«(…) A primeira conquista no além-mar obrigou à preparação de
uma frota capaz de transportar numeroso exército equipado com armas e
abastecimentos. Foi necessário mandar construir, comprar e alugar muitos
navios. As notícias da época registam galés, galeões, naus, barcas, fustas,
cocas e barinéis, entre outros, cuja variedade revela a inexperiência neste
género de combate, a insuficiência dos recursos e a dispersão dos seus locais
de origem. Sabemos que alguns vieram do estrangeiro, pelo menos da Galiza,
Biscaia, Bretanha, Inglaterra e Flandres. Parte do exército era constituído
pelos portugueses que participaram nas guerras com Castela; esse treino militar
deveria ser sensível, sobretudo, ao nível dos comandos, como o demonstra a
presença do próprio rei João I, do condestável Nuno Álvares Pereira e homens
encanecidos cuja memória perdurou no parecer de João Gomes Silva, alferes do
Reino: Ruços, além! É conhecida a presença de estrangeiros na expedição,
entre os quais ingleses, alemães, polacos e franceses, que, tal como o exército
português, ignoraram, até à passagem por Lagos, qual o destino final da empresa
a que prestavam colaboração. A frota foi reunida em duas cidades, Lisboa e
Porto, que desta forma assumiam simultaneamente o papel de centros mais
importantes do País. A expansão obrigava os Portugueses a acantonarem-se
próximo do mar, gerava os seus pólos mais dinâmicos e iniciava o virar de
costas a Castela, que perdurou até aos nossos dias. O infante Pedro, filho
segundo, ocupou-se dos preparativos em Lisboa e o infante Henrique, filho
terceiro, no Porto; o Rei e o herdeiro do trono assumiram a direcção da
empresa.
Depois de reunida a frota em Lisboa, um infausto acontecimento poderia ter alterado o plano da expedição: em 18 de Julho faleceu de peste a rainha Filipa de Lencastre, que, antes de morrer, abençoara a expedição. A vontade política era tão determinada que apenas cinco dias mais tarde foi dada ordem de partida; no dia 25 de Julho os navios deixaram a barra do Tejo. Em 27 de Julho, em Lagos, pela voz do capelão real frei João de Xira, foi anunciado o destino da frota: Ceuta. A cidade africana foi presa fácil dos Portugueses, bem preparados para a sua conquista. O Rei e o infante Pedro foram cruzar o mar em frente da cidade, em manobra de diversão; o infante Henrique comandou as forças que desembarcaram no lado do morro de Almina e entrou na cidade. Era o dia 21 de Agosto de 1415, verdadeiro acto do nascimento da expansão portuguesa. Os vencedores, senhores da cidade, saquearam as casas, quintais e terrenos, à procura de riquezas; parece que a colheita foi rendosa porque o assédio não fora esperado pelos Mouros e estes pouco tempo tiveram para fugir. A mesquita foi limpa e consagrada a Nossa Senhora da Assunção. No minarete colocaram-se dois sinos encontrados na cidade e outrora roubados em Lagos pelos corsários. Seguiu-se a cerimónia de armar cavaleiros os infantes e muitos outros nobres: feliz ocasião de honrar a nova geração do poder e os altos infantes que asseguravam o futuro da dinastia iniciada por João I, a cujo título de rei de Portugal e do Algarve era agora acrescentado o do senhor de Ceuta». In António Dias Farinha, Os Portugueses em Marrocos, Instituto Camões, Colecção Lazúli, IAG, Artes Gráficas, ISBN 972-566-206-7.
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