Cortesia de wikipedia
A Ideia e os símbolos
«(…) Os primeiros, fiéis à
tradição do movimento vencido, tinham a consciência de que a natureza do regime
monárquico só lhes permitiria ascender ao poder pela via revolucionária. No
Sul, pelo contrário, era maioritária uma linha mais moderada que manifestava
tendência para aglutinar os elementos monárquicos fiéis aos princípios do
liberalismo tradicional, com os quais pretendia, em momentos de crise, formar
alianças que sempre se tinham mostrado inoperantes. Os republicanos da zona
norte, embora reconhecessem a impossibilidade de pôr em prática, de imediato,
qualquer solução revolucionária, opunham-se às coligações empreendidas até
então, e preferiam optar pela abstenção a intentar qualquer tipo de colaboração
com outras forças políticas. Com a subida de João Franco ao poder a
acção repressiva da ditadura viria a provocar uma mudança na definição da
estratégia do PRP onde gradualmente a linha que defendia a acção revolucionária
foi ganhando terreno perante a linha mais moderada. Esta modificação levou os
republicanos a procurarem a aliança com outras forças. Entre as organizações
que se juntaram ao PRP para levar a efeito o derrube da Monarquia pela luta
armada, destacaram-se a Carbonária, entre os civis, e a Corporação
dos Sargentos, entre os militares. Com a agitação política e a repressão
que se verificou ao longo de todo o ano de 1907,
intensificou-se a campanha do Partido Republicano cuja propaganda revestia
aspectos de extrema violência, como aconteceu na visita de João Franco ao
Porto, onde as impressionantes manifestações de hostilidade deram origem
a recontros entre o povo e a polícia, de que resultaram numerosas vítimas e um considerável
número de prisões, ocorridas em consequência das agitadas manifestações de
desagrado com que o ditador foi recebido à sua chegada a Lisboa.
A gravidade da situação do
país e a obstinada atitude de João Franco no governo acabaram por
quebrar as hesitações do Partido Republicano e conduzir à organização de um
golpe revolucionário que contou com a participação da Carbonária e dos
dissidentes de José Alpoim. A participação da Carbonária foi decisiva,
pressionando o Directório do PRP que se mostrava indeciso quanto à
possibilidade de enveredar decisivamente pela via da revolução armada. Para a
organização deste movimento, os contactos entre o Directório e a organização
revolucionária foram estabelecidos através de António José de Almeida.
Uma denúncia de um dos conjurados levou à prisão dos principais organizadores.
A 28 de Janeiro de 1908 foram presos
vários líderes republicanos, naquele que ficou conhecido como o Golpe do Elevador da Biblioteca. Afonso
Costa e o visconde de Ribeira Brava foram apanhados de armas na mão
no dito elevador, conjuntamente com outros conspiradores, quando tentavam chegar
à Câmara Municipal. António José de Almeida, o dirigente Carbonário Luz
Almeida, o jornalista João Chagas, João Pinto Santos, e Álvaro
Poppe contavam-se entre os noventa e três conspiradores presos. José
Maria Alpoim conseguiu fugir para Espanha. Alguns grupos de civis armados,
desconhecedores do falhanço, ainda fizeram tumultos pela cidade, mas foram
facilmente dominados pelas forças fiéis ao governo.
À agitação que se ia
tornado irreprimível, a ditadura continuava a responder com repressão. Em 31
de Janeiro, o rei, em Vila Viçosa, assinava o decreto que permitia ao
governo expulsar do país todos os que fossem pronunciados por crimes
compreendidos no Art. 1.º do Decreto de 21 de Novembro de 1907. No dia seguinte o rei Carlos I iniciava o seu fatídico
regresso à capital. Da descrição do Regicídio
e da possível participação do PRP no violento acto levado a efeito por Buíça
Costa, existem vários e contraditórios relatos, mas nunca foi possível provar
cabalmente a colaboração do Partido Republicano com os regicidas. Com este acto
violento encerraram-se definitivamente as tentativas de engrandecimento do
poder real, que anunciadas pelos arautos da Vida
Nova, tiveram o seu mais duro e implacável defensor em João Franco. Paradoxalmente
, a queda da Monarquia que se aproximava, tinha por obreiros aqueles que
propunham escudar-se na autoridade para a reformar e engrandecer.
A Monarquia Nova e o Congresso de Setúbal
Apesar dos reveses sofridos
os republicanos não abandonaram a sua acção de propaganda. Aliás a Monarquia Nova do monarca Manuel II, embora procurasse pôr em prática
algumas das reformas preconizadas pelos republicanos, enredava-se numa série de
escândalos de índole financeira (questão dos adiantamentos, caso Hinton,
ruína do Crédito Predial) acompanhados por diversas questões religiosas que
puseram em foco o anticlericalismo existente entre as massas populares afectas
aos republicanos. Estes que tinham conseguido aumentar substancialmente a sua representação
parlamentar nas eleições de Abril de 1908,
aproveitaram esta vantagem para uma vigorosa campanha para as eleições
municipais do mesmo ano. Não obstante a oposição dos principais partidos
monárquicos, as eleições realizaram-se em Novembro de 1908 e constituíram uma importante
vitória para os republicanos que não só conquistaram todos os lugares da Câmara
de Lisboa, como uma digna representação maioritária ou minoritária em muitos
concelhos do país.
Estes triunfos eleitorais
não fizeram desistir a facção que no PRP continuava a defender a via
revolucionária. No Congresso de Setúbal,
em que pela primeira vez esteve representada uma organização feminina, a
recém-criada Liga Republicana das Mulheres
Portuguesas, saiu eleito um novo Directório a quem foi confiado o
mandato imperativo de fazer a revolução. Na sua acção de preparar a revolução o
novo Directório seria acompanhado por uma Junta Consultiva e uma Junta
Administrativa. A acção de propaganda e combate destes elementos da
organização partidária, era, como vimos, completada por uma notável obra de
instrução e esclarecimento a cargo dos centros republicanos espalhados pelo país
e de mais de meia centena de jornais, revistas e outras publicações periódicas
que desenvolveram também uma importante acção de propaganda e divulgação dos
ideais republicanos. Esta acção esclarecedora foi de grande importância para a
preparação cívica de grandes camadas da população que, progressivamente, iam
sendo aliciadas para as fileiras republicanas. A divulgação dos novos ideais
corria a par com o descrédito da monarquia, bem visível nos grandes comícios de
Agosto de 1910 e no aumento da representação parlamentar obtido
nas eleições do mesmo mês. Para consumar a obra que lhe fora confiada de
preparar e organizar a revolução, o Directório republicano eleito em Setúbal,
tinha começado por organizar comités revolucionários para estabelecer as
ligações especialmente com as unidades militares do exército e da armada. A
organização das forças civis do movimento foi confiada à Carbonária. Nos
dezoito meses entre o Congresso de
Setúbal e a Revolução do 5 de Outubro multiplicaram-se os trabalhos de
organização do movimento para evitar que se repetissem os malogros de 1891
e 1908». In Maria C. Proença e Luís Farinha, República e Republicanismo,
Instituto Camões, Março 2009.
Cortesia de ICamões/JDACT