domingo, 2 de outubro de 2011

Safo, a poetisa de Lesbos. «Não me cante canções do dia, pois o sol é inimigo dos amantes. Cante as sombras e a escuridão, cante as lembranças da meia-noite. Se a morte fosse um bem, os deuses não seriam imortais»

Cortesia de wikipedia

Perante a cólera nada é mais conveniente do que o silêncio

«Safo é considerada uma das primeiras autoras de literatura da Europa. Ela representa a perfeição em forma de verso. Uma mulher que na sociedade grega, sofria de todos os preconceitos numa época em que as mulheres não tinham acesso a este tipo de arte.
A grande poetisa nasceu na ilha de Lesbos por volta do século VII a.C., e exercia o seu papel de esposa e de mãe, como era de se esperar de uma mulher das polis helenas. Contudo encontrou tempo para criar 9 volumes dedicados à poesia lírica, que foram reunidos posteriormente na biblioteca de Alexandria.
A fama como poetisa transcendeu o espaço restrito de mulher num mundo de preconceitos chegando até nós. Um dos poemas foi encontrado num invólucro de papiro junto a uma múmia egípcia, demonstrando a dimensão da propagação das suas poesias pelo mundo.

Cortesia de wikipedia

A linguagem viva de Safo é geradora de linguagem. A partir da ideia de que Safo mantinha uma sociedade feminina para as moças de Lesbos surge o emprego actual da palavra “lésbica”, utilizada pela primeira vez em língua inglesa em 1890. André Lardinois, afirma num artigo publicado por Bremmer, que as evidências são muito escassas para se atribuir de forma taxativa um comportamento homossexual a Safo. Afirma o investigador que nos versos estudados, não se encontram claras indicações de práticas homossexuais. Há, contudo, que se analisar o facto de que não necessariamente. Se ela fosse homossexual, deixaria indícios relatados na sua poesia.

A descrição que apresenta das jovens como atraentes, até mesmo a seus olhos, pode ser lida como um elogio justificável e necessário num canto nupcial. Safo desenvolve nos poemas uma visão cultural da mulher com a valorização do corpo feminino, na qual se diferencia numa ordem prática do que é exposto pela sociedade masculina, afirma, por outro lado, Paiva Gomes.

Cortesia de wikipedia

Vieste, e fizeste bem. Eu esperava,
queimando de amor; tu me trazes a paz.
Safo

«A conexão viva da poesia de Safo, especialmente nas canções nupciais e amorosas, com os anseios das jovens companheiras que se agrupavam em torno dela adquire uma importante significado. Refere Jaeger que “tudo se passa como se o espírito grego precisasse de Safo para dar o último passo no mundo da intimidade e do sentimento subjectivo. Os gregos deviam ter sentido isso como algo de muito significativo quando, no dizer de Platão, honraram Safo como a “décima musa”. Safo é singular, não há referência a outra mulher que na arte tenha se igualado a ela. É comum nos versos de Safo a descrição de experiências íntimas com vivo realismo. Exemplo disso encontramos numa canção composta por ocasião das bodas de uma de suas discípulas:
  • Basta-me ver-te e ficam mudos os meus lábios, ata-se a minha língua, um fogo subtil corre sob a minha pele, tudo escurece ante o meu olhar, zunem-me os ouvidos, escorre por mim o suor, acometem-me tremores e fico mais pálida que a palha; dir-se-ia que estou morta.
Safo, por meio de uma linguagem pessoal, confere sentimento profundo aos versos e consegue expressar uma forte individualidade através da grande força do amor». In Zilma G. Nunes

Cortesia de zilmanunes

Da beleza
Uns dizem que é uma hoste de cavalaria, outros de infantaria;
outros dizem ser uma frota de naus, na terra negra,
a coisa mais bela: mas eu digo ser aquilo
que se ama.

Muito fácil é tornar isto compreensível
a toda e qualquer pessoa: ela de longe
à raça humana sobrelevava em beleza, Helena,
o nobre marido

Deixou e foi a navegar até Tróia.
Nem da filha nem dos pais amados
quis de todo saber, mas arrastou-a…
(…)
… agora de Anactória me lembrei,
embora ela esteja ausente:

eu queria antes ver o seu amoroso andar
e o brilho refulgente do seu rosto
do que ver os carros e a infantaria dos Lídios
com suas armas.


Quando eu te Vejo
Quando eu te vejo, penso que jamais
Hermíone foi tua semelhante;
que justo é comparar-te à loura Helena,
não a qualquer mortal;
oh eu farei à tua formosura
o sacrifício dos meus pensamentos,
todos eles, eu digo, e adorarte-ei
com tudo quanto eu sinto.

O Amor
O amor, esse ser invencível, doce e sublime
que desata os membros, de novo me socorre.
Ele agita meu espírito como a avalanche
sacode monte abaixo as encostas. Lutar
contra o amor é impossível, pois como uma
criança faz ao ver sua mãe, voo para ele.
Minha alma está dividida: algo a detém aqui,
mas algo diz a ela para no amor viver…

O homem belo só o é quando o contemplam, mas o homem sábio é belo mesmo quando ninguém o vê

In Frederico Lourenço, Poesia grega: de Álcman a Teócrito, Lisboa, Livros Cotovia e Frederico Lourenço, 2006.

Cortesia de Wikipedia/Livros Cotovia/JDACT