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Maurício de Braga e Diego de Compostela
«Se a história bracarense pode explicar de certo modo a sua atitude neste caso, o papel que tomou em Roma não tem nada que ver com Portugal. Por isso o que nos ocupa aqui são apenas as fatais consequências quo o seu modo de agir teve para Braga e Portugal.
Quem não deixou passar a excelente ocasião foi Diego de Compostela. Ainda na Primavera de 1118 manda dois cónegos a Gelásio II para negociar a transferência do arqui-episcopado de Braga para Santiago. O Papa, que fugira de Roma diante de Maurício e seus sequazes, estava disposto sem hesitação a satisfazer os desejos de Compostela, mas em troca duma subvenção pecuniária adequada. Tinha chegado enfim para Diego o grande momento da realização dos seus sonhos. Imediatamente tratou de corresponder à vontade do papa, a quem mandou dois clérigos para Roma com 120 onças de ouro. A metrópole de Braga, porém, indispensável para a independência de Portugal, parecia perdida.
Mas as coisas tomavam agora uma evolução inesperada. O rei Afonso I de Aragão, inimigo declarado de Diego, dera ordem à sua gente para se apoderar, onde pudesse, de todos os enviados compostelanos; e quando os dois clérigos de Diego tentavam atravessar clandestinamente o Aragão, foram reconhecidos e presos, ainda em Castrojeriz, pelos “praedones Aragonenses”, que lhes levaram as 120 onças de ouro. Um deles conseguiu libertar-se, mas quando chegou junto do Papa com as mãos vazias, já, não era questão dos desejos compostelanos.
Não há dúvida: Portugal tinha motivos para erguer um monumento aos «ladrões aragoneses». Porque a única ocasião em que Diego se podia apoderar dos direitos de Braga perdera-se. Passou meio ano até poder mandar nova legação com mais dinheiro à cúria. Mas aqui encontrou uma situação diferente. Gelásio II falecera e o seu sucessor, Calixto II, a quem todas estas controvérsias não eram tão familiares como a Gelásio, foi prudente, não se atrevendo a tomar a responsabilidade duma medida tão grave. Além disso, era tio do jovem rei Afonso VII de Castela e, precisamente naquela altura, haviam denunciado Diego como inimigo do rei. Assim, o papa não fez a vontade ao bispo de Santiago.
Diego, contudo, não se conformou com esta afronta. Trata agora de obter pelo menos os direitos de Mérida, a metrópole ‘lusitana’ situada no sul mourisco, que não tinha naturalmente para ele o mesmo valor que Braga. Consegue realmente os seus fins em 26 de Fevereiro de 1120, mas com a restrição de a nova dignidade lhe ser conferida apenas até à reconquista e de não poder usar o título de arcebispo. Em compensação, Calixto entregou-lhe a dignidade de legado das províncias de Braga e Mérida.
Com isto, estava salva a metrópole de Braga, depois de ter sofrido imensos prejuízos. Segundo a decisão do cardeal legado Boso, Coimbra passou a pertencer a Mérida e a ser administrada por Compostela. Ao mesmo tempo foi confirmada a isenção do Porto. Entre as dioceses que existiam então em Portugal já não havia união eclesiástica. Tinha-se perdido virtualmente o que o conde Henrique e o arcebispo Geraldo haviam conseguido: a igreja portuguesa.
Durante ostes acontecimentos, Maurício continuava como antipapa em Roma ou Sutri, enquanto os legítimos papas Gelásio e Calixto residiam em França, no exí1io. É natural que Maurício tivesse procurado partidários entre os seus conhecidos portugueses. Temos dele uma carta dirigida a Gonçalo de Coimbra. Mas não foi bem-sucedido. É verdade que nas fontes narrativas portuguesas só encontramos depoimentos favoráveis à sua pessoa, mas o clero ficou fiel aos papas legítimos, pelo menos Hugo do Porto, que teve até uma entrevista com Calixto II, e Gonçalo de Coimbra, como partidário de Bernardo de Toledo. Braga, também não aderiu ao cisma». In Carl Erdmann, O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa, Universidade de Coimbra, Instituto Alemão da Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, 1935.
Cortesia de Separata do Boletim do Instituto Alemão/JDACT