quarta-feira, 3 de junho de 2015

A Conspiração do Graal. Lynn Sholes e Joe Moore. «Mas o que foi isso!? Ela tentou ver alguma coisa no meio da poeira e a penumbra do anoitecer. Saia já! Não levo americanos. Do rádio jorrava um palavreado incompreensível na voz de um locutor iraquiano»

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«Depois de criar o céu e a Terra, Deus gerou, à sua própria imagem, o primeiro homem, e chamou-o de Adão. Ele então mandou que todas as legiões do Céu, os Anjos e Arcanjos, se curvassem perante Adão e lhe prestassem homenagem e respeito, pois Deus daria a Adão o controle sobre toda a Terra e as suas criaturas. Lúcifer, porém, o mais belo anjo de todos, enciumou-se e recusou-se a curvar-se perante Adão. Reuniu ao redor de si outros anjos com esse mesmo sentimento e eles formaram um exército numeroso, que se revoltou contra o Criador. Uma batalha feroz deflagrou entre os anjos de Deus e aqueles que deram as costas a Ele. Tanto sangue foi derramado que se formaram dois rios caudalosos atravessando o deserto abrasador. No final, o grande guerreiro, o Arcanjo Miguel, juntamente com a Hoste do Céu, derrotou Lúcifer e expulsou-o com os seus rebeldes para fora do paraíso.  Os Anjos Caídos, ou Nefilins, como foram chamados na Bíblia, estavam proibidos para sempre de retornar ao Céu. Então eles desceram para a Terra e caminharam furtivamente entre os homens. Ao longo das eras, o seu ódio cresceu, e Lúcifer jurou que algum dia teria a sua vingança. Mas havia um entre eles que se arrependera e secretamente desejava o perdão do Criador. O nome dele era Furmiel, o Anjo da 11ª Hora. Por causa do remorso dele, Deus concordou em lhe dar a mortalidade e permitiu que vivesse o resto da sua existência como homem. Uma vez que o espírito de Furmiel não poderia jamais retornar ao Céu, Deus permitiu que ele tivesse uma filha que seria levada ao nascer para assumir o lugar do pai entre os Anjos. Mas porque Deus sentiu que o momento da vingança de Lúcifer era chegado, ele permitiu que a esposa de Furmiel desse à luz gêmeas, sendo que a segunda filha viveria na Terra. Ela chegou à idade adulta sem saber que o sangue dos Nefilins corria nas suas veias. E por causa desse laço de sangue, ela estava destinada a ser escolhida.

Abandonada
Nínive, norte do Iraque. Saia! A voz esganiçada do motorista iraquiano ecoou rispidamente no interior do carro. Uma nuvem de areia e pó formou-se do lado de fora depois da travagem brusca. Rudemente acordada, Cotten Stone endireitou-se no banco. Mas o que foi isso!? Ela tentou ver alguma coisa no meio da poeira e a penumbra do anoitecer. Saia já! Não levo americanos. Do rádio jorrava um palavreado incompreensível na voz de um locutor iraquiano. O que aconteceu?, insistiu ela. O que está errado? O motorista saiu pela porta que tinha escancarado e correu para a parte de trás do carro. Cotten forçou a maçaneta da porta empoeirada até ouvir um estalido seco. Oiça, o que pensa que está a fazer?, gritou, saltando para fora. O motorista já abria a bagageira, de onde tirou as duas malas que lhe pertenciam, que jogou na beira da estrada. Não me pode deixar aqui, protestou, dando a volta ao carro. Estamos no meio de um maldito deserto! Impassível, o motorista indicou com a cabeça o falatório do rádio. Cotten abaixou-se para pegar a sacola de lona em estilo militar que continha as suas gravações e jogou-a de volta à bagageira. Escute, dei-lhe todo o meu dinheiro. Não tenho mais nada. Virou do avesso os bolsos vazios das calças. Era uma mentira estratégica. Antes de embarcar, tinha escondido quase duzentos dólares dentro de uma embalagem de filme vazia. Era a sua reserva de emergência. Não está entendendo? Veja, não tenho mais dinheiro. Eu paguei-lhe para me levar até à fronteira. O motorista tocou-lhe no ombro com o indicador. Fim da linha para americanos. Tornando a arrancar a sacola da bagageira, o motorista atirou-a com toda a força no peito dela, quase derrubando-a, e obrigando-a a recuar cambaleando uns passos para trás. Em seguida, ele contornou o carro, reassumiu o lugar de condutor, engatou a marcha e saiu disparado, com o velho Fiat derrapando na areia pedragosa. Não acredito que isto esteja acontecendo, queixou-se ela. Desalentada, Cotten soltou a sacola ao lado da outra e, ajeitando uma mecha dos cabelos cor de chá atrás da orelha, acompanhou com o olhar as lanternas traseiras do táxi até que desapareceram na distância. O sussurro ameno do vento do deserto prenunciava o frio da noite ao mesmo tempo que o céu de Janeiro passava de uma tonalidade rósea para o índigo. Sentindo o frio começar a insinuar-se pelo corpo, Cotten abriu a outra sacola, tirou um casaco impermeável em estilo militar e vestiu-o. Para se aquecer, saltitou no lugar, as mãos enfiadas até o fundo dos bolsos. A escuridão, brusca como o rude iraquiano, caía de repente sobre o deserto. Bem que alguém poderia aparecer..., precisava que aparecesse, ela pensou. Passaram-se dez minutos sem nenhum sinal de outro veículo. Finalmente, resolveu pegar as sacolas e começar a andar. Os pedregulhos e a areia rangiam como pedaços de vidro sob as suas botas de acampamento. Relanceou o olhar para trás, desejando ver o brilho de faróis, mas nada se destacava no deserto escuro e árido. Não sei o que me deu para confiar naquele sujeito, resmungou, a voz soando áspera no ar seco.
Alguma coisa o motorista devia ter escutado no rádio para ficar tão fora de si. Cotten sabia que as forças armadas americanas se preparavam para uma invasão. Havia uma semana que corriam rumores entre os jornalistas da comunicação social estrangeira de que ressoavam cada vez mais alto os tambores de guerra em Washington e Londres. Não era nenhum segredo que algumas equipas avançadas das forças americanas e britânicas tinham-se infiltrado no país. Podia ser que a invasão acontecesse meses depois, mas era difícil esconder a concentração de tropas nos países árabes que faziam fronteira com o sul do Iraque. O noticiário árabe local vivia de imagens das forças especiais e dos fuzileiros navais aparecendo e desaparecendo no meio da noite. Testemunhavam-se até mesmo voos estratégicos de caças, assim como a presença de aeronaves do tipo Predator, avião guiado por controlo remoto que não leva tripulação, e de reconhecimento de alta altitude, para testar os graus de vulnerabilidade das instalações de mísseis e de radares iraquianos». In Lynn Sholes e Joe Moore, A Conspiração do Graal, 2005, tradução de Henrique Monteiro, Editora Pensamento Cultrix, Brasil, 2007, ISBN 978-853-151-498-2.

Cortesia de EPensamento/JDACT