A Ordem de Avis na Idade Média (contexto histórico). A filiação de Avis em Calatrava
«(…) A dependência de
Avis face à Ordem de Calatrava terá contudo terminado no século XV, em parte
devido à acção régia. Naturalmente, após a eleição de João, Mestre de Avis,
como rei de Portugal, em 1385, houve
necessidade de escolher um outro: Fernão Rodrigues Sequeira foi
escolhido pelos seus pares em processo hoje conhecido, mas não foi confirmado
pelo seu superior castelhano. Quando em
1390 o Mestre de Calatrava
Gonçalo Nunez Guzman se deslocou a Avis, o mestre recém-eleito terá
recebido indicações do rei João I para o receber como qualquer outro freire e
não como seu superior. De facto, alegando que Castela era cismática (e,
portanto, a Ordem castelhana também) pedia-se, e obtinha-se do Papa Eugénio IV, a efectiva independência da milícia
portuguesa relativamente a Calatrava.
Organização
interna da Ordem de Avis
Introduzida a história
inicial da Ordem e consideradas as circunstâncias em que esta deu os seus
primeiros passos, cremos que importa agora saber de que maneira a milícia
funcionava do ponto de vista interno. A documentação dispersa que utilizamos
pouco revela a este respeito. Numa primeira leitura apenas permite identificar
algumas personagens que ocuparam os diferentes cargos ou usufruíram de determinado
benefício ao longo do período que nos ocupa. Dadas estas dificuldades, fomos
obrigada a recorrer a fontes complementares, e à primeira vista estranhas à Ordem
de Avis, utilizando-as com frequência como valiosos auxiliares para melhor
compreender muitos aspectos que, considerados apenas à luz da documentação do Cartório
de Avis, seriam de difícil interpretação. É o caso da documentação
existente no Arquivo Nacional de Madrid, proveniente do de Calatrava.
De todo o acervo aí existente, destacam-se as cartas enviadas pelo Capítulo
Geral de Cister à Ordem castelhana em 1164,
1186 e 1199, bem como as Bulas desses mesmos anos e que confirmam
as disposições que aquelas cartas inserem. No seu conjunto, estes documentos constituem
as primeiras Formae Vivendi da milícia. Não nos repugna utilizar
estas fontes que, à partida, não pertenciam ao fundo documental da Ordem
portuguesa tendo em vista que Avis, filiada
em Calatrava, adoptou não só a inspiração mas também a sua estrutura
interna.
No entanto, no Cartório
de Avis existem dois diplomas do maior interesse:: são as Definições
de 1195-1213 e as de 1342, publicadas por Lomax (Algunos Estatutos ... ) e por
Aurea Javierre Mur (La Orden de
Calatrava ... ), respectivamente. Não constituindo por si só uma Regra,
tomada no sentido vulgarmente atribuído a este termo, este tipo de diplomas
permite ao investigador obter informações que ilustram aspectos concretos da
vida diária dos freires: direitos e deveres do Mestre, prior e clérigos;
administração económica; possíveis delitos e respectivos castigos;
etc. Aquando da fundação de Calatrava, a Ordem era composta por cavaleiros que
se associaram a monges cistercienses e que com eles formavam uma comunidade.
Esta situação dura até à data da morte de um dos seus fundadores, o abade
Raimundo de Serrat (ocorrida em 1163 ou 1164), altura em que os
problemas internos levaram o grupo de monges que viviam com os cavaleiros a
abandonar o Convento. Consciente de que, por este facto, Calatrava se
convertera numa freiria de cavaleiros que facilmente se desagregaria, Garcia (que tinha ficado entre
os cavaleiros e fora eleito seu Mestre) resolve admitir padres seculares na
qualidade de capelães e ligar a milícia, através de uma Regra, a uma Ordem
religiosa. Assim, em 1164 é pedida
ao Capítulo Geral de Cister a incorporação da milícia no seio desta
Ordem ou, pelo menos, a sua protecção. Os Cistercienses acedem ao pedido,
aceitando os cavaleiros non ut
familiares, sed ut vere frafres. No entanto, estes não consideraram o seu
problema resolvido, uma vez que Cister se limitou a dar-lhes uma Forma Vivendi, deixando à
responsabilidade da abadia de Scala
Dei o cuidado de elaborar uma Regra pela qual se haviam de reger.
Segundo Cocheril esta atitude tem um significado muito claro: Calatrava não
entrava ainda na hierarquia de Cister, isto é, no esquema
abadia-mãe/abadia-filha, sendo portanto considerada como uma casa à parte dessa
estrutura». In Maria Cristina A. Cunha, Estudos sobre a Ordem de
Avis, séculos XII-XV, Faculdade de Letras, Biblioteca Digital, Porto, 2009.
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