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«Em Espanha, como em todos os grandes países, é sempre popular a anexação dum território. O monarca que puder levar Portugal em dote será aceite por todos os partidos.
Um príncipe português satisfaria assim, ao mesmo tempo, a política francesa e os desejos espanhóis.
Demais, é possível que, pela sua coadjuvação neste negócio, a França possa ressuscitar com vantagem a velha questão da fronteira do Ebro.
Prim, nas últimas declarações feitas ao Congresso, deixa claramente entrever que uma união com a coroa portuguesa é o último plano sobre que demora as suas atenções. O não se poder eleger monarca senão pela maioria dos membros das Cortes, torna impossível toda a candidatura que não puder pagar a sua subida ao trono com quatro milhões de súbditos…
Vejamos agora os motivos pessoais de Prim e de Saldanha.
O príncipe Carlos de Bragança tem uma longa menoridade, e a História aí está para mostrar se há ambição e interesses nesses dois chefes do movimento que analisamos. Serão eles, durante essa menoridade, os chefes da Península Ibérica. Prim terá assim um rei para Espanha que o não possa expulsar do poder; Saldanha não precisará, para satisfazer à sua opulência e às suas prodigalidades, de vender todos os dias por embaixadas ou por empréstimos o seu acatamento e o seu respeito às leis.
Sejamos justos: em Saldanha ainda imperam outros motivos. A situação de Portugal não se resolve pela monarquia e pela independência. As nossas coisas só têm uma cura: - é a República. Este jornal não se tem limitado, cremos, a dizê-lo gratuitamente. Assim, pois, para Portugal só há duas soluções: a República, a queda e a liquidação da Monarquia, ou a venda a Espanha.
Nós pregamos hoje a primeira, e combateremos por ela amanhã. Saldanha adoptou a segunda.
Nós propomos a formação de uma nação independente, livre, rica, próspera, exemplo para o Mundo. Saldanha salva o país matando-o, cura as nossas finanças incorporando-as no orçamento de Espanha, onde vê para si uma larga verba: não é um ministro de Portugal, é o governador de uma província espanhola.
Não há, já o dissemos, senão duas soluções: a República ou a anexação à Espanha monárquica.
Só nós, assim, podemos levantar o grito de combate contra o plano ibérico, porque só nós temos um plano salvador para este país. Os jornais da oposição, que têm clamado contra a venda da pátria, não têm direito para o fazer. Que solução dariam eles às nossas finanças e à nossa situação? Que podem fazer com a monarquia?
É preciso arrasar pela base os velhos edifícios e erguer, no lugar deles, melhor monumento. DESTRUAM ET AEDIFICABO: eis a nossa divisa. Saldanha vende Portugal; mas a monarquia e os ministérios constitucionais haviam de deixar que lho tomassem das mãos inertes e incapazes (234)».
De “A República”, 1870, nº 6
In J. Oliveira Martins, Páginas Desconhecidas, O Golpe Militar de 19 de Maio de 1870 e a Ditadura de Saldanha, Seara Nova 1948, Lisboa.
Continua
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