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Macau Histórico
Em jeito de Introdução
A glória e o martírio de Montalto de Jesus
Os portugueses vão ter a oportunidade de ler na sua própria língua e de julgar uma «edição maldita» cujos exemplares, quando foi posta à venda em Macau, foram apreendidos e confiscados aos que já os possuíam para serem destruídos pelo fogo em auto-de-fé. O seu autor caiu em desgraça. Isto aconteceu em Macau nos idos de 1926, ano em que em Portugal, foi posto fim à I República, substituída pela Ditadura Militar. Era o «28 de Maio». Poucos meses depois pobre e desolado por lhe ter sido negada a justiça que solicitara aos tribunais, Montalto de Jesus morria, em Março de 1927, em Hong-Kong, numa casa de caridade que o tinha acolhido.
Os portugueses vão ter a oportunidade de ler na sua própria língua e de julgar uma «edição maldita» cujos exemplares, quando foi posta à venda em Macau, foram apreendidos e confiscados aos que já os possuíam para serem destruídos pelo fogo em auto-de-fé. O seu autor caiu em desgraça. Isto aconteceu em Macau nos idos de 1926, ano em que em Portugal, foi posto fim à I República, substituída pela Ditadura Militar. Era o «28 de Maio». Poucos meses depois pobre e desolado por lhe ter sido negada a justiça que solicitara aos tribunais, Montalto de Jesus morria, em Março de 1927, em Hong-Kong, numa casa de caridade que o tinha acolhido.
«Por isso, na primeira edição de “Historic Macao”, no capítulo final, o XXVI, escreve (p. 358):
- “(...) Como município (Leal Senado) Macau floresceu durante séculos, com a distinção de ser a mais leal dos colónias portuguesas. Como um município modernizado perfeitamente adaptado às necessidades da época, Macau pode ainda elevar-se e tornar-se na Xangai do Sul da China. Fundada e sempre mantida sem qualquer apoio do Estado, Macau possui, mais do que qualquer outra colónia um direito à autonomia, especialmente tendo em visto que o presente regime é incapaz de fazer deste lugar coisa melhor do que um Monte Carlo do China. Além disso, o estado gravoso das finanças de Portugal poderá eventualmente tornar necessária a alienação das colónias, para satisfazer as obrigações nacionais, como tem sido sugerido frequentes vezes e tão persistentemente divulgado. Mas entre estas colónias existe uma, pelo menos, cujas associações históricas não podem senão tornar num sacrilégio nacional separá-la de um tal marco milenário por considerações pecuniárias. Porém, por um generoso acto, Portugal pode evitar ter de abandonar por completo uma dos mais preciosas lembranças dum «império em ruínas» se a Macau forem concedidos os direitos e privilégios de um município autónomo e colocado sob os auspícios das potências (ocidentais) na China. (...)"
Esta sugestão não teve então, qualquer reacção.
Proclamada a República em Portugal, em 5 de Outubro de 1910, Montalto de Jesus, republicano, democrata e liberal da campanha Republicana, apressa-se a vir a Portugal, decidido a contribuir com os seus conhecimentos e experiência, para a nova era que se lhe apresentava como redentora para o País e suas colónias, particularmente Macau, e as relações luso-chinesas.
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Logo no ano seguinte em 6 de Novembro de 1911, ei-lo a fazer uma conferência-comunicação, na Sociedade de Geografia, a sua tribuna favorita, sobre «Portugal e Macau. Problemas económicos e financeiros». A sessão na Sala Algarve foi presidida pelo Dr. Bernardino Machado, seu presidente e ministro dos Negócios Estrangeiros do I Governo Provisório da República (mais tarde e por duas vezes Presidente da República e Chefe do Governo), secretariado por Ernesto de Vasconcelos e Silva Teles. Montalto de Jesus descreve, séria e francamente a situação económico-financeira em que o regime monárquico deixou Macau:
- “O regime monárquico não só arruinou o País; esmoreceu na alma nacional a confiança o arrojo indispensável à vida comercial, deixando o povo quase morto em marasmo e obscurantismo económico atrasado por séculos e lesado, talvez da maior riqueza que outrora auferia das descobertas e conquistas mundiais (...); urge, pois, encarar sem rebuços a situação (de Macau), pois que o regime republicano inaugura uma época esperançosa para os colónias (...) e a China evolutiva de hoje cria novas condições de muita significação para Macau”.
Enumerando os erros do passado e sugerindo as soluções, “pois que sobreveio a Macau o desânimo, a desolação. A flor das famílias portuguesas emigrava para Hong-Kong e outros pontos da China, em busca do trabalho e pão. O que devia ser o penhor do futuro solidariedade nacional converteu-se, assim, em proletariado das prósperas colónias estrangeiras na China. (...) Macau vegeta hoje comercialmente como mera dependência de Hong-Kong”. (Boletim da Sociedade de Geografia. Lisboa, 29.ª série 1911, nº 12, Dezembro. Existe em separata).
Passado um mês, em 8 de Janeiro de 1912, realiza, no mesmo local, nova conferência, desta feita sobre «O Oriente Modernizado. Horoscópio Internacional», com igual êxito e, tal como a anterior, publicado no respectivo Boletim e também em separata.
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Nas «Duas palavras de apresentação» da separata, explica Montalto de Jesus o seu motivo:
- “Das minhas cogitações sobre o contraste que se nos depara entre alguns mapas antigos e a evolução moderno, surgiu a ideia de dar expressão aos meus estudos e observações orientais (...) Não é menos notável a evolução que se vê fora da Europa. E ao «cais da Europa» poderá vir uma novo glória - a do primeiro passo aos Estados Unidos da Europa. Vê-se, pois, que o assunto justifica esta edição popular da mencionada conferência”.
E ilustra-a com uma bela fotografia sua, de perfil, de caneta em punho, sentado à secretária. (Parceria António Maria Pereira. Lisboa, 1912). Meses depois, ainda em 1912, preocupado com a deterioração da situação do País, publica um opúsculo “O que Será de Portugal” (Livraria Ferreira. Lisboa, 1912), de onde respigamos as suas seguintes afirmações:
- “(...) O perigo nacional é mais económico que político no sentido internacional. Temos políticos a mais; faltam-nos economistas. (...) Fomentar a indústria e o comércio é, sem dúvida, a mais imperativa necessidade do novo regime. (...) Para que tenhamos no futuro bons administradores, é necessário que os preparemos desde já, educando-os nos países mais progressivos e imbuindo-os com o modernismo que deve ser infiltrado num país atrasado e cegado pelo obscurantismo. (...) Para a devida reforma precisa-se, sobretudo, de economistas práticos que não se contentem com teorias e palavrórios mas que constituem enérgicos reorganizadores financeiros, comerciais e industriais. Se nos faltam essas almas salvadoras, importemo-las para a reorganização económica como em épocas menos críticas tivemos estrangeiros para a reorganização militar (...) E, apesar de esforços individuais dignos de muito louvor, quase todas as colónias se caracterizam pela miséria e deficits provenientes de pautas proibitivas, crises agrícolas, revoltas, expedições e falta absoluta de previdência, de sensatez e de facilidade em tudo”.
E Montalto de Jesus faz uma revelação muito importante que explica, talvez, a sua apressada vinda a Lisboa após a proclamação da República». In Carlos Montalto de Jesus, Historic Macao, 1926, Macau Histórico, 1ª edição em Português, 1990, Livros do Oriente, Fundação Oriente, ISBN 972-9418-01-2.
Cortesia da Fundação Oriente/JDACT