sábado, 1 de junho de 2013

O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa: Carl Erdmann. «O aumento de influência o prestígio daí derivado, aceitou-o ela de boa mente. Mas o conteúdo político de toda a acção contrariava a política espanhola seguida então pela cúria com bastante coerência»

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Inocêncio II e o juramento de vassalagem de Afonso Henriques
«(…) Fazia parte do tradicional labor dos legados mandados à Península restabelecer a paz entre os príncipes desavindos e uni-los contra o inimigo comum ao sul. Guido deve ter recebido idêntica incumbência. Estavam tensas as relações entre Castela e Portugal. Sem que se pudesse aduzir sempre razão positiva para cada caso particular, o que é certo é que se tinha chegado a repetidos choques e expedições guerreiras de vário resultado; Afonso VII de Castela e Afonso Henriques de Portugal haviam por fim feito tréguas por alguns anos em 1140. A situação tornou-se porém de novo tensa, devido a Afonso Henriques haver tomado o título de rei. Nesta altura tomou o cardeal Guido nas suas mãos a mediação a favor da paz, evidentemente para ajudar o seu novo protegido. Houve um encontro de ambos os reis e do cardeal em 4 e 5 de Outubro de 1143 em Zamora, onde se concluiu paz duradoira, e parece que Afonso VII chegou a reconhecer o título de rei a Afonso Henriques.
Com isto terminam os principais sucessos deste pontificado que para Portugal foi o mais importante de todos. Tanto o entendimento sobre a organização do episcopado português como a introdução em Portugal da instituição dos conventos isentos, tributários do papa e seus protegidos: tudo isto se deu no tempo de Inocêncio II; o seu legado foi o primeiro a desenvolver aqui uma intensa actividade eclesiástica e política, e deixou o rei português como feudatário da Cúria. O lucro daqui derivado para a Cúria foi puramente de ordem moral, mas como tal de grande importância. Demonstrava sobretudo da maneira mais enérgica que o rei de Portugal queria fazer a sua política de harmonia com o papado e que o extremo ocidente do orbis christianus havia firmado mais as suas relações com a Igreja romana.
Claro que quando Afonso Henriques depôs nas mãos do legado papel o juramento de vassalagem, já não vivia a pessoa a quem o juramento se referia: o papa Inocêncio II. O seu sucessor, Celestino II, morreu também pouco tempo depois, de maneira que aconteceu vir a tratar-se da questão do enfeudamento de Portugal à Cúria só no tempo de Lúcio II.

A luta contra o primado de Toledo
É facto curioso mas fora de toda a dúvida, que a cúria se não mostrou absolutamente satisfeita com o enfeudamento de Portugal. O aumento de influência o prestígio daí derivado, aceitou-o ela de boa mente. Mas o conteúdo político de toda a acção contrariava a política espanhola seguida então pela cúria com bastante coerência. Lúcio II, como a maior parte dos seus imediatos predecessores e sucessores, punha-se do lado da potência ibérica mais forte, isto é: do lado do reino unido de Castela e Leão. Afonso VII de Castela usufruía valimento muito especial junto dos papas, valimento que se manifestava não só na concessão da Rosa de Oiro e em muitas cartas honrosas e amigas, mas também e sobretudo em medidas e atitudes políticas. Em Roma considerava-se como sendo a principal tarefa, que incumbia a todos os príncipes espanhóis o avanço contra o Islam e julgava-se que seria mais facilmente atingida esta finalidade, se os diversos príncipes, em vez do se combaterem mutuamente, se unissem sob uma direcção superior comum e, pelo menos em grandes acções e em caso de necessidade, constituíssem um só exército de comando único. Praticamente, significava isto apoio às pretensões do predomínio sobre Aragão, Navarra e Portugal, mantidas com maior ou menor êxito por Afonso VII. Esta política não a queria abandonar Lúcio II, mesmo depois do preito de vassalagem prestado por Afonso Henriques». In Carl Erdmann, O Papado e Portugal no primeiro século da História Portuguesa, Universidade de Coimbra, Instituto Alemão da Universidade de Coimbra, Coimbra Editora, 1935.

Cortesia de Separata do Boletim do Instituto Alemão/JDACT