Evolução Política
«Quando Afonso III de Leão (866-910) estendeu o domínio das armas
cristãs em direcção ao rio Douro, dando a seguir início a uma intensa acção
repovoadora, notam-se desde logo algumas diferenças entre as terras
propriamente galegas e aquelas que se situam nos confins do rio Minho. Essa
diferenciação detecta-se sobretudo através de alguns documentos em que os seus
redactores denominam as terras localizadas ao sul do rio Minho por regiões
extremas de Galiza. Em particular deve-se referir o documento de 909 que utiliza
na sua linguagem a expressão confins do Minho, aplicável à região
minhota e confins do Douro, designando a região duriense.
Com a política restauradora de Afonso III de Leão na qual se insere a
presúria do Porto em 868 levada a efeito pelo conde Vimara Peres, está-se
perante uma nova fase na constituição do território portucalense. Portucale
localizada unto à foz do rio Douro representa um ponto de irradiação na segunda
metade do século IX, dando origem a uma área territorial que se dirige
para norte até ao rio Ave e para sul no sentido do Vouga. Os limites desta área
confinam com os territórios de Braga, Lamego, Viseu e Coimbra.
Simplesmente verifica-se a tendência de designar por terra portucalense ou
terra de Portugal todas as circunscrições atrás mencionadas. Assim, logo no
início do ano mil estamos perante um condado designado por Portucalense.
Á família condal portucalense, à frente de cujos destinos se encontra Mendo Gonçalves, era aparentada com os monarcas
leoneses. Por linha hereditária até à quinta geração permanecem ao leme do
condado, sendo afastados quando o rei de Leão, Fernando Magno, realiza uma
política centralizadora e burocrática que se traduz na nomeação de meirinhos e
infanções.
O monarca leonês assume o título de imperador de Espanha e tira partido
da dissolução do califado de Córdova, que se fragmenta em reinos (taifas), para impor o domínio cristão
até ao rio Mondego. Na sequência da conquista de Coimbra, entrega o
governo da circunscrição ao moçárabe Sesnando. Por decisão testamentária
deixa aos seus filhos Afonso, Sancho e Garcia os reinos de Leão, Castela e
Galiza. No fragor das guerras fratricidas que se seguem à morte de Fernando
o Magno, o território portucalense segue o partido de Garcia, o qual foi
derrotado por Sancho. Este por seu turno foi assassinado durante o cerco de
Zamora, o que teve como consequência que o poder viesse a concentrar-se em
Afonso VI (1072), o qual se encontrava refugiado em Toledo, na corte do rei
árabe Almamum.
Em 1082 o rei Afonso VI procede a uma restruturação do condado
portucalense. Para norte situa-se além do rio Lima, enquanto para sul não
ultrapassa o Mondego. Fora dos seus limites encontram-se os territórios de
Coimbra e de Viseu.
Com a entrada de Afonso VI, em Toledo (1085) proclama-se o monarca soberano
dos homens das duas religiões. Aberto o caminho para a conquista das taifas, os reis de Granada, Sevilha e Badajoz
pedem auxílio aos almorávidas. Estes oriundos do Saara pautavam a sua visão
do islamismo por uma atitude fundamentalista nada consentânea com o
posicionamento dos hispano-muçulmanos.
Dirigidos por Iúçufe
desembarcaram os almorávidas em Algeciras. Daqui seguiram em direcção a
Badajoz. Entretanto Afonso VI levantou o cerco de Zaragoça e partiu ao encontro
das tropas muçulmanas aliadas. O combate deu-se em Zalaca (1086) dele
resultando uma terrível derrota para os cristãos. Desenhava-se o espectro duma
retirada destes para as montanhas cantábricas não fora o acaso do falecimento
inesperado do filho do chefe almorávida, que o obriga a regressar a Marrocos.
Em 1087 deu-se o grande afluxo dos exércitos europeus que ao abrigo da
cruzada de Ocidente pregada pela Santa Sé se dirigiram para a Península
Ibérica. Sob o comando de Eudo, duque
de Bragança, vem o conde Raimundo, o qual casa com D. Urraca, filha de
Afonso VI. Ignora-se se o conde Henrique teria vindo na mesma altura. Em 1095
este sobrinho de S. Hugo, abade de Cluny, aparece-nos consorciado com D.
Teresa, filha ilegítima do monarca castelhano.
Em l094 os almorávidas voltam a atacar. Assustados com a sua intransigência
os taifas muçulmanos pactuam com
Afonso VI e entregam-lhe os castelos de Santarém, Lisboa e Sintra. Ao procurar
impedir o isolamento de Toledo o rei cristão confia a Raimundo a defesa do Tejo
desde Badajoz até Lisboa. Este fidalgo mostra-se impotente para impedir o
avanço almorávida, cuja investida chega a ameaçar Coimbra. Face ao descalabro
Afonso VI repensa a estratégia e encarrega Henrique de deter o avanço inimigo.
O bom êxito da sua missão irá ser coroado com a doação do condado portucalense,
também em boa medida resultante do casamento com a sua filha.
Apesar da subordinação do conde Henrique ao sogro vislumbram-se no seu
comportamento manifestações de autonomia. Em estreita aliança com o arcebispo
de Braga procura libertar-se da tutela da diocese de Santiago. Com aquele prelado
chega a empreender uma viagem a Roma para colocar as dioceses de Coimbra,
Lamego e Viseu na dependência bracarense. A existência duma igreja nacional
seria um passo importante para alcançar a independência». In Humberto C. Baquero Moreno,
Evolução Política, Nos Confins da Idade Média. Arte Portuguesa. Séculos
XII-XV, Instituto Português dos Museus, Porto.1992.
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