jdact
António
Borges
Introdução
«O estudo das cidades e vilas de Portugal
mereceu, no último quartel do século XX, um interesse especial, em parte devido
aos trabalhos realizados por jovens historiadores. Mas o primeiro impulso foi dado,
certamente, pelo professor Oliveira Marques, seguindo um movimento historiográfico
iniciado além-fronteiras decénios antes. Assim surgiram trabalhos em moldes
novos, mas que beberam muitos dos ensinamentos nos monografistas dos finais do século
XIX, autores geralmente motivados pelo amor à terra, embora seguindo uma directiva
do governo (portaria de 15 de Abril de 1854) que mandava fazer história das vilas
e cidades de Portugal (Portaria de 15 de Abril de 1854, antecedida por uma
outra de 1847, que ordenava que em cada concelho fosse nomeada uma comissão para
escrever os anais dos respectivos municípios). No entanto, os estudos
recentemente realizados, muitas vezes tema de dissertação de Mestrado ou Doutoramento,
apresentam-se escorados num aparato conceptual e crítico baseado nas mais modernas
correntes historiográficas, as quais obrigam a critérios de rigor, sendo os
respectivos resultados suportados em sólida documentação, em muitos casos inédita.
Estudos que revelam, para os diversos casos, muitas semelhanças e pontos de convergência,
mas também algumas assimetrias para o nosso país, ao nível do crescimento, evolução
e, em particular, no que respeita à implantação urbana. De facto e tendo esses trabalhos
versado sobre agregados urbanos, desde Ponte de Lima a Silves, verifica-se que,
no seu conjunto, há um certo bascular para ocidente, em direcção ao Atlântico, numa
tendência iniciada muito antes da conquista do mar-oceano. Atracção pelo litoral
bem notória no traçado dos itinerários régios, que os condicionalismos
geo-políticos e naturais parecem não ter conseguido corrigir ao longo dos oito séculos
da nossa História como país soberano. Dos cerca de duas dezenas de estudos de vilas
e cidades de todo o Portugal, elaborados no último quartel do século XX, poucos
abordaram o mundo beirão. Refira-se, no entanto, o estudo sobre a Guarda medieval,
sede episcopal e, por esse facto, promovida a cidade desde longa data. Do mesmo
modo poderemos destacar Proença-a-Velha, de Manuela Mendonça, e também Castelo
Branco, capital de distrito, que mereceu um estudo de Ana Cristina Leite. Um pouco
mais a sul, na zona centro do país, foram também estudadas as vilas de Tomar, sede
da Ordem de Cristo e Abrantes, esta estrategicamente colocada na estrada do Tejo.
Para o nosso trabalho escolhemos uma
vila do interior da Beira, bem longe do dinamismo do litoral. É sabido que a Beira
Baixa foi uma região secularmente deficitária em recursos económicos e humanos,
sujeita às investidas da vizinha Castela. Contudo, nem a criação do Bispado na Guarda
impediu a instalação de mosteiro se outras instituições religiosas, que marcaram
presença nesta região, logo que passou a estar senhoreada pela Cristandade. Porém,
nunca essas instituições aqui atingiram a riqueza e esplendor dos mosteiros do litoral.
Por isso, os acervos documentais oriundos destas comunidades são em número diminuto,
dificultando a tarefa de quem pretenda conhecer o passado e organização da vida
nestas paragens. A urbanização foi, também ela, pouco intensa, reduzindo assim a
hipótese de centros produtores de documentos.
Apesar destas condicionantes e consciente
das dificuldades, lançamo-nos na aventura de ir ao encontro da Covilhã, nos primitivos
séculos do seu percurso histórico. Não esquecemos, todavia, que esta cidade já teve
os seus historiadores, entre eles se destacando o padre Manuel Cabral Pina. Outros
autores, numa visão mais ou menos de conjunto, ou em estudos de cariz temático,
por exemplo sobre a comunidade judaica, abordaram a história da Covilhã. Pensamos,
todavia, que faltava ainda uma investigação sobre o período crucial da formação
da vila, que situamos entre a concessão do foral (1186) e a doação do senhorio da
Covilhã ao infante Henrique (1415)». In Maria Graça Vicente, Covilhã Medieval, O
Espaço e as Gentes, Séculos XII a XV, Edições Colibri, Academia Portuguesa da
História, 2012, ISBN 978-989-689-226-5.
Cortesia de EColibri/JDACT