terça-feira, 20 de julho de 2021

Aposta Indecente. Matilda Wright. «Quanto à senhora..., creio, o convento das Franciscanas Descalças ou qualquer outro que acolha viúvas pobres servirá perfeitamente. Vou pensar nisso!»

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«(…) Não que eu saiba. Mas o senhor Legrand, o tabelião perante quem Duvernois assinou esta infâmia poderá informá-lo melhor do que eu. Louis fingiu não ouvir este último comentário da jovem viúva e continuou a fazer perguntas sobre Saint-Cast-le-Guido. É uma propriedade grande? Não, de maneira nenhuma. É uma pequena casa de pedra com um jardinzinho, à beira-mar. A irritação de Louis aumentou. Não bastava a altivez e o desprezo com que aquela mulher lhe falava, agora descobria que o património de Duvernois estava longe de chegar aos dois bilhões de francos que o tabelião lhe devia. Quem vive no prédio da Rue des Rosiers? O judeu que tem a padaria no térreo e a sua família. E quanto pagam de aluguel? Não sei lhe dizer. vejo que não está disposta a colaborar na resolução deste assunto, disse Villeclaire, com rispidez. Catherine pôs-se de pé e retrucou, furiosa, separando as palavras com uma breve pausa, como se falasse com alguém que tivesse dificuldade em entender o que lhe diziam: não sei responder!

Louis levantou-se e passeou pela sala, a grandes passadas, com as mãos atrás das costas. Tinha mais problemas para resolver do que gostaria. E precisava ir ao Vale do Loire urgentemente. Que grande golpe! Eis o que pretendo, minha senhora: vou imediatamente ao cartório onde essa escritura que tem nas mãos foi assinada pelo seu marido e passarei imediatamente para meu nome todos os bens que lhe pertenceram. Os dois criados desta casa e o escrivão receberão indenizações e cartas de recomendação e, hoje mesmo, estarão livres para procurarem outras colocações. Quanto à senhora..., Louis olhou mais uma vez para ela e não descobriu uma sombra de medo. Muito pelo contrário, continuava a fitá-lo, desafiadora. Quanto à senhora..., creio, o convento das Franciscanas Descalças ou qualquer outro que acolha viúvas pobres servirá perfeitamente. Vou pensar nisso! Entretanto, enquanto vou ao cartório, deixarei o meu cocheiro aqui na porta e antes que eu próprio tenha tratado de todos os papéis, estará aqui um polícia, por isso, não tente fugir ou tirar de casa coisas que, de facto, já há uma semana me pertencem. Se esperei estes dias para lhe dizer foi porque decidi respeitar o seu luto, podia ter passado todos estes bens para meu nome sem sequer lhe comunicar.

Catherine esboçou um ligeiro sorriso que pareceu irônico a Louis. Não precisa obrigar um pobre polícia a suportar esta neve, senhor marquês. Nada será tirado desta casa e eu não pretendo fugir. Aguardarei que me diga que convento escolheu para mim uma vez que, agora, sou também uma coisa sua, disse-o como se lhe desse uma bofetada, com um tom cortante e desabrido. Tenha uma boa tarde, madame Duvernois, disse Louis, e saiu irritado, a caminho do cartório, pensando que tudo teria sido mais fácil se a viúva do tabelião fosse uma velhota simpática e bondosa. Muito provavelmente teria até gostado dela e o seu bom coração teria amolecido, acabando por instalar a senhora num dos bonitos apartamentos que possuía nos Champs Ely sées. Mas aquela jovem tão bela quanto desafiadora ia ter o que merecia...» In Matilda Wright, Aposta Indecente, 2011, Editor Livros d’Hoje, Publicações dom Quixote, 2011, ISBN 978-972-204-776-0.

Cortesia de Ld’Hoje/JDACT

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