sexta-feira, 28 de junho de 2019

Os Sete Minutos Irving Wallace. «Mostrava-se desalentado com a Sanford House, que o pai dirigia com mão de ferro. Mas a última vez que Barrett conversara com Phil Sanford, há apenas três meses…»

jdact

«(…) Ah, ainda bem que o senhor chegou. Mr. Barrett. Houve dois telefonemas interurbanos, urgentes, na última meia hora. Ambos da mesma pessoa. Um tal mr. Philip Sanford, de Nova Iorque, ele queria que o senhor ligasse para lá assim que chegasse. Deixou o número do escritório e o da residência. Vejamos. São apenas três e vinte em Nova Iorque. Experimente o do escritório. Levantando-se do sofá, despindo a camisa e atirando-a de lado, foi preparar um sumo de frutas na pequena cozinha. Enquanto enchia o copo, pôs-se a pensar em Phil Sanford. Estranhava duas coisas nos dois telefonemas consecutivos. Sanford passava muito tempo sem comunicar com ele, e quando o chamava, poucas vezes por ano, era sempre à noite. Além disso, as ligações eram sempre despreocupadas, sem pressa: a necessidade de um amigo solitário de estabelecer contacto numa reafirmação de amizade. O pobre Sanford contava com um mínimo de carinho da mulher e absolutamente nenhum do pai tirânico. Mas os telefonemas desta manhã, pelo visto, não tinham sido por cortesia social. Diziam-se urgentes. E agora Barrett perguntava-se porquê. Tomando o sumo de frutas, Barrett pensou no velho amigo e na amizade que os unia, amizade mais antiga, mas menos agradável do que a que tinha por Abe Zelkin. Depois de Harvard, quando tanto ele como Philip Sanford tinham ido para Nova Iorque, ele para se transformar num benemérito desiludido, Sanford para se dedicar à famosa editora paterna, os dois ex-colegas de quarto costumavam encontrar-se com regularidade. Não só simpatizava com Phil como lhe devia muitos favores, por tudo que fizera durante o ano em que Barrett passara dificuldades com a mãe. Mesmo após o casamento de Phil Sanford, Barrett continuou a ver o amigo uma vez por semana, quando almoçavam juntos no Baroque Restaurant ou iam assistir, ocasionalmente, a algum acontecimento desportivo no Madison Square Garden. Mudando-se para a Califórnia, Barrett, desde então, encontrara-se com Sanford apenas meia dúzia de vezes. Essas ocasiões não lhe haviam causado nenhum prazer. Phil Sanford parecia sempre taciturno quando falava sobre a mulher e os dois filhos. Mostrava-se desalentado com a Sanford House, que o pai dirigia com mão de ferro.
Mas a última vez que Barrett conversara com Phil Sanford, há apenas três meses, mais ou menos, quando tivera de tomar o avião para Nova Iorque para tratar de um negócio urgente e os dois tinham jantado juntos no Salão de Carvalho, no Plaza, o encontro tornara-se mais alegre do que de costume. A vida de Sanford mudara radicalmente nos meses que antecederam essa reunião com Barrett. Pela primeira vez, viera-lhe uma oportunidade de provar o seu valor. Embora estivesse cheio de angústias, estava também cheio de entusiasmo. Aquele gigante da publicidade, Wesley R. Sanford, pai de Philip, fora vitimado por um ataque súbito. Embora não houvesse sido violento, servira de advertência suficientemente forte para o obrigar a aposentar-se. Aos olhos do colosso grisalho abatido, a Sanford House, por tanto tempo descobridora e incentivadora de escritores agraciados com o Prémio Nobel de literatura, com o Prémio Pulitzer, o Prix Goncourt, era agora uma editora acéfala. Phil Sanford, o único herdeiro, fora sempre tratado com condescendência, e até desdém, pelo poderoso pai. Era como se o gigante que se fizera por si mesmo sempre houvesse sabido que não poderia engendrar outro à própria imagem e semelhança. Considerava o filho como um pigmeu, pusilânime e incompetente, um fracasso total. Essa fora a Cruz de Phil, e o facto de ter sofrido semelhante tratamento durante tanto tempo sem tomar a iniciativa de se estabelecer por conta própria acabara por contagiar a esposa, que também passara a considerá-lo pusilânime e covarde.
O rumor de que Wesley R. Sanford deixara um próspero negócio editorial, sem herdeiro satisfatório, espalhou-se rapidamente pelos círculos editoriais até chegar aos ouvidos de Wall Street. Grandes complexos de comunicações, conglomerados em busca da diversificação dos seus valores mobiliários, mostraram interesse em comprar a firma, com o seu valioso acervo de autores e nome de prestígio. Restabelecendo-se apenas em parte do ataque, Wesley R. Sanford, segundo se dizia, estava disposto a vendê-la. Foi então que o filho se aproximou da cabeceira do pai e, pela primeira vez, implorou uma oportunidade. Seja porque a doença privara o gigante convalescente de firmeza de ânimo ou seja porque estivera à espera de que o herdeiro fizesse um apelo desse género e ficara impressionado. Wesley R. Sanford prometeu, em termos ásperos, conceder a oportunidade pedida. Philip Sanford recebeu dois anos de prazo para provar que era editor capaz e independente. Se nesse período mantivesse a firma solvente, conservando e expandindo o seu prestígio, ela continuaria pertencendo à família, com Philip no cargo de presidente e eventual proprietário. No entanto, se a sua orientação se manifestasse defeituosa, seria destituído da administração, e a casa editora vendida por completo, inclusive o acervo existente, a uma das indústrias de comunicações que a cobiçava». In Irving Wallace, Os Sete Minutos, Coleção Dois Mundos,  Livros do Brasil, 1988, ISBN 978-972-380-948-0.

Cortesia de CDMundos/LdoBrasil/JDACT