«(…) Para espanto e horror de seus pais,
uma das condições da reconciliação era que nem Rita nem as crianças tivessem
mais qualquer contacto com a família, nem mesmo com os irmãos e irmãs, nem com
os filhos deles. E tudo isto apesar de nenhum deles ter feito qualquer gesto
para precipitar o rompimento, que foi uma decisão pessoal de Rita. Agora, a mãe
de Rita só pode ver os netos em segredo; e ela considera particularmente
difícil suportar a brutalidade do genro que, como líder do NC, passa a maior
parte do seu tempo evangelizando na paróquia. Exilada dentro da sua própria paróquia,
ela me traz muitas lembranças infelizes, ela não tem mais a menor esperança de
uma solução para as divisões que o NC causou na sua família e ostenta um ar de
tristeza permanente. Não acredito mais que Rita largue o movimento. Depois do
casamento de Rita, a sua mãe e um grupo de membros da paróquia, preocupados,
tentaram desvendar o segredo que cercava a organização que havia crescido de
mansinho no meio deles nos dez anos anteriores. Ficaram espantados diante do
que descobriram. Longe de ser um grupo marginal, o NC era, naquela época,
dirigido pelo vigário da paróquia, padre Michael Hopley, que era, ele próprio,
um dos homens de confiança do movimento. Espantoso também era o facto de que o
movimento não somente organizava reuniões secretas mas ainda reproduzia em
segredo os serviços mais importantes da igreja, embora eles fossem celebrados
pelo vigário da paróquia. Isto sugeria que havia como que um sistema de duas
camadas, de dois níveis dentro da paróquia. Mas, durante dez anos essas actividades
haviam ficado tão bem escondidas que nem mesmo os membros leigos do Conselho,
corpo de coordenadores dentro da paróquia da Abadia de Ealing, sequer tinham
ouvido falar no nome Neocatecumenato. Porquê todo este segredo? Foram feitos
inquéritos em que se procurou ouvir o vigário da paróquia, o abade, que era a
maior autoridade dentro da Abadia de Ealing, e até mesmo o próprio cardeal
Hume, sobre os aspectos estruturais do NC, sobre sua hierarquia e o seu status
como organização católica. Apesar de tudo isto, não se obteve nenhuma
resposta satisfatória. Na realidade, desde que havia sido instalado na
paróquia, o NC organizava todos os anos, durante o Outono, cursos públicos de
introdução, com o propósito de recrutar novos membros. Esses cursos eram
anunciados tanto do púlpito quanto em publicações, mas o nome do NC nunca
aparecia. No boletim paroquial do domingo, 26 de Outubro de 1986, por exemplo,
aparece na lista de actividades previstas para a semana: quem é Deus para
voz? Às 8h15, no salão paroquial. Nenhum orador do movimento está
identificado. Alguns paroquianos que fizeram este curso durante quinze noites num
período de oito semanas descobriram que, longe de obterem resposta à sua
indagação, a sua perplexidade havia aumentado. O estado de espírito aberto e
positivo que havia transformado a Igreja Católica no início da década de 1960,
como resultado das reformas do Papa João XXIII e do seu Concílio Vaticano II,
tinha levado os fiéis a uma nova valorização do amor de Deus. Os paroquianos da
Abadia de Ealing ficaram, pois, surpresos ao encontrar, nos ensinamentos do NC,
ou antes, na sua catequese, aquela ênfase nos orvalhos de pecado que caracterizaram a era pré-Concílio, e isto
exposto em termos extremamente severos. Mas, na hora de colher informações
sobre as actividades internas do movimento, os paroquianos ficaram a ver
navios: de acordo com as normas do NC, eles foram informados de que não eram
permitidas perguntas durante os encontros. Compareçam às reuniões nocturnas
durante estes 15 dias e encontrarão respostas a todas as suas indagações, era
tudo o que eles diziam». In Gordon Urquhart, A Armada do Papa,
tradução de Irineu Guimarães, Editora Record, 2002, ISBN 978-850-106-222-2.
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