A Concepção do Estado em Marx e Engels
«(…) Por conseguinte, desde o seu nascimento, o Estado
moderno apresenta dois elementos que diferem dos Estados do passado, que não
existiam, por exemplo, nos Estados antigos dos gregos e dos romanos. A primeira
característica do Estado moderno é essa autonomia, essa plena soberania do
Estado, o qual não permite que a sua autoridade dependa de nenhuma outra
autoridade. A segunda característica é a distinção entre Estado e sociedade
civil, que vai evidenciar-se no século XVII, principalmente na Inglaterra, com
o ascenso da burguesia. O Estado se torna uma organização distinta da sociedade
civil, embora seja expressão desta. Uma terceira característica diferencia o
Estado moderno em relação àquele da Idade Média. O Estado medieval é
propriedade do senhor, é um Estado patrimonial: é património do monarca, do
marquês, do conde, do barão, etc. O senhor é dono do território, bem como de
tudo o que nele se encontra (homens e bens); pode vendê-lo, dá-lo de presente,
cedê-lo em qualquer momento, como se fosse uma área de caça reservada.
No Estado moderno, pelo contrário, existe uma identificação
absoluta entre o Estado e o monarca, o qual representa a soberania estatal.
Mais tarde, em fins de 1600, o rei francês Luís XIV afirmava L'État c'est
moi (o Estado sou eu), no sentido de que ele detinha o poder absoluto; mas
também de que ele identificava-se completamente no Estado.
Os pensadores políticos desde N. Maquiavel até G.W.F. Hegel
Nicolau Maquiavel (1469-1527)
Maquiavel, ao reflectir sobre a realidade de sua época, elaborou
não uma teoria do Estado moderno, mas sim uma teoria de como se formam os
Estados, de como na verdade se constitui o Estado moderno. Isso é o começo da
ciência política; ou, se quisermos, da teoria e da técnica da política
entendida como uma disciplina autónoma, separada da moral e da religião. O
Estado, para Maquiavel, não tem mais a função de assegurar a felicidade e a
virtude, segundo afirmava Aristóteles. Também não é, como para os pensadores da
Idade Média, uma preparação dos homens ao Reino de Deus. Para Maquiavel o
Estado passa a ter as suas próprias características, faz política, segue a sua
técnica e as suas próprias leis. Logo no começo de O príncipe, Maquiavel
escreve: como a minha finalidade é a de escrever coisa útil para quem a entender,
julguei mais conveniente acompanhar a realidade efectiva do que a imaginação
sobre esta. Trata-se já da linha do pensamento experimental, na mesma senda
de Leonardo da Vinci: as coisas como elas são, a realidade política e social
como ela é, a verdade efectiva.
Maquiavel acrescenta: muitos imaginam repúblicas e
principados que nunca foram vistos nem conhecidos realmente; isto é, muitos
imaginam Estados ideais, que no entanto não existem, tais como a República de
Platão. Pois grande é a diferença entre a maneira em que se vive e aquela em
que se deveria viver; assim, quem deixar de fazer o que é de costume para fazer
o que deveria ser feito encaminha-se mais para a ruína do que para a sua
salvação. Porque quem quiser comportar-se em todas as circunstâncias como um
homem bom vai ter que perecer entre tantos que não são bons. Isso significa que
devemos estudar as coisas como elas são e devemos observar o que se pode e é
necessário fazer, não aquilo que seria certo fazer; pois quem quiser ser bom
entre os maus fica arruinado. Enfim, é necessário levar em consideração a
natureza do homem e actuar na realidade efectiva». In Luciano Gruppi, Tudo Começou
com Maquiavel, L&PM Editores, 1980, ISBN 978-852-540-500-5.
Cortesia de L&PME/JDACT