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«A fragmentação da ‘Questão Social’ em vários ‘problemas sociais’; e
criação de instituições e serviços especializados, com o objectivo de atenderem
a esses problemas, legitimados na sociedade burguesa, sob a óptica da
individualização e da psicologia das relações sociais; o fraccionamento da
intervenção política em políticas económicas, industriais e sociais, exigem a
emergência de novos profissionais. As ‘profissões sociais’ surgem nos finais do
século XIX e princípios do século XX para regularem essas políticas bem como o
acesso aos serviços e às várias medidas de política, agora criadas; elas davam,
assim, uma resposta à situação das classes trabalhadoras e contribuíram
simultaneamente para atenuar as tensões sociais. A profissão de Serviço Social
insere-se, deste modo, na divisão sociotécnica do trabalho, sendo socialmente
determinada por esta etapa do desenvolvimento capitalista.
Em Portugal, a laicização da sociedade associada ao positivismo e ao
cientismo reflecte-se no desenvolvimento das ciências médicas e sociais, na
constituição de serviços sociais, públicos e privados, na génese e na
emergência do Serviço Social e no movimento de o instituir nesses serviços. Por
outro lado, o processo de recristianização da sociedade portuguesa e o
corporativismo condicionaram todo o movimento de institucionalização do Serviço
Social, quer ao nível da fundação das suas escolas, quer ao nível da formação e
do desenvolvimento da profissão até 1945.
O positivismo e o laicismo constituem o movimento cujo primeiro alvo é
o de combater a influência da Igreja na política e na sociedade portuguesa. O
significado do termo laico, utilizado em Portugal em princípios do século XX,
segundo Fernando Catroga, concerne ao ‘movimento que pretendeu não só demarcar as
esferas da sociedade civil e religiosa, mas também contrapor a esta última uma
concepção dessacralizadora do universo, da história e do homem, em ordem a
superar e substituir a religião em todas as suas dimensões: cultural, institucional
e sociabilitária’.
A ‘questão religiosa’ assume neste contexto uma dimensão particular,
ainda reforçada com os movimentos republicano e socialista que se organizam na
década de setenta do século XIX.
Ainda segundo Fernando Catroga, a par da descristianização
caracterizada pela ‘recessão da prática religiosa do cristianismo, recessão do
domínio do clero sobre a vida e as práticas cristãs e do controlo confessional
sobre avida social dos crentes, recessão do sagrado como quadro de referência
da vida profana e dos valores normativos em detrimento da liberdade de pensamento
e da acção’ e da secularização que se traduz na dessacralização da razão, da
natureza, do homem e do tempo histórico, que surge como uma contestação militante
apostada em pôr em causa a força institucional, cultural e simbólica do
cristianismo e do catolicismo, assiste-se à laicização que representa uma versão
mais militante e radical destas práticas.
O laicismo, na vertente anticlerical e anti-religiosa, ‘postulava a
invocação da ciência entendida como a forma definitiva do saber humano’ e como
meio explicativo do universo.
A Ciência utilizada, sobretudo como uma ideologia, contribuía para a
desalienação dos homens, constituindo o cientismo um dos principais pilares do
laicismo. A crença na ciência, pautada nas grandes descobertas científicas e
nos sucessos da Física, da Química e da Biologia, estende-se à sociedade, acreditando-se
que a evolução da humanidade atingiria o estádio em que todos os fenómenos,
incluindo os de carácter social, teriam uma explicação baseada nos cânones da
teoria do conhecimento». In Alcina Martins, Génese, Emergência e
Institucionalização do Serviço Social Português, Fundação para a Ciência e a
Tecnologia, Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, ISBN 972-31-0832-1.
A amizade de Julieta Feliz
Cortesia da F. C. Gulbenkian/JDACT