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«A raia portuguesa sempre conheceu a proliferação de comunidades judaicas. De facto a proximidade com Castela tornava-a foco de atracção duplo:
- Por um lado, permitia aos seus habitantes desenvolver todo um comércio, normalmente, clandestino, com o reino vizinho;
- Por outro, era um lugar de refúgio para judeus e conversos castelhanos quando os diversos levantamentos populares antissemitas e após a entrada em funcionamento da Inquisição (maldita) em Castela, inicialmente na Andaluzia e Estremadura.
Nisa, Castelo de Vide, Crato, Fronteira, Sousel, Portalegre, Campo Maior, Elvas eram alguns dos concelhos onde os judeus se fixaram e constituíram as suas comunas. Algumas proviriam do século XIV como as de Portalegre e Elvas.
A onomástica judaica apresentava-se constituída por nome próprio e de família. O primeiro era normalmente um nome bíblico, distinguindo-se por isso da onomástica cristã:
- Abraão, Judas, Moisés, Salomão ou Soleima, a forma arabizada deste nome, José ou Yucef, Isaac, Jacob, Samuel, Isaías, Meir, Haim, Jonas, Abel, Naaman, etc.
No entanto, por vezes, surgiam excepções pouco vulgares como Vidal, Vivas, Tristão que, neste último caso, patenteava uma influência dos romances de cavalaria entre os membros das comunidades desta região alentejana. Os nomes femininos são menos variados, talvez porque mais desconhecidos:
- Sol, Luna, Dona, Jamila, Benvinda, Mazalto, Oiro, Miriam, Cinfa, Ester, etc.
Uns e outros eram contudo bem diferenciados da onomástica cristã.
Os apelidos de família tinham uma origem múltipla; hebraica, árabe, toponímica e qualificativa. Vejamos alguns exemplos:
- Cohen, nome hebraico que significa “sacerdote” é um dos apelidos mais vulgarizados em toda a Península e na região que estamos a tratar. Assim encontramo-lo em Cabeço de Vide, Castelo de Vide, Elvas, Fronteira e Portalegre. Com idêntica origem temos os Levi no Crato e em Elvas, os Baruc, Neemias e Abeatar de Portalegre, os Benjamin, os Nasy e os Ambram de Elvas.
Muito correntes eram os apelidos de origem toponímica a relembrar para os vindouros a origem da família e encobrindo o primitivo nome desta. Tal foi o caso dos Franco ou Safarti, na palavra hebraica, em Castelo de Vide, Crato e Elvas, os Saragocim, Soriano, de Illescas, de Cuélar, em ERlvas, ou de Ávila, de Medina, de Ceuta, os Alcalá e Najarim, em Portalegre.
Os qualificativos são igualmente muito comuns, radicando alguns certamente na própria profissão, como os Ferro e Pimenta de Elvas, ou os Alcaides de Fronteira; outros em características pessoais, como os Ruivo de Elvas, os Crespins e Negrim de Castelo de Vide, os Cabeção de Portalegre, os Amigo e os Alegre de Elvas, etc. Esta onomástica não desaparecia totalmente como baptisno forçado de 1497, permanecendo na tradição sob a forma de alcunha. Foi o caso de Gaspar Álvares ROQUE, o gago, tecelão de Portalegre, certamente descendente dos judeus Roque aqui residentes na centúria anterior ou Á1varo Gonçalves CABEÇUDO quem sabe se deturpação do nome de Cabeção, família judaica também aqui moradora. Outros exemplos encontraríamos como Manuel NEEMIAS, de Portalegre, Afonso Álvares PINTADO e seus filhos, Diogo Álvares SORIANO, Lopo Vasques SARAGOCIM, Luís Gonçalves CAVALEIRO e seus irmãos, ou Luís Gonçalves PACHE, todos moradores em Elvas.
Infelizmente sabemos muito pouco sobre estas comunas, sua localização, habitantes e magistrados, pois a documentação régia não ê suficientemente abundante sobre eles. No entanto vamos tentar esmiuçar o pouco que conhecemos». In Maria Ferro Tavares, Judeus e Cristãos Novos no distrito de Portalegre, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Acta do I Encontro da História Regional e Local, Setembro de 1987.
Cortesia da FCSHUNL/JDACT