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«(…)
Aquando de uma investigação que levava a cabo com o meu pai, descobri que os
Essénios, que todos julgavam desaparecidos, mortos pelos romanos, varridos da
História, ainda existiam. Sem que ninguém soubesse, tinham contudo sobrevivido,
vivendo secretamente nas grutas do deserto da Judeia. Então, caminhei sobre a rocha
árida à beira do Mar Morto, respirei longamente o ar do deserto e meditei ao Sol.
No maior segredo, encontrei os Essénios nesse local duro e selvagem, impiedoso.
E vi os que consagravam a vida à purificação, na preparação para a batalha do Apocalipse
e com eles combati as forças das Trevas. E descobri que o meu pai, que julgava ateu,
era um deles, e eles disseram-me que esperavam o Messias e que esse Messias era
eu, Ary Cohen, Ary, o soldado, o estudante, o religioso, Ary, filho de David,
da linhagem dos sumos sacerdotes da Bíblia. A minha estrada, semeada de ciladas,
foi longa. Fiz uma aliança com o povo do deserto e prometi que a glória do Senhor
estabelecer-se-ia na Terra, que o Templo de pedra, duas vezes construído, duas
vezes destruído, seria erigido em Jerusalém, na esplanada das Mesquitas. Acompanhei
os Essénios e subi a Jerusalém.
Vivia
então no sonho do Templo, finalmente reencontrado, finalmente reconstruído. Queria
um local para O ver, para lhe oferecer holocaustos puros, holocaustos pelos
pecados, que apagariam os pecados. Tal como David se lavou antes de entrar na
Casa de Deus, banhei-me; tal como os Essénios que, de manhã, e mais ainda a tarde,
entravam nas águas puras como num santuário sagrado, eu estava purificado. Desde
a época de Jesus, os Essénios tinham um sonho, um projecto: tirar Jerusalém das
mãos dos sacerdotes ímpios e construir um Templo para as gerações futuras, onde
o sacrifício divino seria executado pelos sacerdotes da seita, os descendentes de
Zadoc, segundo o calendário solar ao qual a seita aderia. E os que permaneciam secretamente
no deserto em Qumran, nas costas do Mar Morto, evocavam o admirável edifício de
pedra, ouro e madeiras preciosas, várias vezes reconstruído e embelezado. Por fim,
chegou o dia que tanto esperavam. Esperavam pela chegada daquele que combateria
os Filhos das Trevas. Diziam:
ele irá a Jerusalém,
entrará pela Porta Dourada,
reconstruirá o Templo.
Tal como
lhe revelou a sua visão,
e o
Reino dos Céus,
tão esperado,
virá
por ele,
o salvador,
que
será chamado
o
Leão.
E eu
era Ary, o leão, o Messias dos Essénios. e o meu coração, como o pássaro que
perdeu o ninho, suspirava, ansiava pelo adro do Templo. Não parava de endereçar
as minhas preces a Jerusalém. Nas minhas grandes preces da manhã, do meio-dia e
da tarde, suplicava pelo regresso dos exilados e pelo restauro da Cidade da Paz.
Os meus dias de jejum e os meus dias de luto eram aniversários dos nossos
desastres nacionais e os serviços mais solenes do nosso ritual acabavam pela
invocação: no próximo ano, em Jerusalém. Nos momentos mais arrebatadores das minhas
alegrias, rezava pela Jerusalém desfeita, a Jerusalém enlutada pela destruição da
sua Casa». In Eliette Abécassis, A Última Tribo, 2004, tradução de Carlos
Oliveira, Editora Livros do Brasil, Colecção Suores Frios, Lisboa, 2005, ISBN
972-382-763-8.
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