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Andava no ar uma ideia surda, geográfica, de voos transoceânicos e roteiros de
gelo nas planuras do Ártico, com o Sol da meia-noite a piscar o olho cósmico,
lá para as bandas do Cabo Norte... Ao mesmo tempo, umas cautelas infantis,
ingénuas, de consciência insegura em ordem a tão aerodinâmica viagem e uns segredinhos
dúbios, cochichados na sombra, não fosse o pavilhão auditivo paterno captar o
disparate turístico. Os dias foram rodando..., as semanas sucediam-se, saboreando
o volátil passeio, na perspectiva de realizar um sonho! Os oito voos, os itinerários
ao longo dos meridianos e paralelos, de harmonia com o plano das agências que superentendem
nesses paranóicos devaneios, bem como nas achegas necessárias de alimentação e
dormida nessas paragens frigoríficas, se foram programando aos poucos, por via telefónica,
quer entre os participantes motivados, quer entre estes e as respectivas
agências turísticas. Trezentos contos altos, incluindo passaportes do Porto a
Lisboa e vice-versa, custa o passeio. Mas o cifrão não conta para quem sente nos
hemisférios cerebrais o delírio planetário. Após uma subconsciencialização
profunda, em que os prós e os contras se degladiavam na obscuridade subterrânea
do eu, Helsínquia, Finlândia,
Lapónia, Fiordes Escandinavos, Cabo Norte, Sol da meia-noite, ruíram, em
pedaços, tal como sucede aos castelos de oiro feitos no ar pelas loucas mãos da
fantasia! Fico contente com esta derrocada...» In Manuel O. Faria, Terra Inquieta,
APPACDM, Braga, 1994, ISBN 972-8195-10-9.
Cortesia
de APPACDM/JDACT