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Isabel. Maio de 1588
«(…) Pergunto-me quanto tempo foi
preciso para se organizarem. Claro, eles continuam esperando que alguém coloque
Maria, rainha dos escoceses, no trono, transformando a Inglaterra num país
católico sem que tenham de mover um dedo para isso. Temos que agradecer por dar
um fim nisso, disse a Walsingham. Ele
suavizou um pouco a expressão sombria. Parecia sempre tão sisudo aquele meu
mestre da espionagem. Não celebrava nem as vitórias. Ele apenas concordou com a
cabeça e declarou: ela acabou com isso. Eu só expus seus planos e mentiras. Hoje
a Inglaterra ainda é a maior ameaça ao triunfo da contra-reforma. Roma mudou de
rumo e passou a reverter as vitórias protestantes, retomando territórios. No
entanto, somos o único país em que a oposição a Roma pode ficar segura,
construindo uma carreira e uma vida. Por essa razão, eles precisam eliminar-nos.
Tem cunho religioso, mas também político, disse Burghley. E há alguma
diferença?, perguntou Leicester. Quanto tempo acha que temos antes de nos
atacarem?, perguntei a Walsingham. Quanto tempo temos para nos preparar? Reformamos
os faróis e consertamos as fortalezas costeiras durante todo o Inverno, respondeu
Burghley. Mas todos sabemos, e podemos falar com franqueza aqui, que não temos
castelos que consigam enfrentar o cerco da artilharia espanhola. Provavelmente,
aportarão em Kent, vindos da Flandres. Kent é uma região aberta e de fácil
travessia. Não temos armas suficientes, e as que temos são muito antigas. E há
também muita coisa que não sabemos. E os ingleses católicos? Eles lutarão
contra os espanhóis? A quem são fiéis? Por essas razões,
meus bons conselheiros, nossa única esperança de vitória está em não permitir
que os espanhóis atraquem aqui, repeti. Convoquem Drake, disse Burghley. Onde
ele está?, perguntou Leicester. Em Plymouth, disse Walsingham. Mas virá
imediatamente.
Quando se levantaram para ir
embora, acenei para Robert Dudley, o lorde Leicester, que colocava o chapéu.
Ele parou e aguardou. Venha, vamos dar uma volta no jardim, convidei, ou
ordenei. Quase não o vejo desde que voltou dos Países Baixos no Inverno passado.
Ele sorriu e disse: claro, eu adoraria, e virou-se para me acompanhar. Voltamos
ao jardim da rainha, três jardineiros trabalhavam muito ocupados, plantando
ervas nos canteiros, bem curvados e concentrados na sua tarefa. Será que
deveria pedir para eles saírem? Eles poderiam ouvir o conteúdo da nossa
conversa e, sem dúvida, repeti-lo. Não, era melhor que ficassem. Não planeava
dizer nada que não pudesse ser repetido. Parece bem, disse para começar a
conversa. Entenderei isso como um elogio, mas estive doente e minha aparência estava
lastimável quando retornei. Então, qualquer melhora é visível.
É verdade, comentei, fitando-o
e percebendo que o seu rosto voltava a ter as cores e o semblante que os Países
Baixos lhe haviam roubado. No entanto, ele ainda não parecia saudável. E nunca
mais seria jovem nem bonito novamente. O tempo fora cruel com ele, a quem
considerava os meus olhos, o homem que chegou a ser a criatura mais
gloriosa do meu país há trinta anos. O cabelo castanho e espesso havia
diminuído e agora estava grisalho; o bigode e a barba antes exuberantes,
elegantes e cheios de brilho, agora eram ralos e pálidos. Os profundos olhos
castanhos penetrantes agora pareciam lacrimejantes e suplicantes. Talvez não
tenha sido apenas os Países Baixos que acabaram com ele, mas sim os dez anos
vividos ao lado da famosa e exigente Lettice Knollys, sua esposa. Os Países
Baixos foram cruéis consigo, disse. E comigo também. Pensei no quanto aquilo me
custara sem que nada fosse resolvido.
Tantas mortes, tanto desperdício
dos recursos do país. Ele parou no meio do nosso lento passeio pela relva e
disse: sem o nosso auxílio, os espanhóis já teriam acabado com os rebeldes protestantes.
Por isso, não pense que fora em vão. Às vezes penso que tudo o que fizemos
foi dar aos espanhóis a oportunidade de treino em batalhas, ajudando-os a se
aperfeiçoarem para nos atacar aqui. Retomamos a nossa caminhada, seguindo para
o relógio de sol no meio do jardim, a peça central do ambiente. Fui o primeiro
a ver o exército do duque de Parma e é realmente tudo o que dizem ser. Quer
dizer, o melhor exército da Europa? Sim, eu sei disso. Mas está desfalcado por
doenças e deserções como qualquer outro». In Margaret George, Isabel I, O Anoitecer de
um Reinado, tradução de Lara Freitas, Geração Editorial, 2012, ISBN
978-858-130-076-4.
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