Cortesia de 100luz
Beja presente
«E como descrever aquilo que só o ver nos pode conceder: portais de tipo românico, ogivais, manuelinos, renascença e maneiristas; janelas geminadas mudéjares, góticas, manuelinas; simples portas de abrigo, janelas pequenas e chaminés de ressalto das judiaria e mouraria; recantos insuspeitos de arcos e vãos ogivais acessíveis sob passadiços, túneis “sui generis” sobre as ruas e becos; a leitura nítida, impressionante, que de diferentes pontos da cidade se pode fazer e já se fazia naturalmente, desde as primeiras comunidades humanas que por aqui, nesta colina, passaram e habitaram, dos, campos em redor e de um heterogéneo e vastíssimo horizonte a perder-se por centenas de quilómetros...
A Praça da República reflecte, de outro modo, a vida do fórum romano e do Capitólio, lá estão as sedes da Associação de Municípios, Diário do Alentejo, Região de Turismo Planície Dourada, Município, finanças, lojas diversas, cafés, restaurantes, academia de música, o centro de emprego, farmácia e pensão (desactivadas recentemente), seguros, escritórios de advocacia, e um dos mais belos edifícios civis da renascença em Portugal, a “loggia” dos açougues ou mercado público, desde o séc. XVI adaptada para igreja da Confraria da Misericórdia, obra mandada construir por D. Luís, 5º duque de Beja, filho de D. Manuel I.
Cortesia de 100luz
Pensarão os leitores: "Mas que raio, em Beja, é tudo mais importante do que noutro lado qualquer?" Não será, mas diremos, somente, que são muitas as particularidades de Beja, dos seus monumentos e das suas colecções resguardadas e expostas no Museu Rainha D. Leonor, instalado no convento quatrocentista de N. Sra. da Conceição, fundado pelos pais da rainha D. Leonor e do rei D. Manuel I, os infantes D. Fernando e D. Brites, primeiros Duques da cidade, que o foram também de Viseu, após a morte, em 1460, do infante D. Henrique, "O Navegador". Não só o convento é riquíssimo pela sua arquitectura desde o período gótico flamejante, protomanuelino, até aos alvores do século XVI, como pela decoração barroca da igreja, em talha dourada, azulejaria e mármores embutidos, além dum conjunto raro de revestimento azulejar que, pela sua quantidade e estado de conservação, invadindo as galerias do claustro e da sala do capítulo, esta com painéis sevilhanos do início do século XVI, só tem paralelo em Sintra e no solar da Bacalhôa. O Museu tem boa pintura flamenga, portuguesa e espanhola, a óleo sobre madeira, cobre e tela, dos séculos XV a XVIII. Possui todo o género de espólio arqueológico, destacando-se a colecção romana da cidade, cujos elementos arquitectónicos, quaisquer que sejam os estilos, são de facto dos maiores do país e a já mencionada colecção do núcleo visigótico de S. Amaro. No corredor do 2º piso, a relevante colecção arqueológica Fernando Nunes Ribeiro, destaca cerca de 400 espécimes dos onze mil que este arqueólogo condignamente, em 1987, ofereceu à sua cidade. E uma exposição didáctica, abarcando todos os períodos desde a pré-historia recente, com especial incidência nos períodos do bronze, ferro e romano.
Cortesia de 100luz
Ao fundo dessa galeria, a janela gradeada de Mértola, ou de Soror Mariana Alcoforado, traz à memoria as Cartas Portuguesas, consideradas no seu todo pelos estudiosos como uma obra-prima da literatura mundial. Mariana, sua presumível autora, tê-las-ia escrito a um cavaleiro francês, Noel Bouton, conde de Saint-Lèger e marquês de Chamilly, que nos auxiliou durante a guerra da restauração, entre os anos de 1663 e 1667.
Com tempo será necessário visitar as igrejas barrocas (decoração interior) dos Prazeres (um dos melhores núcleos de arte sacra barroca da diocese de Beja) e do Pé da Cruz, as maneiristas (arquitectura) de Santiago (actual Sé) e do Salvador (antiga Sé), a incontornável capela gótica tumular, quatrocentista, do convento de S. Francisco (actual Pousada) e a abóbada sexpartida, ducentista, da capelinha de S. Estevão (actual do sagrado coração de Jesus, no paço Episcopal), enquanto no "Hospital Velho", fundado em 1490, pelo 4º duque de Beja, D. Manuel, retrocederemos quinhentos anos na arquitectura melhor conservada de um edifício de assistência hospitalar.
E como as pessoas são o mais importante do mundo, Beja é uma cidade com vida, convidativa, de bulício muito peculiar; a movimentar-se cada vez mais nos caminhos da cultura e do desporto, procurando nas escolas básicas e universitárias, nos centros de formação profissional, na biblioteca e nos museus, nos certames regionais, nacionais e internacionais (estes menos), o conhecimento crítico, despojado, inconformado e exigente, que lhe permite avaliar e valorizar, a par e passo, a sua singular posição no mundo». In Leonel Borrela, Cartas de Soror Mariana Alcoforado, Edição 100Luz, 2007, ISBN 978-972-99886-7-7.
Cortesia de 100Luz/JDACT