«(…) Mas o que tudo isso tem a ver com o Santo Graal? Tudo. O Graal tem muitas formas e atributos, como será revelado. Contudo, em qualquer forma que seja retratada, a busca do Graal é regida por um dominante desejo de honesta conquista. É a rota pela qual todos podem sobreviver entre os fortes, ou adequados, pois ele é a chave da harmonia e unidade em todo estado social e natural. O Código do Graal reconhece o avanço por mérito e respeita a estrutura da comunidade, mas acima de todas as coisas, ele é inteiramente democrático. Seja apreendido na sua dimensão física ou espiritual, o Graal pertence tanto a líderes como a seguidores, determinando que todos devem ser como um, em serviço comum e unificado. Para alguém pertencer aos fortes, deve estar plenamente informado. Só por meio da conscientização podem ser feitas preparações para o futuro. O regime ditatorial não é uma rota de informação; é uma constrição com o objectivo de impedir o livre acesso à verdade. A quem, portanto, serve o Graal? Ele serve àqueles que, apesar dos contratempos, buscam, pois são os campeões do iluminismo.
Ídolos pagãos do cristianismo
No decorrer de nossa jornada,
confrontaremos um número de afirmações que podem, a princípio, parecer
assustadoras, mas isso costuma acontecer quando se traz a história de volta às
suas bases, pois a maioria das pessoas é condicionada a aceitar determinadas
interpretações da história como factos. Muito do que aprendemos de história é
por meio de propaganda estratégica, seja ela motivada pela Igreja ou por
política. Tudo é parte do processo de controle; separa os mestres dos servos e
os fortes dos fracos. A história política tem sido escrita por seus mestres: os
poucos que decidem o destino e a sina dos muitos. A história religiosa não é
diferente, pois seu desígnio é implementar o controle pelo medo do
desconhecido. Dessa forma, os mestres religiosos retiveram sua supremacia à
custa de devotos que genuinamente buscam iluminação e salvação. Quanto à história
política ou religiosa, é evidente que os ensinamentos estabelecidos chegam às
raias do fantástico, mas mesmo assim raramente são questionados. Quando estes
são menos do que fantásticos, porém, costumam parecer tão vagos que quase não
fazem sentido, se examinados em qualquer nível de profundidade.
Em termos bíblicos, nossa busca
do Graal começa com a Criação, conforme definida no livro do Gênesis. Em 1779,
um consórcio de livreiros de Londres publicou uma obra gigantesca com 42 volumes,
Universal History, que viria a ser muito reverenciada e que afirmava, com
grande grau de convicção, que o trabalho de Criação de Deus começou em 21 de Agosto
de 4004 a.C. Surgiu, então, um debate a respeito do mês exacto, pois alguns
teólogos achavam que 21 de Março seria uma data mais precisa. Todos
concordavam, porém, que o ano estava correcto, e aceitavam que só seis dias
tinham passado entre o nada cósmico e o surgimento de Adão. Na época da
publicação, a Inglaterra se via no meio da sua Revolução Industrial. Era um
período instável de extraordinárias mudanças e desenvolvimentos, mas, assim
como no acelerado ritmo dos avanços da actualidade, pagou-se um preço. As
preciosas artes e técnicas de outrora se tomaram obsoletas diante da produção
em massa, e a sociedade se reagrupava para acomodar uma estrutura comunitária
com base na economia. Uma nova estirpe de vencedores emergia, enquanto a
maioria da população cambaleava num ambiente desconhecido que nada tinha a ver
com os costumes e padrões da sua educação. Certo ou errado, esse fenómeno é
chamado de Progresso, e o seu critério inflexível é aquele preceito do naturalista
inglês Charles Darwin: a sobrevivência do mais forte.
O problema é que as chances de
sobrevivência das pessoas costumam diminuir quando elas são ignoradas ou
exploradas pelos seus mestres: aqueles mesmos pioneiros que forjam a rota do progresso,
auxiliando (mas não garantindo) apenas a sobrevivência própria. É fácil vermos
hoje que a História Universal de 1779 estava errada. Sabemos que o mundo não
foi criado em 4004 a.C. Sabemos também que Adão não foi o primeiro homem na
Terra? Essas noções arcaicas já estão ultrapassadas; mas para as pessoas no fim
do século XVIII, essa impressionante história era o produto de homens mais
esclarecidos do que a maioria e, portanto, presumivelmente correcta. Vale a
pena, portanto, fazermos a nós mesmos a seguinte pergunta, neste estágio: quantos
factos aceitos pela ciência e pela história actualmente também serão
considerados ultrapassados à luz de futuras descobertas? Dogma não é
necessariamente verdade; é apenas uma interpretação fervorosamente divulgada da
verdade, com base nos factos disponíveis. Quando novos factos influentes são
apresentados, o dogma científico muda naturalmente, mas isso é raro de
acontecer com o dogma religioso. Neste livro, estamos particularmente
interessados nas atitudes e ensinamentos de uma Igreja Cristã que não presta
atenção a descobertas e revelações, e que ainda mantém boa parte do dogma
incongruente que remonta a tempos medievais. Como observou astutamente H. G.
Wells no início da década de 1900, a vida religiosa das nações ocidentais subsiste
numa casa da história construída sobre areia. A teoria da evolução de Charles
Darwin em The Descent of Man, em 1871 não causou nenhum dano pessoal a Adão,
mas a ideia de que ele seria o primeiro ser humano caiu por terra. Como todas
as formas de vida orgânica no planeta, os humanos evoluíram por mutação
genética e selecção natural, no decorrer de centenas de milhares de anos. O
anúncio de tal facto encheu de horror a sociedade, orientada pela religião.
Alguns simplesmente se recusavam a aceitar a nova doutrina, mas muitos caíram
no desespero. Se Adão e Eva não eram os pais primordiais, não havia Pecado Original
e, portanto, o próprio motivo do perdão não tinha fundamento! A maioria
entendera de maneira completamente errada o conceito de Selecção Natural. As
pessoas deduziam que, se a sobrevivência era restrita aos mais fortes, então o
sucesso devia depender de superar o próximo! Estava nascendo uma nova geração,
céptica e cruel. O nacionalismo egotista florescia como nunca antes na
história, e as divindades domésticas eram veneradas como, no passado,
adoravam-se os deuses pagãos. Símbolos de identidade nacional (como Britannia e
Hibernia) se tomaram novos ídolos do Cristianismo». In Laurence Gardner, A Linhagem
do Santo Graal, 2004, Editora Madras, 2004, ISBN 978-857-374-882-6.
Cortesia de EMadras/JDACT
JDACT, Laurence Gardner, Literatura, Religião,