Não
é papa nenhum
«Enquanto
sacerdotes católicos geriam redes de fuga de criminosos de guerra nazis e Pio
XII e os seus cardeais travavam uma guerra contra o comunismo, Bernardino
Nogara, conselheiro financeiro do Vaticano, aperfeiçoava o Instituto para as
Obras da Religião (IOR). A Igreja preparava-se para beneficiar com a nova ordem
resultante da Guerra Fria. Muitos dos piores receios de Nogara tinham sido
concretizados pela devastação na Europa do pós-guerra. A produção industrial
caiu a pique. O desemprego atingiu números nunca vistos. Havia mais de oito
milhões de deslocados. Um quarto de toda a habitação urbana alemã tinha sido
destruído e o produto interno bruto do país caíra uns impressionantes setenta
por cento. A vitória democrata-cristã de 1948
em Itália animou Nogara, pondo fim à ameaça comunista de nacionalização de
muitas indústrias. Se tal tivesse acontecido, teria destruído investimentos
avultados do Vaticano e os esquerdistas mais empenhados teriam substituído os
representantes da Igreja nos conselhos de administração das principais empresas.
Mesmo que Nogara demonstrasse confiança na sobrevivência do IOR às nacionalizações,
sabia que as perdas colossais a curto prazo seriam inevitáveis. Completara setenta
e oito anos um par de meses antes das eleições. A boa saúde e a mente ágil não
impediram que preparasse o dia em que passaria a estar ausente do Vaticano.
Reuniu uma pequena equipa de clérigos e leigos de confiança. Monsenhor Alberto di
Jorio trabalhava com ele há mais tempo que qualquer outro clérigo.
Di
Jorio era o secretário da comissão de supervisão do IOR composta por três
cardeais (e que pouco mais fazia do que rever anualmente um sumário de página
única das actividades do banco). O seu chefe era Nicola Canali, um dos prelados
que tinha investigado Nogara quando Pio XII fora eleito papa. Canali estava
incumbido também de gerir a Administração Especial, responsável gela
propriedade da Igreja recebida dos Acordos de Latrão. Referido de forma não
oficial como ministro das Finanças, mantinha-se bastante activo na política da
Cúria. Nogara apreciava Canali pelo seu apego rigoroso à disciplina. Bernardino
acreditava que asseguraria que o IOR e a Administração Especial não se
afastariam demasiado do seu rumo lucrativo. Mas não depositava nos clérigos a
sua esperança no futuro das finanças do Vaticano. Confiava sobretudo num punhado
de leigos mais jovens. O conde papal Carlo Pacelli era um dos três sobrinhos de
Pio XII no Vaticano. Era o conselheiro geral da cidade-estado. Durante a
guerra, Nogara confiara nele para obter conselhos abrangentes acerca dos
negócios internacionais do IOR. Além de contar com a confiança de Bernardino,
Pacelli era um dos poucos funcionários leigos com quem o papa reunia com
regularidade.
Nogara
pedira pessoalmente a Massimo Spada para se juntar ao departamento financeiro
do Vaticano em 1929. Spada, que,
pouco antes, se tornara corrector bolsista, nunca ouvira falar da Administração
das Obras da Religião. Nogara disse-lhe que funcionava quase como um banco no
que diz respeito à administração dos depósitos dos institutos religiosos e das
obras de caridade eclesiásticas. Foi suficiente para Spada, cujo pedigree era imaculado. O seu bisavô
fora o banqueiro privado de um Nobre Negro (nome dado aos aristocratas em luto
pelo fim dos Estados Papais e consequente prisão auto-imposta do papa no
Vaticano) de relevo, o príncipe di Civitella-Cesi Torlonia. O avô de Spada fora
director do Banco de Itália e o seu pai chefiara uma agência de negócios externos
que negociava com a Igreja. Com os seus célebres fatos cinzentos de lapelas
sobrepostas e calças de cintura elevada, Spada era uma presença familiar no Vaticano.
Tornara-se um favorito de prelados com destaque na hierarquia depois de liderar
o movimento para contrariar uma apropriação hostil da Banca Cattolica del Veneto
controlada pelo IOR. No final da guerra, tornara-se o secretário Administrativo
do IOR, o leigo de posição mais elevada a seguir a Nogara. Lúgi Mennini, pai de
catorze filhos, era um banqueiro privado experiente, a quem Nogara pedira
também para trabalhar para o IOR. Tornou-se o conselheiro de maior confiança de
Spada. Raffaele Quadrani, que trabalhara durante alguns anos em bancos de Paris
e Londres, foi outra contratação de Nogaral. Foi recomendado pelo seu irmão,
Bartolomeo, director do Museu Vaticano». In Gerald Posner, Os Banqueiros de Deus,
2015, Editora Self-Desenvolvimento Pessoal, 2015, ISBN 978-989-878-155-0.
Cortesia
de Self/JDACT