segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Tesouros da Literatura e da História. Obras de Jerónimo Corte Real. Introdução: «Foi o fecundo autor de três longos poemas narrativos, dois de tema heróico, e o terceiro de tema dramático, além de composições de outro género insuficientemente conhecidas. Damião de Góis fez dele menção saliente»

Cortesia de bnp

Introdução
«Jerónimo Corte Real, tem sido histórica e tradicionalmente considerado entre os «épicos» portugueses de mais vulto, uma vasta gama de poetas, que a actualidade já não lê ou quase do todo esqueceu. Não lê, porque os tentos são de difícil acesso, e as antologias não lhas concedem lugar favorável, a despertar curiosidade ou moderado conhecimento. Estão relegados na prateleira baixa da história literária. E nesta posição muito secundária, nem tudo como obra de engenho, nem todos como cultores da arte poética, merecem o desagradado olvido, a penumbra densa que os envolve.
Jerónimo Corte Real foi o fecundo autor de três longos poemas narrativos, dois de tema heróico, e o terceiro de tema dramático, além de composições de outro género insuficientemente conhecidas. O poeta, ilustre figura das letras, descendia de uma nobre família com estreitas ligações a velhas estirpes da aristocracia peninsular e portuguesa, os Corte Reais, que em dias do rei, D. Manuel se haviam grandemente ilustrado. O cronista do rei Venturoso fez deles menção saliente.

Com efeito, no período áureo dos descobrimentos marítimos, os Corte Reais notabilizaram-se como audazes buscadores de novas terras. No princípio do verão de 1500, Gaspar Corte Real, filho de João Vaz Corte Real, «...homem aventureiro, esforçado, & desejoso de ganhar honrra…», partiu da Lisboa a descobrir «...perá banda do Norte». Nesta viagem achou uma terra muito fresca e de grandes arvoredos a que pôs nome de Terra Verde, costeando uma boa parte dela. Desejoso de obter melhor conhecimento daquelas partes que visitara, Gaspar Corte Real fez-se de novo ao mar, mas a fortuna não o acompanhou. A falta de qualquer nova do navegador, «tardança e má suspeita da sua viagem», levaram seu irmão Miguel Corte Real, porteiro-mor de el-rei, a empreender uma expedição de busca, partindo de Lisboa a 10 de Maio de 1502, em duas naus. Também este lastimosamente se perdeu.

Cortesia de bnp

O infortúnio dos seus dois devotados servidores foi muito sentido pelo rei, D. Manuel,, mandando à sua custa procurá-los, mas nunca se alcançou qualquer notícia. Suspeitou-se que teriam desaparecido naquela Terra Verde, à qual então se pôs o nome de Terra dos Corte Reais.
Ouçamos agora, expressamente o cronista manuelino:
  • «Tinham estes dous irmãos Gaspar, & Miguel corte Real, outro irmão mais velho qlles, a que chamauão Vasqueanes corte Real, q era veador da casa delRei, do seu conselho, capitam, & gouernador das ilhas de sam George, & terçeira, & alcaide mor da çidade de Tauilla, muito bom caualleiro, bom Christão, home de singular exemplo de vida, & de muitas esmollas publicas, & secretas, cujo filho herdeiro he Emanuel corte Real, também do conselho delRei, & capitã das mesmas ilhas q aho presente viue. Este Vasqueanes corte Real, nã se podedo persuadir q seus irmãos erã mortos, nesta anno de M.D.III, determinou de co nãos à sua própria custa hos ir buscar, mas tendo elRei por excusada sua ida, lho não quis consentir, nem se proçedeo mais neste negocio, por se ter por desnecessária toda há despesa que se nisso mais fezesse».
Apartemos deste excerto de Damião de Góis, os nomes de Vasqueanes Corte Real e de seu filho, Manuel Corte Real, porque o primeiro foi avô, e o segundo foi pai de Jerónimo Corte Real, o poeta. Vasqueanes Corte Real, primogénito do navegador João Vaz Corte Real, sucedeu a seu pai nas capitanias de Angra e da ilha de S. Jorge em 1497, direito que lhe foi confirmado em 1522. Naquele ano de 1497 «...já aparece como Vedor da Fazenda Real» afirma Ernesto doo Canto na importante monografia sobre os Corte Reais, contudo sem expressa anotação documental.


Cortesia de bnp

Que o era de facto no ano seguinte, atesta-o Damião de Góis, relevando o nome de Vasqueanes Corte Real como veador da casa de el-rei entre os principais acompanhantes do rei D. Manuel e da rainha D. Isabel, quando a 29 de Março de 1948 os soberanos portugueses saíram de Lisboa para serem jurados herdeiros dos reinos de Castela e do Leão.
No seu vasto trabalho genealógico, deixou dito Ernesto do Canto, que Vasqueanes Corte Real, «...prestou relevantes serviços em tempo do Conde de Tarouca, Prior do Crato, derribando e captivando em 1495, Ali Barrxno, chefe Mouro». A fonte aduzida pelo erudito investigador açoriano é a Crónica de D. Manuel, Parte I, cap. 12. Que Vasqueanes tenha andado nas «partes dalém» combatendo os mouros não põe forçosa dúvida, porque em seu tempo era essa a condição geral dos cavaleiros fidalgos. Porém, lido e relido aquele capítulo 12 do omponente monumento historiográfico do cronista manuelino, sempre bem informadoi dos sucessos de África, não se nos depara aí o nome de Vasqueanes Corta Real, derribando e cativando o alcaide de Xexuão, Barraxe, «… grão senhor entre hos rnouros» quando estes em 1495 vieram correr ao campo de Arzila. O alcaide Barraxe, Alí ibne Ráxede, levou uma vida inteira de impetuoso combatente contra os portugueses, e um vez foi derribado e cativado «… com cinquo grandes feridas …», mas isto aconteceu em Outubro de 1487, e quem no-lo refere é Rui de Pina. Barraxe viera correr a cidade de Tânger, de queânger, de que era capitão e governador João de Meneses, anos depois, concretamente em 1499, elevado a Conde de Tarouca, mas o cronista não assinala quem pôs a lança ferindo o alcaide mouro (VII)». In Tesouros da Literatura e da História, Obras de Jerónimo Corte Real, introdução de Lopes de Almeida, Lello & Irmão Editores, Porto, 1979.

Cortesia de Lello e Irmão/JDACT