«(…) Kitty deve estar na taberna de
gin. Ainda não suporto vê-la lá. Por isso caminho até ao mercado de aves, a algumas
ruas de distância. Piccadilly, onde arrendámos o nosso quarto, tem passeios de um
bom tamanho, o que significa que nós, mulheres da rua, podemos manter os nossos
sapatos limpos sem termos de pagar por uma liteira. A nossa zona não é tão elegante
como Mayfair, onde mrs. Wilkes tem a sua famosa casa. Mas a rua atrai um fluxo decente
de aristocratas mais jovens, à procura de qualquer diversão que o dinheiro lhes
possa proporcionar. A noite cai e os vendedores aglomeram-se na rua para anunciar
os seus produtos. Raparigas com cestas de fruta ou de camarão à cabeça andam por
ali. Homens empurram carroças com quinquilharia para vender às gentes
embriagadas da cidade. O mercado das aves está a fechar quando eu chego, e os vendedores
cobrem as gaiolas maiores com panos. As gaiolas mais pequenas para venda ainda estão
penduradas num varal, ou dispostas no chão de terra. Há gaiolas de vime em forma
de lágrima, criações caóticas de arame e o ocasional aviário elaboradamente trabalhado.
Gaiolas ainda mais estranhas abrigam os próprios pássaros.
Ando pelos corredores estreitos e
descubro o meu vendedor favorito. É um homem velho com uma roupa mal-amanhada feita
de retalhos. Mas os seus olhos azuis são felizes, como se ele não se desse conta
do ambiente baixo que o rodeia. Bom dia para ti, Queenie, cumprimenta ele, tirando
um boné imaginário e sorrindo. Queenie foi um apelido que me fora dado porque alguns
clientes da taberna de gin achavam que eu me comportava como uma rainha. É geralmente
usado como insulto. Mas não me importo que o homem dos pássaros o utilize. Acho
que ele lhe dá um significado diferente. Vens comprar um pássaro?, pergunta. Eu
aceno com a cabeça. As suas velhas mãos já procuram uma ave na grande gaiola das
aves. Vejo os seus dedos vermelhuscos moverem-se a toda a velocidade e apanharem
um estorninho. Tira o pássaro assustado pela abertura com todo o cuidado, fecha
a gaiola e apresenta-mo num movimento hábil. Gostas deste amiguinho?, pergunta,
segurando o estorninho, que pipila. Examino a criatura que o homem dos pássaros
prende com uma delicadeza notável. Aceno com a cabeça em concordância e sorrio.
Vai juntar-se aos outros? Pergunta o homem dos pássaros, com uma piscadela de olho».
In
Joanna Taylor, O Baile de Máscaras, 2015, Edições ASA II, 2016, ISBN
978-989-233-518-6.
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