«O meu vizinho é carpinteiro,
algibebe de Dona Morte,
ponteia e coze, o dia inteiro,
fatos de pau de toda a sorte:
mogno, debruados de veludo,
flandres gentil, pinho do Norte...
Ora eu que trago um sobretudo
que já me vai aborrecer,
fui-me lá, ontem (era Entrudo,
havia imenso que fazer...):
- Olá, bom homem! Quero um fato,
tem que me sirva? - Vamos ver...
Olhou, mexeu na casa toda.
- Eis aqui um e bem barato.
- Está na moda? - Está na moda.
(Gostei e nem quis apreçá-lo:
Muito justinho, pouca roda...)
- Quando posso mandar buscá-lo?
-Ao pôr do Sol. Vou dá-lo a ferro.
(Pôs-se o bom homem a aplainá-lo…)
Ó meus amigos! Salvo erro,
juro-o pela alma, pelo Céu:
nenhum de vós, ao meu enterro,
Irá mais dândi! Olhai! Do que eu!»
Poema de António Nobre, in ‘Só’
(Paris, 1891)
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