domingo, 26 de agosto de 2018

Mulheres. Charles Bukowski. «Numa manhã, alguns dias mais tarde, entrei no pátio de Lydia no momento em que ela chegava, vinda do jardim. Tinha ido visitar a sua amiga Tina, que vivia num apartamento ao fundo da rua»

jdact e wikipedia

«(…) Quando se levantou para se dirigir ao frigorífico, segui-a. Tirou uma garrafa e fechou a porta. Virou-se para mim, enlacei-a pela cintura e puxei-a. Colei a minha boca e o meu corpo contra ela. Segurava a garrafa de cerveja com o braço estendido. Beijei-a. Voltei a beijá- la. Lydia empurrou-me. Está bem», disse ela, chega. Temos trabalho a fazer. Voltámos a sentar-nos e bebi a minha cerveja, enquanto Lydia fumava um cigarro. O barro continuava entre nós. A campainha da porta soou. Lydia levantou-se. Uma mulher gorda com olhos loucos, suplicantes, entrou. Esta é a minha irmã, Glendoline. Olá. Glendoline puxou por uma cadeira e começou a falar. Sabia falar. Teria falado mesmo que fosse uma esfinge, mesmo que fosse uma pedra. Eu perguntava-me quando é que ela se cansaria e se decidiria a partir. Mesmo depois de ter renunciado a ouvi- la, tinha a impressão de estar a ser bombardeado por pequenas bolas de pingue-pongue. Glendoline não tinha nenhuma noção de tempo nem a menor ideia de que poderia estar a mais. Falava ininterruptamente. Ouve, acabei por dizer, quando é que te vais embora? Depois teve início o número das irmãs. Começaram a falar uma com a outra. Estavam ambas em pé e agitavam os braços. As vozes subiram de tom. Elas ameaçavam-se mutuamente com violência física. Finalmente, perto do fim do mundo, Glendoline efectuou uma espectacular rotação do torso, lançou-se para a saída, batendo com a porta de rede, e desapareceu, mas ouviam-se ainda as suas lamúrias sonoras, em direcção ao seu apartamento no fundo do pátio, aquele que desacertava com o outro, agradava-me. Lydia e eu regressámos para o canto da cozinha e sentámo-nos. Ela apanhou o seu instrumento de esculpir. Os seus olhos mergulharam nos meus.

Numa manhã, alguns dias mais tarde, entrei no pátio de Lydia no momento em que ela chegava, vinda do jardim. Tinha ido visitar a sua amiga Tina, que vivia num apartamento ao fundo da rua. Nessa manhã parecia eléctrica, um pouco como da primeira vez que estivera em minha casa com a laranja. Oh, disse, tens uma camisa nova! Era verdade. Comprara a camisa porque tinha pensado em Lydia e desejava estar com ela. Eu sabia que ela tinha consciência disso e me estava a gozar, mas não me importava. Lydia abriu a porta e entrámos. O barro estava pousado no centro da mesa da cozinha sob um pano húmido. Puxou o pano. O que é que achas? Lydia não me tinha poupado. As cicatrizes lá estavam, o nariz de alcoólico, a boca de macaco, os olhos reduzidos a fendas, e lá estava também o sorriso estúpido, contente e ridículo de um homem feliz sem saber porquê. Ela tinha trinta anos e eu mais de cinquenta. Não me importava. Sim, disse eu, apanhaste-me em cheio. Gosto. Parece quase acabado. Vou ficar deprimido quando estiver feito. Passámos manhãs e tardes soberbas.
Isto interferiu com a tua escrita? Não, só escrevo à noite. Nunca consegui escrever de dia. Lydia agarrou no instrumento de esculpir e olhou para mim. Não te preocupes. Tenho muito mais trabalho a fazer. Quero que isto fique bem. No seu primeiro intervalo, foi buscar uma garrafa de whisky ao frigorífico. Ah, disse eu. Como queres?, perguntou-me, levantando um grande copo. Metade, metade. Preparou a bebida e bebi num só trago. Ouvi falar de ti, disse-me. Sobre quê? Sobre o modo como corres com tipos da tua porta. E que bates nas tuas mulheres. Que bato nas minhas mulheres? Sim, disseram-me. Agarrei-me à Lydia e perdemo-nos no mais longo beijo de sempre. Segurei-a de encontro ao rebordo do lava-loiças e comecei a roçar o meu ca… nela. Ela afastou-me, mas apanhei-a de novo a meio da cozinha. A mão de Lydia alcançou a minha e levou-a para dentro das suas cuecas. A ponta de um dos dedos sentiu o alto da sua … Estava molhada. Enquanto continuava a beijá-la, enfiava- lhe o dedo dentro da … Depois tirei a mão, afastei-me, agarrei na garrafa e servi-me doutra bebida. Sentei-me à mesa da cozinha, Lydia deu a volta, e sentou-se do outro lado, olhando para mim. Depois pôs-se de novo a trabalhar no barro. Eu bebia devagar o meu whisky. Escuta, disse eu, sei qual é o teu problema. O quê? Sei qual é o teu problema. O que é que queres dizer? Olha, disse eu, esquece. Eu quero saber. Não te quero ferir. Raios, quero saber do que estás a falar. Ok, dir-te-ei se me deres outro copo. Está bem. Lydia pegou no meu copo vazio e encheu-o com metade de whisky e metade de água. Bebi-o, de novo, de um só trago. Então?, perguntou-me. Ora bolas, tu sabes. Sei o quê? Que tens uma grande … O quê? Não é nada de excepcional. Tiveste duas crianças». In Charles Bukowski, Mulheres, 1978, 1985, Editora dom Quixote, 2001, ISBN 978-972-202-006-0.
                                                   
Cortesia de EdomQuixote/JDACT