Cortesia de alfarrabiodiuminho
«Em 1865 saíram à luz em Coimbra as Odes modernas, de Antero de Quental. Esse livro, além do seu valor intrínseco, possue para o caso de que nos ocupamos o valor especial de ter sido o iniciador do género de poesia de que o volume de Junqueiro nos dá hoje um exemplar esplêndido.
Na nota que Quental juntou aos seu poemas lê-se:
- A poesia moderna é a voz da Revolução, porque a Revolução é o nome que o sacerdote da História, o Tempo, deixou cair sobre a fonte fatídica do nosso século. Como do seu Deus dizia o apóstolo antigo, in eo vivimus et sumus, podemos nós com razão ainda maior afirmar do grande espírito de revolta da nossa idade. Nele e por ele é que somos, por ele e nele é que vivemos. O ar que a nossa sociedade respira, a atmosfera turva e agitada, mas vivificante, em que vai penetrando dia a dia, não é já composta, não, de boas e pacíficas crenças velhas, de resignação, de obediência, de fé sublime... e cega. Outro é o ar! Abrem-se os olhos para ler as contradições dos santos, dos venerandos, dos excelentes livros antigos. Estendem-se as mãos para palpar, sob os vestidos de brocados dos bons ídolos doutrora, o pau de que eram feitos... e o ferro também muitas vezes.
Desde que a Europa ouviu pela primeira vez nas modernas idades proclamar o princípio da Justiça como fonte do direito e da moral, desde o aparecimento do grande livro De juri pacis ac belli, nunca mais a Revolução deixou de presidir aos destinos das nações europeias. Nela viveram e foram. Nela vivem e são. As transformações religiosas, a evolução filosófica, as revoluções sociais e políticas, o progresso das ciências, são as lages da grande via, estrada amplíssima que há 3 séculos os povos europeus seguem pisando em procissão épica.
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Os artistas vão na frente enchendo o ar com suas músicas; e é segundo o ritmo afinado pelo diapasão do grande todo que marcha, é a compasso medido pelo andar do exército divino, é recebendo dos que os seguem a inspiração de que vivem, troando e gemendo, os risos de envolta com as lágrimas, pedindo à alma humana o seu segredo, e aos homens a sua ideia; é assim que os artistas, precursores inconscientes que sentem o que não lhes é dado definir, incitam, preparam, decidem o caminhar ondulado da massa de homens que progride na larga via da História.
A Morte de D. João é o livro de um artista na rigorosa e mais bela acepção da palavra. É-o também de um poeta. Poeta é aquele que adivinha; a poesia é uma religião, ou antes uma metafísica concebida religiosa, imaginativa, não racionalmente. Artista é o que possue o dom de sentir o lado belo das cousas e de as referir com as palavras, notas, cores ou formas, mais adequadas para nos transmitir a energia das suas impressões.
O autor da Morte de D. João é mais artista do que poeta.
Cortesia de auladeliteraturaportuguesa
Qual é o princípio que domina o Universo? pergunta o poeta; A Justiça.
Tal resposta, dá à obra os foros de objecto vivo, são e forte, auroriza a crítica a estudá-la, e manda a todos os que amamos este mundo em que vivemos, a todos os que cremos em suas obras, a todos os que esperamos para os homens um provir de grandeza e de virtude igual ao passado enorme de sombras e de angústias, manda que nos demoremos aqui, à sombra perfumada de uma belíssima florescência artística, a medir este novo marco da estrada da Revolução.
A semente lançada à terra da poesia nacional, vai em 10 anos, produziu agora o seu mais belo fruto». In Artes e Letras, nº 3, 3ª Série, Lisboa, 1874.
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