domingo, 19 de julho de 2015

Poesia na Penumbra da Noite. O Mar. «Perto do mar há ternuras novas em sua plena virtude, e é maravilha na maravilhosa natureza em plenitude. Com mais eternidade nos seus timbres grande e humilde é simultaneamente. À alma oferece o seu recolhimento…»

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Perto do mar a música é mais sábia
«Perto do mar a música é mais sábia:
humaniza o seu som,
e põe nas suas cadências um estranho
estremecimento do coração.
À sua modulação humana, junta
esse gemer, esse implorar
que vem do fundo dos séculos
para na areia cantar.

Perto do mar há ternuras novas
em sua plena virtude,
e é maravilha na maravilhosa
natureza em plenitude.
Com mais eternidade nos seus timbres
grande e humilde é simultaneamente.
À alma oferece o seu recolhimento
em milagroso germinar.

À alma oferece tudo o que é vida:
o devaneio, a dor,
e tudo se torna puro e luminoso
banhado em ritmo criador».
In Jorge González Bastias, Chile (1879-1950)

O espelho de água
«O meu espelho, correndo pelas noites,
torna-se arroio e afasta-se do meu quarto.
O meu espelho, mais profundo que a orbe
onde todos os cisnes se afogaram.

É um tanque verde na muralha
e no meio dorme a tua nudez ancorada.
Sobre as suas ondas, debaixo de céus sonâmbulos,
os meus sonhos afastam-se como barcos.

De pé sobre a popa ver-me-eis sempre a cantar.
Uma rosa secreta cresce no meu peito
e um rouxinol ébrio esvoaça no meu dedo».
In Vicente Huidobro, Chile (1893-1948)


Lxix
«Quanto nos buscas, oh mar, com os teus volumes
docentes! Que inconsolável, que atroz
estás sob o sol febril.

Com as tuas grandes enxadas saltas,
com as tuas folhas saltas,
com o machado cortas, cortas o louco sésamo,
enquanto a chorar voltam as ondas, depois
de abrirem os quatro ventos
e todas as recordações, em labiadas salvas
de tunsgsténio, contracções de caninos
e estáticos eles quelónios.

Filosofia de asas negras que vibram
ao medroso tremor dos ombros do dia.

O mar, e uma edição de pé,
em sua única folha a face
voltada para o reverso».
In César Vallejo, Peru, (1892-1918)

In Isabel Aguiar Barcelos, O Mar na Poesia da América Latina, tradução de José Baptista, Assírio Alvim, documenta poética, Lisboa, 1999, ISBN 972-370-527-3.

Cortesia de AAlvim/JDACT