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Estava um pouco bêbado..., confessou Louis Villeclaire,
como se preparasse os amigos para o que se seguiria. Tendo provado a ele próprio
que essa era, de facto, uma noite de sorte excepcional e guardando já os 300
francos que acabava de ganhar numa única jogada, foi parado por uma mão que lhe
travou o braço. Era Duvernois! Meu jovem marquês! Reparei que ainda agora
entrou e já o vejo sair. Uma noite má? Não, muito pelo contrário! Vim provar a
mim mesmo que estou invencível..., respondeu com uma gargalhada. Os olhos do
velho tabelião brilharam ao ouvi-lo dizer tal coisa e ali mesmo o desafiou para
uma aposta absurda com o argumento de que não havia homens invencíveis, nem
sequer por uma única noite. Villeclaire que escolhesse um número, sem fichas na
mesa. Ele, Duvernois, escolheria outro. Se nenhum deles acertasse a coisa
ficaria por aí mesmo, aprendendo Villeclaire que Duvernois tinha razão quanto à
impossibilidade de se ser absolutamente invencível. Se algum deles acertasse, receberia
do outro dois bilhões de francos... Dois bilhões!, exclamou Marcel de Bachelard
em tom chocado com a exorbitância do montante da aposta. Trinta e três
vermelho!, disse Villeclaire, e ainda acrescentou: contra todos os outros números,
Duvernois. Hoje estou especialmente generoso. Os quatro rapazes soltaram
exclamações de horror. E Gaston não se conteve: um pouco bêbado, Louis? Estava
completamente embriagado... Villeclaire não lhe respondeu e continuou contando
aos amigos que esse número lhe veio à cabeça por ser a idade de madame
Bousquet; e a cor? Ah! A cor do vestido que essa senhora usava nessa noite e
espalhava nos cabelos ruivos um ardente tom de fogo. Era um cavaleiro e, por
isso mesmo, dispensou-se de acrescentar que eram também de fogo os beijos que
trocou com ela, no jardim, enquanto o marido jogava bilhar e fumava charutos no
aconchego elegante da sala de fumo dos condes de Balac. Depois dos beijos,
escondidos numa estufa de plantas, os dedos dela desapertaram um a um os pequenos
botões de madrepérola que fechavam as calças de Louis, libertando-lhe o sexo. Ajoelhando-se
na relva, lambeu-o. Primeiro, delicadamente, passeando a língua ao longo
daquele tronco duro e enorme, enquanto o marquês lhe segurava os seios, com
violência. Depois, rolaram os dois pelo chão, numa confusão de saias de seda.
Ela gemia de desejo, pedindo que a possuísse. Mas Louis prolongava-lhe o prazer
explorando com os dedos o interior do seu ser até que, finalmente, lhe tapou a
boca com a sua, entrelaçando a língua, e deixou que a sua virilidade explodisse
dentro dela, fazendo arquear o corpo. Ah! Tinha sido maravilhosamente selvagem…
Mas era uma recordação íntima e que um homem bem-educado nunca dividiria com
ninguém, nem com os seus melhores amigos. E?..., perguntou Gaston Montblanc. E
saiu o 33 vermelho..., disse Louis Villeclaire. Todos ficaram em silêncio
perante tamanha temeridade. E o estouvado marquês prosseguiu com a sua história:
dois dias depois passou pelo gabinete de Duvernois, na Rue des Francs
Bourgeois, para cobrar a dívida, e o velho tabelião confessou-lhe não ter o
dinheiro disponível. Mas logo ali se prontificou a assinar uma nota de dívida,
a vencer daí a duas semanas, em 18 de novembro de 1857. Amanhã..., sussurrou
Laurent de Juy. Villeclaire continuou a contar os pormenores do negócio que,
por vontade Duvernois, tinha ficado estabelecido em escritura pública feita
perante um outro tabelião, amigo do devedor. Se, na data combinada, Duvernois
continuasse a não ter disponível a quantia devida, os dois bilhões de francos,
todos os seus bens passariam para a posse de Villeclaire. Por isso, meus
amigos, bebamos! Esta noite fiquei dois bilhões de francos mais rico e, passada
uma semana de luto, como manda a decência, tenciono visitar a família do bom
Duvernois para apresentar condolências e..., cobrar a minha dívida! Família?
Será que o Duvernois tem família?, perguntou Gaston Montblanc. Sabemos que
vivia numa bela casa na Rue des Archives e que tinha gabinete na Rue des Francs
Bourgeois. Mas família? Nunca ouvi falar... Vocês ouviram? Todos concordaram
que, apesar de Duvernois ser um homem conhecido em todos os locais de Paris
onde houvesse apostas, nunca ninguém tinha visto a família. Nem sequer tinham
ouvido falar... Nem nas corridas de cavalos de Chantilly apareceu alguma vez
com a mulher, lembrou Marcel. Pierre soltou uma gargalhada: e nunca o vimos em
nenhum lado onde houvesse mulheres! O velho era louco por cavalos e mesas de
jogo, mas mulheres... Haverá, certamente, uma velha e simpática madame
Duvernois escondida na casa da Rue des Archives. Ou, no pior dos casos, um
procurador qualquer que agora trate dessas minúcias, disse Louis». In
Matilda Wright, Aposta Indecente, 2011, Editor Livros d’Hoje, Publicações dom
Quixote, 2011, ISBN 978-972-204-776-0.
Cortesia de
Ld’Hoje/JDACT