terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Viriato. A Luta pela Liberdade. Maurício Pastor Muñoz. «… era superior a todo o tipo de cansaços e inclemências, nunca sofreu com a fome, não se lamentava perante nenhuma contrariedade, sabendo tirar partido de todas as circunstâncias desfavoráveis»

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«Na realidade, todas as fontes antigas aceitam o carácter lusitano de Viriato. Mas nem todos admitiam que Viriato fosse de origem lusitana. Alguns historiadores tentaram provar que era originário de outras regiões e inspirados por ideais nacionalistas, reivindicavam para a sua pátria a figura do herói. Assim, em 1900, o historiador Arenas López sustentava que Viriato não era português, mas celtibero e, recentemente, em 1988, García Moreno, tendo analisado todos os topónimos mencionados nas fontes clássicas, defende que Viriato era de origem bética na obra Infância, juventude e primeiras aventuras de Viriato, caudilho lusitano. Afirma que todos os dados analisados

Situam indubitavelmente o foco do poder de Viriato no sopé das serras localizadas na junção da Submeseta Meridional com a Depressão Bética e que tornam muito plausível a hipótese de ser essa a região onde nasceu o famoso caudilho lusitano’.

Este autor indica a cidade de Arsa, na Baeturia céltica, como o principal centro de poder de Viriato, pelo menos na época do seu apogeu e que, consequentemente, se esta cidade não fora o lugar de nascimento de Viriato, fora, sem dúvida, a sua segunda pátria.
Para García Moreno, Schulten teria inventado que a pátria de Viriato era a Serra da Estrela, já que o Mons Herminius, no caso de se localizar nessa serra portuguesa, não é mencionado uma única vez nas fontes antigas que se referem aos feitos de Viriato. Para este autor, só os preconceitos e uma análise insuficiente dos textos antigos poderão ter levado Schulten e os seus seguidores, principalmente hispânicos, a considerar que Viriato teria nascido na selvagem e agreste Serra da Estrela.
Mas, apesar disto, tudo indica que Viriato era originário da Lusitânia, algures na Serra da Estrela, entre o Tejo e o Douro, como se conclui a partir da análise dos textos antigos que se referem às várias campanhas de Viriato, todas elas ocorrendo, de preferência, em território lusitano. Por outro lado, não é assim tão importante saber com exactidão o sítio onde nasceu. Também ignoramos em que ano nasceu Viriato, mas podemos fazer algumas suposições. Se aceitarmos que tinha vinte anos quando aparece pela primeira vez na História e que se determinou que tal sucedeu em 150 a.C., então deverá ter nascido por volta de 170 a.C., embora seja provável que tenhamos de recuar até datas anteriores, até a 190 a. C. no máximo, visto que as fontes referem que tivera uma vida repleta de peripécias que certamente não caberiam em apenas vinte anos de vida.
Mas apesar de desconhecermos a data e o local exactos do seu nascimento, sabemos que era de origem humilde como é reiteradamente afirmado nas fontes antigas. No entanto, também não podemos estar absolutamente certos deste facto, visto que pode tratar-se de uma figura de retórica muito disseminada, que pretenderia enfatizar a ascensão de um homem desde o anonimato até a uma posição de chefia, apenas por mérito pessoal. Tratar-se-ia então da imagem de Viriato adaptada ao ideal do herói da filosofia cínica do homem natural, cujo carácter teria sido moldado, na primeira infância e juventude, pelas exigências do meio ambiente em que crescera, obedecendo, portanto, às regras da conhecida Antropologia e Etnografia de Posidónio.
O texto deixado por Posidónio e recolhido por Diodoro Sículo é o seguinte:
  • “O lusitano Viriato, de humilde linhagem, segundo alguns, mas famosíssimo pelas suas façanhas, já que de pastor se tornou bandoleiro e depois general, era naturalmente e pelos exercícios que fazia, extremamente rápido na perseguição e na fuga e exímio na luta a pé. A comida simples e uma bebida sem refinamentos eram o que tomava com maior prazer: passou a maior parte da sua vida ao ar livre, e sempre se satisfez com os leitos que a natureza lhe ofereceu. Por isso era superior a todo o tipo de cansaços e inclemências, nunca sofreu com a fome, não se lamentava perante nenhuma contrariedade, sabendo tirar partido de todas as circunstâncias desfavoráveis. Dotado tanto pela natureza como pela sua preocupação em manter essas qualidades físicas, destacava-se ainda mais pelas suas qualidades de espírito. Era rápido a compreender e a executar o necessário, vendo ao mesmo tempo o que tinha de ser feito e a oportunidade óptima para o realizar, e era também capaz de fingir que conhecia o mais obscuro e que desconhecia o mais evidente. Mantinha-se sempre igual a si próprio tanto no comando como na obediência, nem modesto nem altivo: e pela humildade da sua origem e prestígio do seu poder conseguiu não ser inferior nem superior a ninguém. Em suma, não empreendia a guerra nem por ganância, nem por amor ao poder, nem movido pela cólera, mas fazia-a por ela mesma, e é sobretudo por isto que foi temido como guerreiro ardente e conhecedor da arte bélica”». 
In Maurício Pastor Muñoz, Viriato La Lucha por La Liberdad, Viriato, A Luta pela Liberdade, Alderabán, Ediciones,SL, 2000, Ésquilo, Lisboa, 2003, ISBN 972-8605-23-4.

Cortesia de Ésquilo/JDACT