Cortesia
de wikipedia e jdact
«(…) Tom sentou-se subitamente na
pilha de madeira. Perguntou-se o que tinha dado nele. Fora loucura desafiar
lorde William daquele jeito. Sorte sua estar vivo. O tropel do cavalo de
batalha de William diminuiu de volume, transformando-se num trovão distante, e o
seu escudeiro esvaziou a bolsa em cima de uma mesa. Tom sentiu uma onda de
triunfo, quando os pennies
de prata rolaram à luz do sol. Fora loucura, mas dera certo: tinha
garantido o pagamento justo para si próprio e para os homens que trabalhavam
sob suas ordens. Até mesmo os lordes devem obedecer ao costume, disse, meio
para si mesmo. Agnes o ouviu. Só espero que nunca venha a precisar de lorde
William, disse amargamente. Tom sorriu para a mulher. Era capaz de entender a
grosseria, sabendo que tinha se assustado. Não se preocupe demais, senão nada
lhe restará excepto leite azedo nos seios, quando o bebé nascer. Não serei
capaz de alimentar nenhum de nós a menos que arranje trabalho para o Inverno. O
Inverno está muito longe, disse Tom.
Eles permaneceram na aldeia
durante todo o Verão. Mais tarde, vieram a considerar essa decisão como um erro
terrível; na ocasião, porém, pareceu bastante sensato, pois Tom, Agnes e Alfred
podiam ganhar um penny
por dia cada um trabalhando no campo durante a colheita. Quando chegou o Outono
e tiveram que se mudar, possuíam um saco pesado de pennies de prata e um porco cevado. Passaram a
primeira noite na entrada coberta de uma igreja da aldeia, mas no segundo dia
encontraram um convento e gozaram da hospitalidade dos monges. No terceiro dia
viram-se no coração da floresta Chute, uma vasta área coberta de mato fechado e
muitas árvores, numa estrada não muito mais larga que um carro de boi, com a
luxuriante vegetação do Verão morrendo entre os carvalhos de cada lado. Tom
carregava as ferramentas menores num saquinho e pendurara os martelos no cinto.
Tinha o manto dobrado debaixo do braço esquerdo e o espigão de ferro na mão
direita, usando-o como uma bengala. Sentia-se feliz por estar na estrada de
novo. Seu próximo trabalho poderia ser na construção de uma catedral. Poderia
tornar-se mestre pedreiro, permanecer ali o resto da vida, e construir uma
igreja tão maravilhosa que lhe garantisse um lugar no céu.
Agnes levava as poucas coisas de
casa que tinham dentro da panela que amarrara nas costas. Alfred carregava as
ferramentas que usariam para construir uma nova casa em algum lugar: um
machado, uma enxó, um serrote, um martelo pequeno, uma sovela para fazer
buracos no couro e na madeira e uma pá. Martha era pequena demais para carregar
qualquer coisa, excepto a tigela e a faca amarradas no cinto e o manto de
inverno nas costas. Tinha, contudo, a obrigação de conduzir o porco até que
pudessem vendê-lo num mercado.
Tom conservou-se atento em Agnes
enquanto atravessavam aquela interminável floresta. Já passara da metade da
gravidez, e carregava um peso considerável na barriga, assim como nas costas.
Mas parecia incansável. Alfred também estava óptimo: naquela idade os garotos
dispõem de mais energia que capacidade de usá-la. Só Martha se cansava. Suas
perninhas finas eram feitas para as correrias dos seus brinquedos, não para as
longas marchas, e a menina ficava constantemente para trás, fazendo com que os outros
tivessem que parar e esperar por ela e pelo porco. Enquanto caminhava, Tom
pensava na catedral que construiria um dia. Começou, como sempre, imaginando
uma passagem em arco. Era muito simples: dois pilares sustentando um
semicírculo. Imaginou depois um segundo conjunto exactamente igual ao primeiro.
Colocou os dois juntos, na sua cabeça, para formar uma passagem em arco. Depois
acrescentou outro, e mais outro, muitos mais, até que tinha toda uma fileira,
formando um túnel. Essa era a essência de um prédio, pois tinha um tecto para
não deixar entrar chuva e duas paredes para sustentar o tecto. Uma igreja não
passava de um túnel, com refinamentos». In Ken Follett, Os Pilares da Terra, 1989,
Editorial Presença, 2007, ISBN 978-972-233-788-5.
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