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Apólogos Dialogais e diálogos alegóricos
«(…) Os Apólogos Dialogais, de que
conservamos quatro completos, Os
Relógios Falantes, O
Escritório Avarento, A Visita das Fontes e O Hospital das Letras, o esboço de um outro, A Feira dos Anexins, e o indício
de que um sexto terá ficado por realizar, O Cabido dos Coches, não foram editados em vida de dom
Francisco Manuel Melo. A editio princeps
dos quatro diálogos imaginários data da centúria de setecentos e só nos
finais do século passado se deu a conhecer A Feira dos Anexins. Não são excepções, a este respeito, no
conjunto da vastíssima obra do autor da farsa O Fidalgo Aprendiz. Seja como for, isso não significa que os
diferentes textos, em conjunto e em separado, não tivessem circulado com feliz
fortuna. Quando Francisco Manuel Melo escreve os Apólogos tinha já atrás de si obras sobremaneira importantes
no âmbito do barroco peninsular. Em castelhano, escrevera a Historia de los movimientos y separación de Catalunya,
obra dada à estampa em Lisboa em 1645, com o pseudónimo de Clemente Libertino.
É, sem dúvida, o livro que lhe granjeou mais fama em Espanha. Juan Luis Alborg,
no capítulo referente ao Barroco da sua conhecida Historia de la literatura española, recorda as palavras
encomiásticas de Cayetano Rosell, para quem o texto historiográfico de
Francisco Manuel é la joya de más precio que brilla en todo nuestro tesoro
histórico e, ainda, el modelo más perfecto de aquel siglo.
O próprio Alborg se pronuncia em
termos elogiosos:
Melo, evidentemente, maneja un perfecto
castellano y posee extraordinarias dotes para narrar y describir; sus imágenes
son tan poderosas como certeras, y lo mismo los personajes que los hechos son
definidos con una robusta y gráfica energía que nos parece lo más sobresaliente
de la obra.
Em 1650 redige a Carta de Guia de Casados, a
sua primeira obra em prosa escrita em português, texto que se destaca da
tradição moralística peninsular sobre o casamento, publicando-o por primeira vez
em 1651. E, claro está, há que mencionar obrigatoriamente O Fidalgo Aprendiz, escrito
à volta de 1646, caso singular no
panorama depauperado do teatro português coevo. Três textos que, por si sós,
reservam a Francisco Manuel um lugar cimeiro na República das Letras de
seiscentos. Contudo, e esta é matéria de consenso, os Apólogos superariam esses
conseguimentos, já de si notáveis. Do Hospital
das Letras, por exemplo, dirá um Alexandre Herculano que é
certamente por todos os títulos o melhor e mais claro testemunho da vasta lição
de Francisco Manoel, bem como da clareza do seu juízo em matérias literárias. O
Prof. Rodrigues Lapa refere-se à constância do consenso crítico em relação aos Apólogos quando, na apresentação
da sua edição de Os Relógios
Falantes, afirma
serem na opinião da maioria, a sua melhor obra, a que resume na verdade as
prendas do seu espírito: a prontidão do chiste, a rica fantasia e a observação
moral da vida e dos homens. Para Giacinto Manuppella, um dos mais documentados
estudiosos destes textos, são quatro obras-primas, repassadas de imperecível
vitalidade artística.
Com Os Apólogos Dialogais, Francisco Manuel insere-se numa
tradição de textos cujo modelo português das primeiras décadas do século XVII é
a Corte na Aldeia, de
Rodrigues Lobo. Por outro lado, é o próprio Francisco a estimular a aproximação
comparativa com outros textos peninsulares afins. O nome que imediatamente se
nos afigura comparável é
o de Francisco Quevedo, de resto amigo e correspondente de Francisco. Em
Os Relógios Falantes,
a Fonte Velha faz referência a La
hora de todos e fortuna con seso do autor espanhol:
Até um livro me dizem que saiu
agora que chamam Hora de Todos,
que, com galantaria digna de seu autor, se esmera muito em provar, com
discursos e exemplos, esta verdade.
Mais ainda, na Dedicatória de A Visita das Fontes, a
Cristóvão Soares Abreu, Francisco recordaria uma vez mais o poeta espanhol: neste
estado me acolheu esta leve ilusão que agora vos comunico. Não foi sonho, pois
não é de juro e herdade que hajam de sonhar todos os dons Franciscos. Sonhou o
de Quevedo, porque tinha ou Fama ou Sorte sobre que podia dormir seguro. Mas
eu, que há tantos anos que não repouso, mais depressa, de muito desvelado,
escreverei, antes que sonhos, dilírios!» In José Pina Martins, A Obra Poética, Dom
Francisco Manuel de Melo, Excerto, História e Antologia da Literatura
Portuguesa, Século XVII, nº 31, FCG, HALP, 2004, ISSN 1645-5169.
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