domingo, 7 de julho de 2019

A Favorita do rei Dinis. Vataça. Francisco do Ó Pacheco. «Olá, princesa Vataça. Como tem passado? Bem, Alteza Rea1, respondeu Vataça enquanto fazia a vénia dobrando os joelhos e baixando a cabeça. Continuais linda, princesa»

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«(…) Tudo pronto para receber el-rei Dinis I que não demorou a entrar pela cidade adentro, com os seus cavaleiros e com as bandeiras e estandartes do reino português, à frente, assinalando a real comitiva. Às portas do palácio de Alcazar, o rei de Castela Fernando e sua esposa dona Constança e inúmeros nobres e aias da corte castelhana. Dinis apeou-se do cavalo e abraçou o seu genro com carinho e amizade. Depois voltou-se para sua filha Constança, estendeu-lhe os braços e esperou que a jovem rainha se atirasse ao seu pescoço e o beijasse efusivamente. Deixou-se ficar com a filha nos braços e sentiu, de novo, com emoção, esse sentimento paternal que pensava já o ter abandonado, porque sua filha já estava em Castela havia mais de dois anos. Depois de receber cumprimentos dos mais altos dignitários da igreja e da nobreza de Castela, Dinis percorreu com o olhar as aias da rainha e descobriu Vataça Lascaris, a quem se dirigiu de imediato.
Olá, princesa Vataça. Como tem passado? Bem, Alteza Rea1, respondeu Vataça enquanto fazia a vénia dobrando os joelhos e baixando a cabeça. Continuais linda, princesa. Vataça já não respondeu e enquanto sentia o rubor nas suas faces, el-rei Dinis afastou-se e caminhava já ao lado de Fernando de Castela e de sua filha Constança dirigindo-se para o interior do palácio toledano com ambas as comitivas reais. À noite ao jantar no sa1ão principal de Alcazar, a Corte castelhana preparava-se para ofertar um opíparo jantar aos seus convidados portugueses. Naquela enorme mesa nada faltava. Os melhores vinhos e os melhores manjares enchiam o centro da mesa de uma ponta à outra. Javalis e leitões assados no espeto, faisões e patos, castanhos-escuros brilhantes das assaduras em fornos de lenha especiais, salmões e trutas do rio Tejo, frutas de todas as variedades ibéricas e algumas do norte de África. O rei de Castela deu o mote, após umas breves palavras de boas-vindas ao rei português, agarrou uma das facas que tinha à sua beira, cortou uma perna do faisão e levou-a à boca, com apetite devorador, cravando-lhe os dentes na tenra carne.
Estava divinal, acrescentava, enquanto mastigava com prazer. E todas as largas dezenas de comensais seguiram o seu exemplo, atirando-se literalmente às travessas repletas de iguarias. Dinis, que se havia sentado no outro topo da mesa, de frente para Fernando de Castela, chamara para o seu lado a princesa Vataça Lascaris, com quem falava alrgremente e de vez em quando elevava a caneca de vinho e saudava o seu genro e rei de toda a Corte de Castela. Vataça perguntara como estava a rainha Isabel, a quem ligavam profundos sentimentos de amizade e respeito. Lá continua muito atarefada, dizia Dinis, com as suas devoções e com os seus auxílios aos pobres e desprotegidos de Portugal. Todas as manhãs são as matinas e os louvores a Deus. À tarde reza as vésperas e faz as leituras canónicas da Santa Igreja. Nos períodos de maior fervor religioso, como na Quaresma ou no Advento, faz os seus jejuns. Tem períodos que chama ao palácio todos os pobres e lava-os, veste-os e alimenta-os. Por vezes tenho que chamar a guarda para colocar alguma disciplina nesses desgraçados que vêm aos milhares de todo o país e até de Castela. Sabem que a Senhora é um coração de ouro e não hesitam em chegar-se até ela. E continua a fundar conventos e casas de acolhimento por todo o Portugal?, perguntou Vataça Lascaris». In Francisco do Ó Pacheco, Vataça, A Favorita de Dom Dinis, Prime Books, 2013, ISBN 978-989-655-183-4.

Cortesia de PBooks/JDACT