terça-feira, 5 de novembro de 2019

Bonus Rex ou Rex Inutilis. José Varandas. «Afinal, repetida até à exaustão, ou observada com os métodos críticos disponíveis no momento, a construção da imagem de Sancho II corresponde a objectivos bem determinados»

Cortesia de wikipedia e jdact

Sancho II de Portugal. Um Conspecto Historiográfico

Com a devida vénia ao Doutor José Varandas

Do Conspecto…
«(…) No seu conjunto o volume de informação disponível sobre o período de 1223 aos inícios de 1248 apresenta-se disperso por um conjunto de fontes documentais e narrativas, que foram apreciadas e utilizadas pela historiografia portuguesa, quer a do Antigo Regime, quer a mais próxima dos nossos tempos. De características bem distintas, com forte vínculo ao universo cronístico ou mais relacionadas com processos sistemáticos de crítica e utilização de fontes documentais, cabe às histórias gerais sobre Portugal, neste trabalho, a primeira palavra sobre os acontecimentos em torno do reinado de Sancho II.
Um outro aspecto que gostaríamos de salientar na elaboração da primeira parte deste trabalho relaciona-se com a forma como apresentamos as várias posições historiográficas sobre o reinado de Sancho II. Numa primeira abordagem, pareceu-nos que essa caracterização pudesse ser feita por modelos historiográficos, onde as várias visões sobre Sancho II pudessem ser observadas com maior coerência. E, continua a parecer-nos uma opção válida. Contudo, optámos por desenvolver um conspecto historiográfico ordenado por critérios cronológicos, desenvolvendo para cada um dos autores que nos pareceram mais pertinentes, as posições tomadas em relação à matéria disponível sobre a forma como a estrutura central e os subsistemas periféricos se relacionavam entre 1223 e 1245. Pensamos que este método, além de não desvirtuar as linhas metodológicas de cada uma das Histórias observadas, nem de as retirar dos complexos historiográficos e dos estímulos externos onde e com que foram produzidas, nos permitia observar o seu carácter evolutivo, e nesse aspecto percebermos, também, a evolução historiográfica das representações sobre Sancho II.
A maior parte das obras consultadas são obras de continuação, compilações ou meros resumos de outras, que as antecederam, e que pela sua forma e objectivos das obras de formação erudita. A opção por integrar, ambos os modelos, num processo de observação cronológico, também possibilita, pensamos, a percepção dos processos que levaram à sua elaboração. Afinal, repetida até à exaustão, ou observada com os métodos críticos disponíveis no momento, a construção da imagem de Sancho II corresponde a objectivos bem determinados. Se, à partida, possa parecer relevante a opção por aquelas obras que marcaram viragens historiográficas, ou seja, neste caso concreto, aqueles trabalhos que trouxeram novidades ao estudo da história do reinado de Sancho II, também nos pareceu interessante observarmos o acumular dos processos repetitivos reproduzidos, cronologicamente, em muitas histórias com carácter eminentemente divulgativo. Estas obras que não utilizam como suporte investigações originais, antes resultam do trabalho de recompilação, de síntese de memórias anteriores, ou de reescrita, sem sentido crítico, pareceram-nos ocupar um lugar próprio no que diz respeito à forma como a memória deste rei, o que foi deposto, foi construída e depois, ensinada e divulgada, desde os inícios do século XIX até aos nossos dias. E, é por isso que ao lado de obras de perfil marcadamente erudito e pautadas pela dinâmica das fontes e da sua interminável crítica, desfilam algumas dessas obras repetitivas e constantemente reescritas com as mesmas passagens. Se, por um lado, garantimos a apresentação de um estado da questão historiográfico, que evoluiu cronologicamente, por outro, associamos-lhe outra realidade, também inegavelmente de sentido cronológico, e que está representada por esta historiografia divulgativa». In José Varandas, Bonus Rex ou Rex Inutilis, As Periferias e o Centro. Redes de poder no reinado de Sancho II (1223-1248), Ude Lisboa, FdeLetras, DdeHistória, Tese de Doutoramento em História, História Medieval, 2003, Wikipedia.

Cortesia de Ude Lisboa/ FdeLetras/ DdeHistória/JDACT