sábado, 17 de maio de 2014

Eleonor na Serra de Pascoaes. António Cândido Franco. «… são hoje ostensivamente ignoradas e é geralmente sem qualquer conhecimento dos textos, e por isso com ignorância, que se formulam as inadequadas e injustíssimas vulgarizações que correm sobre a poesia do tempo de Pascoaes»

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«(…) Posteriormente, já no fim da sua vida, livros como Versos Pobres (1949) ou Últimos Versos (1953), que são de extraordinária importância dentro da nossa modernidade e até do nosso modernismo poético, não tiveram também contemporâneos à sua altura e apareceram envolvidos por um silêncio que só alguns elementos ligados à geração da revista Árvore (1951-1953), como Sebastião da Gama ou Cesariny Vasconcelos, pretenderam romper, assumindo-se por esses anos como os contemporâneos e admiradores incondicionais do poeta do Marão. De todas as poesias que constituem reconhecidamente, em nosso entender, as do tempo de Pascoaes, e que vão como vimos de Afonso Lopes Vieira a Fernando Pessoa (Na Floresta do Alheamento, foi publicado em 1913 na revista A Águia), as únicas conhecidas são as de Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro. Todas as restantes, incluindo a de Afonso Duarte, são hoje ostensivamente ignoradas e é geralmente sem qualquer conhecimento dos textos, e por isso com ignorância, que se formulam as inadequadas e injustíssimas vulgarizações que correm sobre a poesia do tempo de Pascoaes, em particular sobre as poesias de Corrêa d’Oliveira, de João Lúcio ou de Mário Beirão, três das mais importantes poesias portuguesas do século XX. Traçou-se pura e simplesmente, do alto a baixo, um traço sumário, como disse Cesariny, sobre a poesia desses poetas, ignorando que o que assim se fazia era riscar, quando se tomava esse risco de modo definitivo, uma das partes mais significativas e importantes da nossa poesia de sempre, contribuindo ainda mais para o desconhecimento da poesia de Pascoaes.
É difícil sabermos quais as razões que levaram e continuam a levar a este desconhecimento, mas desde já nos recusamos a aceitar que haja ou tenha havido qualquer má-fê manifesta contra o poeta e a sua poesia, tanto mais que, a ter em conta as palavras certeiras de Sant’Anna Dionísio, nunca José Régio, Gaspar Simões ou Casais Monteiro, três dos principais directores da revista Presença, negaram vida e perenidade à poesia de Pascoaes. José Régio, por exemplo, num artigo que escreveu chamado Pascoaes e Pessoa, e em que discute opiniões formuladas por Otto Maria Carpeaux sobre a poesia de Pascoaes, revelou bem o respeito que a poesia do poeta de Marânus lhe merecia, quando dificilmente admitiu que um critério estético pudesse afirmar a superioridade da poesia de Pessoa sobre a de Pascoaes. Qualquer preferência entre duas personalidades literárias tão marcadas, tão importantes e tão diversas como a de Pascoaes e a de Pessoa, muito se arrisca a ser anticriticamente subjectiva. (...) Quando afirma acreditar que preferindo Pessoa a Pascoaes, os brasileiros escolheram bem, manifesta Otto Carpeaux  uma crença que, como tal, é pessoal e dificilmente discutível. Bem ousado seria atribuir a tal-crença foros de infalibilidade (in Diário de Notícías, 30-4-1959)».

In António Cândido Franco, Eleonor na Serra de Pascoaes, Edições Átrio, Lisboa, Colecção o Chão do Touro, 1992, ISBN-972-599-042-0.

Cortesia de Átrio/JDACT