domingo, 2 de dezembro de 2012

O Paradoxo da Sabedoria. Elkhonon Goldberg. «Poderá o fenómeno da sabedoria, em princípio, ser compreendido em termos biológicos e neurológicos ou é demasiado esquivo e multifacetado para ser abordado com algum grau de precisão científica?»

jdact e cortesia de wikipedia

A Vida do Cérebro
«Mas o que tem a dizer para tranquilizar o público? Nesse momento disse para mim mesmo: “Que interessante idioma cultural! Tem de haver um fim feliz!
Tranquilizar nem sempre é algo positivo. Há circunstâncias em que agarrar à força o público, por assim dizer, e abaná-lo de forma alarmista será melhor a longo prazo. Mas sobre a questão do envelhecimento o público já recebeu a sua dose terapêutica de alarme. Ouvimos constantemente falar do flagelo da demência da doença de Alzheimer e dos sintomas da neuroerosão, a intrusão do esquecimento e a crescente fadiga mental. Infelizmente, estes flagelos são reais.

NOTA: Cunhei os termos neuroerosão e, por extensão, neuroerosivo, para preencher uma certa lacuna notada. É comum referir certas perturbações que dão origem a casos de demência como neurodegenerativas. Mas este termo é muito restritivo e negativo. Implica um conjunto específico de perturbações caracterizado pela atrofia neural primária. O termo cerebrovascular ou multienfarte, muitas vezes utilizados para referir outras perturbações específicas que resultam eventualmente em casos de demência, também têm conotações muito específicas e restritivas que implicam uma doença primária dos vasos sanguíneos do cérebro. Neuroerosivo pretende ser um termo genérico que abrange todas as possibilidades específicas e desprovido do sentido de finalidade associado aos outros termos.

Mas é tempo de olhar para o lado positivo, desde que seja real, e não um truque falso para tranquilizar as pessoas.

A Explicação da Sabedoria
A sabedoria é o aspecto positivo. Ao longo dos tempos, a sabedoria tem sido associada à idade avançada nas tradições populares de todas as sociedades. A sabedoria é uma preciosa benesse do envelhecimento. Mas, poderá a sabedoria resistir ao assalto da neuroerosão? E por quanto tempo?
Coloca-se a questão da natureza da sabedoria. Na nossa cultura, utilizamos a palavra com frequência e de forma reverente. Porém, terá sido alguma vez a sabedoria cabalmente definida? E a sua base neural compreendida? Poderá o fenómeno da sabedoria, em princípio, ser compreendido em termos biológicos e neurológicos ou é demasiado esquivo e multifacetado para ser abordado com algum grau de precisão científica?
Sem reclamar qualquer particular sabedoria, acredito que posso contribuir para uma maior compreensão pelo desenvolvimento das introspecções anteriores que contribuem para esclarecer a natureza da sabedoria ou, pelo menos, um dos seus aspectos importantes. O fio do raciocínio e a tese desenvolvida fluirão a partir dessa introspecção e desse discernimento.
Com a idade, o número de tarefas cognitivas da vida real que requer um grande e árduo esforço e a criação intencional de novas construções e ideias mentais parece diminuir. Por sua vez, a resolução de problemas adquire progressivamente a forma de reconhecimento de padrões. Isto significa que com a idade acumulamos um número crescente de modelos cognitivos. Consequentemente, torna-se mais provável que um número crescente de futuros desafios cognitivos se insira com relativa facilidade num modelo preexistente ou exija apenas uma ligeira modificação de um modelo mental previamente formado. A tomada de decisões assume a um ritmo crescente a forma de um reconhecimento de padrões e não tanto de resolução de problemas. Como demonstra a obra de Herbert Simon e de outros autores, o reconhecimento de padrões é o mecanismo mais poderoso para uma cognição bem sucedida». In Elkhonon Goldberg, O Paradoxo da Sabedoria, 2005, Forum da Ciência, PE-A, 2008, ISBN 978-972-1-05857-6.

Cortesia de PE-A/JDACT