terça-feira, 25 de outubro de 2011

Paulo A. Loução. Os Templários na formação de Portugal: «O próprio Prisciliano foi eleito bispo pelo povo, fenómeno muito comum no “cristianismo celta”, mas pouco tempo depois, em 385 d.C., foi legalmente assassinado pela Igreja de Roma pelo crime de “heresia”. Há muitas semelhanças com os cátaros e, tal como todos os grupos cristãos mais esotéricos, acreditavam na reencarnação»

Prisciliano
Cortesia de suelymonteiro

A Tradição gnóstica na Lusitânia
O Priscilianismo
«Prisciliano aceitava que Jesus Cristo trouxera a mensagem do Espírito, mas dizia que outros divinos mensageiros poderiam iluminar a humanidade». In José Hermano Saraiva.
«Ninguém tem o direito de condenar o que não sabe, o que não lê, o que não quer investigar». In Códice de Wurzbourg atribuído a Prisciliano.

«Não se sabe como surgiu o cristianismo na Península Ibérica. Se S. Paulo cá esteve, conforme o projectou, não o sabemos por ausência de referências. Segundo alguns autores, a nova religião teria entrado pelo Norte de África, o que é muito natural, dado os contactos que se mantiveram com Cartago. O que se sabe é que no século IV surgirá, quanto a nós, o movimento cristão pré-português que mais profundamente marcou a religiosidade da Galiza e da Lusitânia: “o priscilianismo”. De acordo com o nosso ponto de vista, só o domínio da “historiografia católica” e, posteriormente, da “positiva” podem dar algum sentido que ainda hoje reina sobre a história desta confraria gnóstica no nosso território. Moisés do Espírito Santo afirma com razão que, para se estudar o priscilianismo, tem de se recorrer a fontes estrangeiras. Este movimento tornou-se um substrato importantíssimo do cristianismo português que os Templários, a Ordem de Cister, a rainha Santa Isabel, os Franciscanos e a Ordem de Cristo modelaram; e merece ser aprofundado pela comunidade académica que se dedica à sociologia das religiões e à antropologia religiosa.

Agostinho da Silva considerou que a espiritualidade prisciliana ainda hoje está latente no povo português e Jaime Cortesão referiu-se a ela desta forma:
  • «Aqui se forma [na Galiza] em fins do século IV e propaga a toda a Lusitânia e parte da Bética, para persistir durante mais de dois séculos, a heresia de Prisciliano, de profundas raízes celtas e populares, é primeira evidência duma sensibilidade religiosa própria à vertente Atlântica».
O movimento prisciliano tem origem no gnosticismo cristão do Egipto e Ásia Menor.

Cortesia de partidogaleguista 

Prisciliano foi um “leigo galego rico, instruído,de estirpe nobre, com muitos dotes de alma e de corpo; nada cobiçoso, sumamente parco, dotado em ciência profana e cristã”. Parece que estudara no Egipto e na Síria e, quando chegou a Portugal encontrara já um grupo de gnósticos liderados por um mestre: Marcos. Só depois da sua morte o nome de priscilianismo foi dado a este movimento. Os “priscilianos” consideravam-se cristãos e tinham por objectivo regenerar os bispados que “tinham perdido a mística espiritual”. O próprio Prisciliano foi eleito bispo pelo povo, fenómeno muito comum no «cristianismo celta», mas pouco tempo depois, em 385 d.C., foi legalmente assassinado pela Igreja de Roma pelo crime de “heresia”. A sua morte provocou um grande trauma na região e até inúmeros clérigos «ortodoxos» ficaram chocados com este acto de fanatismo tão cruel. A reacção popular contra esta condenação foi de tal ordem, que Prisciliano e os seus discípulos passaram a ser venerados como mártires. Um intenso culto organizou-se em torno do Santuário de Prisciliano, cuja localização é hoje desconhecida.

Foram convocados vários concílios para o rebater, sendo certo que este movimento durou pelo menos até ao Concílio de Braga (561). No entanto, Pelayo afirma que se manteve vivo até à invasão dos mouros. Se assim foi, e dado que os moçárabes, cristãos em território muçulmano, tinham liberdade de culto, a espiritualidade prisciliana manteve-se activa até à fundação de Portugal. Seja como for, algo permaneceu.

Priscilianismo, movimento sócio-político da Galiza
Cortesia de terraetempo

O priscilianismo era uma confraria formada por uma elite muito culta mas que, paradoxalmente, teve uma forte adesão popular. Praticavam o ideal da fraternidade humana, tinham reuniões nocturnas e secretas e o seu ensinamento era iniciático, razão pela qual o voto de silêncio dos aderentes era total. As mulheres estavam completamente em pé de igualdade com os homens, tendo muitas um papel activo nas liturgias, também aqui se poderá ver uma característica de influência céltica. Defendiam o livre-exame e a investigação individual das Escrituras e adoptaram muitos dos evangelhos e textos denominados apócrifos. Estimulavam a criatividade na medida em que, nas suas “ágapes”, convívios fraternais, cantavam hinos e poemas que eles próprios escreviam. O seu ideal era ascético, pelo que abominavam o prazer sensual e, como todos os gnósticos, tinham como objectivo libertar a alma dos desejos da personalidade exterior. Têm muitas semelhanças com os cátaros e, tal como todos os grupos cristãos mais esotéricos, acreditavam na reencarnação. São Jerónimo considera Prisciliano como um “exímio estudioso do mago Zoroastro”, o que é natural dada a influência que a tradição da Ásia Menor exerceu sobre a “gnose”. A astrologia, como ciência que estuda a ligação entre o homem e o Cosmos, era muito estudada, dando origem a um calendário litúrgico muito exacto, baseado no movimento dos astros». In Paulo Alexandre Loução, Os Templários na Formação de Portugal, Edições Esquilo, 9ª edição 2004, ISBN 972-97760-8-3.

Cortesia de Esquilo/JDACT