quarta-feira, 18 de julho de 2012

Portugal e a China. Uma Ponte com 500 anos. Testemunhos de uma convivência. Instituto Camões. «… em 1488, Bartolomeu Dias dobra o cabo da Boa Esperança, provando que as águas do Atlântico e do Índico comunicam entre si. Em 1498,Vasco da Gama chega a Calicute, Índia, 65 anos depois de Zhang He lá ter morrido»


Junco chinês
jdact

Portugal encontra a China
«O minúsculo Portugal, a imensa China. Colocados nos extremos da grande massa continental euro-asiátíca, protagonizaram os primeiros capítulos da globalização, esse processo de contactos civilizacionais, de trocas comerciais que terá começado em 1498, com a descoberta por Vasco da Gama do caminho marítimo para o Oriente.
Desde então que o fluxo geral da História Universal girou nesse sentido, de Ocidente para Oriente, com todas as relativizações e mal-entendidos que o processo gerou. Mas as coisas poderiam ter-se passado exactamente ao contrário, até era de toda a lógica que isso assim tivesse acontecido, o Oriente a caminho da "descoberta" do Ocidente. Ainda hoje não há explicação cabal para que tal não ocorresse.
Pode dizer-se que a "Expansão" chinesa começa quase ao mesmo tempo que a Expansão portuguesa. Se, em 1415, com a conquista de Ceuta, se dá o início da grande caminhada lusa pelo mundo, dez anos antes, um eunuco ao serviço do imperador da China, Zhang He (1371-1433), realizava a primeira de sete viagens para Ocidente. Com navios maiores do que as caravelas, tripulações de dezenas de milhares de efectivos, preparação técnica e conhecimentos de marear muito superiores aos da Europa da altura, Zhang He não terá avançado mais do que aquilo que é hoje a costa norte de Moçambique. Depois, morreu, em Calicute, 65 anos antes de o Gama lá chegar. As especulações continuam sobre porque é que a China abandonou as suas expedições marítimas, porque é que Zhang He não teve continuadores. Desde logo, não havia proselitismo religioso na empresa chinesa. Depois, nem o imperador nem a corte estavam directamente empenhados no comércio, actividade que era desprezada pelas elites. Ocupação territorial, também não estava na agenda. Quanto a curiosidade científica por novos lugares e novas gentes, ela era também nula, para quem se achava "o centro do mundo". Então, para que zarpou Zhang He?
Para impressionar os Estados que se serviam do sistema de comércio tributário comandado pela China, para conseguir novos súbditos para o sistema. Por outras palavras, desde que os povos vizinhos aceitassem enviar regularmente uma embaixada de tributo ao imperador (subentendendo a sua superioridade divina), com presentes o mais raros e valiosos possível, a China ficava satisfeita. Quando Zhang He chegou à costa oriental da África, deparando-se com a falta de Estados organizados, logo sem tributários potenciais que impressionar, a missão chegava ao fim. Esta pode ser, como tantas outras, a explicação.
De qualquer modo, a História fez o seu fluxo de Ocidente para Oriente, mas tudo o que se vai ler a seguir terá que ser visto com olhos de quem pense:
  • as coisas poderiam ter-se passado exactamente ao contrário, uma armada chinesa bem poderia ter aparecido um belo dia no estuário do Tejo, em meados do século XV...
Mas os factos são que, em 1488, Bartolomeu Dias dobra o cabo da Boa Esperança, provando que as águas do Atlântico e do Índico comunicam entre si. Em 1498,Vasco da Gama chega a Calicute, Índia, 65 anos depois de Zhang He lá ter morrido. Afonso de Albuquerque conquista Ormuz, no estreito que liga o Índico ao Golfo Pérsico, (1507), Goa (1510) e Malaca (1511). Os portugueses passam a controlar o fluxo marítimo do Oriente para o Mediterrâneo, em detrimento do monopólio até então exercido pelo Império Otomano e pelo seu principal interface ocidental, Veneza.
Quando Diogo Lopes Sequeira partiu à descoberta de Malaca, em 1508, levava instruções escritas e precisas de Manuel I sobre o Grão Cataio, a lendária China de que Marco Pólo e outros viajantes europeus da Idade Média tinham falado, o monarca português queria saber de onde vinham os "chins", se era longe, quantas vezes por ano iam a Malaca e outros locais onde comerciassem, quantos barcos utilizavam, como estavam preparados militarmente, o modo de vestir, se eram cristãos, se no meio deles havia muçulmanos, como eram governados, etc.

Desenho do relógio de Tomás Pereira, 1650

Logo nos portos do Norte de Samatra (Sumatra, actual Indonésia), que foram escalados antes da chegada a Malaca, os portugueses terão contactado com os chinese, pelo menos, terão recebido porcelanas chinesas de presente por parte do sultão de Pedir». In Portugal encontra a China, Testemunhos de uma convivência, Portugal e a China, Uma Ponte com 500 anos, Instituto Camões, Fundação Oriente, 2004.

Cortesia da F. Oriente/JDACT