Isabel. Maio de 1588
«(…) Levantei a mão para calá-lo
por um instante e disse: mais tarde. Por enquanto temos que decidir a
implantação de nossos recursos gerais. Assim, almirante Howard, você recomenda
dois esquadrões separados de navios? Não seria melhor posicioná-los todos na entrada
do Canal? Não. Se eles passarem por nós lá, terão o resto do caminho livre. Tomarão
o Canal, a menos que já estejamos esperando por eles mais adiante. Não acho,
interrompeu Drake. Quieto!, silenciei-o. E as nossas forças de terra? O que diz,
primo?, perguntei para Henry Carey, lorde Hunsdon. Era um homem grande que me
fazia lembrar um urso, e como tal parecia pertencer à natureza. Fora responsável
pelas Marchas do Leste, montando sua base próxima à fronteira escocesa. Serei
responsável pela sua segurança, disse. Terei forças com base em Windsor. Caso
as coisas fiiquem mais..., incertas..., posso garantir-lhe um local seguro no
interior. Nunca me esconderei no interior!, respondi. Mas Vossa Majestade deve
pensar no seu povo, insistiu Walsingham. Deve designar substitutos para
supervisionar a administração de suprimentos e para o controle dos preparativos
defensivos, ao mesmo tempo em que cuida de si mesma. Pelo amor de Deus!,
gritei. Eu mesma supervisionarei tudo isso! Mas isso não é aconselhável, disse
Burghley. E quem é contra?, indaguei. Comando este reino e não devo em hipótese
alguma delegar seu alto-comando a outros. Ninguém se preocupa mais com a
segurança do meu povo do que eu. Mas a senhora não é..., Leicester tentou
iniciar um contra-argumento. Competente? É isso o que você acha? Guarde sua
opinião para si mesmo! Ah, ele me enlouquecia às vezes! E só ele se sentia
seguro o suficiente para expressar sua péssima opinião sobre mim como líder de
guerra.
Agora, e o restante das forças? Virei-me
para Hunsdon e perguntei: quantos homens conseguiremos reunir? Nos condados do
sul e do leste, talvez uns 30 mil. Mas muitos são garotos ou velhos. E muito
mal treinados. Medidas defensivas?, perguntei. Farei com que algumas das pontes
antigas sejam demolidas e podemos colocar barreiras no Tamisa para impedir que
a Armada navegue até Londres. Lamentável, esbravejou Drake. Se a Armada chegar
assim tão longe, será única e exclusivamente porque eu, John Hawkins, Martin Frobisher
e o grande almirante aqui presente estaremos mortos. Aquela era uma observação
importante. Fiz um gesto com as mãos para que eles ficassem
quietos. Fechei os olhos e tentei organizar meus pensamentos, procurando
entender tudo o que havia sido dito. Muito bem, sir Francis Drake, concordei. Vou permitir a sua estratégia.
Navegue até ao sul para enfrentar a Armada. No entanto, deve retornar no mesmo
instante em que sentir que estamos em perigo. Quero todos os navios aqui para
enfrentar o inimigo se ele vier. Encarei os olhares dos demais, fixos em mim e
continuei a delegar: almirante Howard, deve comandar o esquadrão oeste, com
base em Plymouth. Além disso, será comandante-geral das forças tanto em terra quanto
em mar. Seu navio será o Ark. Drake será seu segundo comandante. Se importa,
Francis? O almirante Howard será seu oficial comandante. Drake concordou. Lorde
Henry Seymour, cujo posto habitual é almirante dos mares estreitos, comandará o
esquadrão leste em Dover. Olhei para Hunsdon e disse: lorde Hunsdon, você
comandará as forças responsáveis pela minha segurança, com base próxima a
Londres. Nomearei a família Norris, sir
Henry o pai e seu filho sir John, vulgo Black Jack, como general e sub-general
dos condados do sueste. O jovem Robert Cecil será mestre de artilharia do exército
principal. E você, falei, olhando directamente para Robert Dudley, lorde
Leicester, será tenente-general das forças de terra para a defesa do reino. Sua
expressão era de espanto, assim como a dos demais. Faça melhor do que fez nos
Países Baixos, foi minha resposta ao insulto anterior.
Enquanto saíam, percebi que
estavam surpresos, e aliviados, por termos todas as nomeações feitas. Bons
guerreiros que eram já estavam com o pensamento no campo de batalha e no
trabalho que teriam pela frente. Finalmente anoitecia, o silêncio da noite caía
como uma chuva leve e, enfim, conseguiria descansar. Meus
aposentos, de frente para o rio, foram invadidos pelos reflexos
da luz do sol por alguns instantes, antes que o brilho dourado desaparecesse.
Ainda acariciavam o retrato da minha falecida irmã, a rainha Maria, pendurado
na parede na minha frente». In Margaret George, Isabel I, O Anoitecer de
um Reinado, tradução de Lara Freitas, Geração Editorial, 2012, ISBN
978-858-130-076-4.
Cortesia de GeraçãoE/JDACT
JDACT, Margaret George, História, Literatura, Saber,