguesa,
- a francesa,
- a castelhana.
D. Maria nasceu e formou-se sob a égide renovadora e esperançada da devotio moderna e nem o início e conclusão dos trabalhos de Trento, e as pesadas consequências que produziu na religião e sociedade portuguesas, fizeram alterar substancialmente a sua postura.
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Pelo contrário, julgamos que a Infanta usou uma sólida oposição aos exageros contra-reformistas como arma política contra o seu irmão cardeal D. Henrique, que tão bem os personificava. Esta resistência de cariz religioso passava pela necessidade de D. Maria se afirmar politicamente diferente, mesmo antagónica, de seu irmão, como bem demonstra no programa arquitectónico e iconográfico da Igreja de Nossa Senhora da Luz, que adiante veremos.
A religiosidade não estava ausente do quotidiano da Infanta, como não estava, aliás, de qualquer outra personagem do século XVI europeu. A Igreja e as cerimónias religiosas marcavam a sua presença e importância em inúmeros e distintos acontecimentos públicos e privados, acentuando o seu papel de paladina da moral, mas, também, de legitimadora política que os príncipes usavam conforme as necessidades. Por outro lado, os anos de Quinhentos assistiram a diferentes posturas sobre a forma de encarar a. religião, que encontram posições extremadas entre os momentos pré e contra reformistas». In Carla Alferes Pinto, A Infanta dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma Princesa Renascentista, Fundação Oriente, 1998.
Cortesia de Fundação Oriente/JDACT