«Tinha-se esquecido por completo do
encanto de um lindo dia de Verão na Inglaterra. William Mallory, duque de Sunderland,
tirou o chapéu e inclinou a cabeça para trás, lançando um olhar apreciativo ao brilhante
céu azul que se estendia sobre a vila, antes de focar a sua atenção na charrete sobre a qual se empilhava a sua
bagagem. Estudou a pilha de malas durante um momento, para depois se virar para
o criado de tez escura que acabava de colocar mais um volume sobre o veículo. Tens
de aprender a viajar com menos bagagem, Aman, disse, atirando o chapéu para o topo
da carga. Mal sobra lugar para mim. Sir? O mordomo olhou para o espaço vazio ao
lado do lugar do condutor com um ar de incompreensão, mas não contradisse as palavras
do amo. Como queira, Alteza, murmurou, o que era a resposta habitual às brincadeiras
de Will. O condutor e dono da charrete,
um velho encarquilhado, que andava a transportar passageiros da estação para os
lares, albergues, e locais de interesse histórico de Dartmouth, desde antes do nascimento
de Will, soltou um risinho. Rico dia para montar a cavalo, comentou, com um olhar
matreiro e um piscar de olhos na direcção de Will. Uma corridinha pela charneca,
talvez? Will desatou a rir. Conhece-me bem demais, Robinson. É espantoso, considerando
o tempo que passou.
Há coisas que o tempo não muda,
Sir, respondeu o velho. Tenho um cavalo jovem que seria capaz de lhe agradar. Ainda
não está completamente desbastado, mas é forte e cheio de sangue..., corre como
o vento. Não foi preciso dizer mais nada para convencer Will. Ele virou-se para
o criado. Não precisas de ir pendurado na parte de trás, Aman. Senta-te aqui mesmo
a lado de Robinson, e eu vou a cavalo até Sunderland Park. De facto, acrescentou,
redirecionando a sua atenção para o velho, gostaria de alugar esse seu cavalo
para a semana inteira, se fosse possível. E aposto que vai estar mais do que
ensinado quando mo devolver, respondeu Robinson, começando a descer da charrete como que fazendo tenção de ir buscar
o referido animal. Will impediu-lhe o caminho. Não não, por favor não se incomode.
Pedirei ao jovem Jim que mo aparelhe. Se ele ainda estiver consigo, isto é. Ou já
saiu para fazer fortuna?
O velho abanou a cabeça à referência
do seu único filho, e voltou a sentar-se no lugar do condutor, enquanto Aman subia
para o seu lado. "O Jim continua por cá, meu senhor, embora não por muito tempo,
creio. Está cheio de ideias ousadas, fala em ir trabalhar para as fábricas lá em
cima no Norte, ou nos estaleiros navais em Plymouth. Até fala em partir para a Índia.
Ou para a África, como fez o senhor. Não é má vida, assegurou-lhe Will, mas Robinson
parecia pouco convencido. Peço perdão por discordar, meu senhor, mas não há
lugar melhor na terra que Devonshire. Para além de que..., acrescentou ele antes
que Will pudesse debater essa afirmação..., para além de que partiria o coração
à mãe se fosse., E abanando a cabeça perante os sonhos tolos da nova geração, Robinson
deu um toque de rédeas na garupa do cavalo, pondo a charrete a andar. Will, por sua vez, atravessou a estrada, e
passados quinze minutos saía, montando Galahad, o jovem e impetuoso cavalo de Robinson.
O cavaleiro e a sua montada seguiram pela vila até à estrada que levava a Sunderland
Park num galope pausado e tranquilo. Will estava feliz por estar em casa num dia
como aquele. Estava calor, para padrões ingleses, mas mesmo assim, perto da costa
de Torbay, em Devonshire e em pleno Verão, o dia não lhe pareceu quente». In
Laura Lee Guhrke, O Casamento do Ano, tradução de Luísa Fechner, Publicações
dom Quixote, 2011, ISBN 978-972-204-783-8.
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