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A
Mulher que Amou Jesus
«(…) O que eu gostaria de saber é
por que quis ficar lá? É
essa a questão! Maria queria contar a sua mãe que aquela família era
maravilhosa, queria dizer-lhe como havia se divertido conversando com eles,
queria contar a aventura da dor de dente. Mas sabia que a decisão de José, de
quebrar deliberadamente as normas do Sabá, não iria agradar aos seus pais.
Preferiu não contar e, baixando os olhos, disse apenas: eles parecem muito generosos.
Seu pai aproximou-se. A cidade de Nazaré tem má reputação. E aquele
rapaz, Jesus... Fiz-lhe umas perguntas sobre as escrituras e... E ele
conhece-as melhor que o senhor, disse Silvanus, que estava atrás dele. Quando
o senhor lhe perguntou sobre aquela passagem em Oseias, e deu uma risada, sabe
qual é, aquela que o senhor gosta de citar sobre o lamento da terra...
Já sei, já sei!, respondeu Natã,
irritado. Ele me pediu que lhe desse isto, disse Maria, entregando a seu
pai o cajado que Jesus e José tinham esculpido. Tinham insistido que ela o trouxesse,
como se quisessem acalmar Natã. Ela tinha recusado, era uma peça muito delicada
e eles a haviam trabalhado com carinho, mas eles tinham sido intransigentes. O
quê? Natã tomou o cajado e examinou-o. Seus lábios tremiam. Rodou o cajado,
olhando o trabalho entalhado. Isso é coisa de vaidade!, disse, jogando o cajado
no chão. Maria assustou-se. Silvanus aproximou-se, abaixou-se e pegou o cajado.
É pecado menosprezar um presente desse jeito, disse. Ah, é?, retrucou
seu pai. E onde é que as escrituras dizem isso? Virou-lhes as costas e foi-se
embora. Silvanus ficou passando a mão no cajado. Quando você se encontrar com
Jesus de novo, terá de lhe perguntar. Tenho a certeza de que existe
alguma passagem nos textos sagrados sobre não profanar um presente. E ele vai
saber, com certeza. Não vou voltar a encontrar-me com Jesus, disse
Maria. Estava certa disso. Seu pai a proibiria. Mas quando voltassem para
Magdala, estava decidida a ir visitar a sua nova amiga, Quezia. É claro que seu
pai também iria discordar, mas se não soubesse, não poderia proibir.
Magdala os esperava. Os
peregrinos que voltavam eram sempre o centro das atenções por alguns dias,
aguardados com ansiedade pelos amigos: como são as ruas de Jerusalém? Havia
muitos judeus estrangeiros? E o Templo, é realmente um esplendor? Entrar nos pátios
do Templo é a coisa mais importante da vida? Às vezes, a atenção que lhes era
solicitada e aquela adulação momentânea eram mais inebriantes que a própria
viagem. Depois ia desaparecendo, inevitavelmente. E o próximo grupo de peregrinos,
no caso, os que iriam a Jerusalém para o Yom Kippur, tomaria o lugar deles como
centro das atenções. Passaram-se várias semanas, seis Sabás, antes que Maria e
Quezia tornassem a se ver. Tinham conseguido comunicar-se e combinaram que Maria
iria a casa de Quezia, onde faria uma refeição com a família. Seria uma tarde
em que Maria supostamente ia ver uma exposição de tecelagem, numa casa próxima à
sua, que seria feita por um mestre tecelão de tapetes, de Tiro. Ela assistiu ao
trabalho do artesão por alguns minutos, enquanto pensava: é muito bonito, mas
eu jamais seria capaz de fazê-lo. E saiu da oficina, à beira do lago,
apressando o passo quando atravessou o mercado, cheio de gente, e seguiu a rua
que ia na direcção norte, para a região da cidade que ficava na colina em que
estavam as casas novas. A ladeira era íngreme e ela parou um pouco para tomar fôlego.
À sua volta, as casas iam ficando maiores e mais bonitas, com muros para a rua,
o que deveria significar que o que quer que houvesse lá dentro merecia ser bem
guardado». In Margaret George, A Paixão de Maria Madalena, 2002, Saída de
Emergência, Edições Fio de Navalha, 2005, ISBN 972-883-911-1.
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