Karlruhe. Alemanha, Dezembro de 1649
«(…) Enquanto a obra História de Óbidos jazia no armário do
espaço anexo da sala de leitura do Arquivo Distrital, O Tesouro Perdido de
Óbidos passeava nas ruas da cidade, dentro do saco do Historiador. Há-de estar
nestas páginas aquilo que procuro... Que sempre procurei, aliás!. O Historiador
perscruta um qualquer restaurante típico nas ruelas que percorria em direcção à
zona ribeirinha. Detém-se a ver o cardápio numa travessa, num ponto onde via o
brilho das águas do Douro e as cores das pequenas embarcações que as navegavam.
Entra e senta-se numa das mesas singulares da sala. É cumprimentado e
cumprimenta o empregado, pedindo-lhe no imediato uma dose de Lulas à Bulhão
Pato e um jarro de vinho branco.
Enquanto
trincava umas azeitonas e um pedaço de pão, pensava onde iria a seguir. Ao fim
da tarde apanharia o comboio para Lisboa, e o tempo já não era muito. Já ouviu
falar de Bernardo Faria? Comerciante de antiguidades?, pergunta Carlos Nóbrega
ao empregado, enquanto este pousava a travessa na mesa.
Assim
de repente... Não. Nunca ouvi falar. Mas pergunto já ao meu patrão. Pouco tempo
após o Historiador ter atacado as lulas, o dono do restaurante aproxima-se da
sua mesa. Boa tarde. Então as lulas? Deixam-se comer? Boa tarde, cumprimenta
também o comensal, limpando a boca. Estão muito boas, obrigado. Então o senhor
procura Bernardo Faria? Sim, sim. Tinha um encontro marcado com ele... Há vinte
anos! Pois... Acredito que sim, porque o velho Bernardo Faria, comerciante de
antiguidades, faz agora oito anos que se finou. Ah... Entendo..., exterioriza o
Historiador com desalento. Era amigo dele?, pergunta o outro. Pode dizer-se que
sim... Era. A família vive em Campanhã. Ele tinha lá casa, onde estão agora os
filhos. Por acaso não sabe a morada, sabe?
Não,
não. Isso não lhe consigo dizer. Mas lá, perto da estação do comboio, toda a
gente lha saberá dizer. O senhor Bernardo era uma daquelas figuras icónicas de
uma terra. O homem corria o país com a tralha às costas. Esteve aqui no meu
restaurante algumas vezes, eu próprio lhe comprei várias coisas... Alguma vez
lhe comprou livros?... Não, isso não. Não sou muito dado à leitura. Olhe, por
exemplo aquela velha peneira que ali está, Carlos Nóbrega olha para o pedaço de
parede para onde o homem apontava, da qual pendia um deteriorado exemplar desse
objecto tão usado outrora pelos moleiros. Olhe, muito obrigado pela informação.
Vou então terminar o meu almoço... Continuação de bom apetite, e volte sempre,
diz o homem, retirando-se para o interior do grande balcão.
Quando
a conta chega à mesa, são quase 15h00. Mesmo que não faça mais nada, que não vá
a mais lugar algum, tenho que saber o que aconteceu ao negócio do homem. O
Historiador deixa sobre a mesa 15€ para pagar os 13,75€ da refeição,
despedindo-se do empregado e do
patrão, reiterando os agradecimentos pela simpatia, agradecimentos retribuídos
pelos dois homens.
Após ter caminhado ainda um bom bocado, apanhara um táxi assim que
lhe fora possível, pedindo ao taxista que o levasse até à estação de S. Bento.
O mal-humorado condutor deixara-o à porta do edifício e arrancara de forma
abrupta mal o homem fechara a porta do carro. Ao chegar à plataforma da
estação, uma composição do metro de superfície estava a entrar no túnel de
saída do espaço, dali, no
máximo, a dez minutos, uma outra
composição o levaria na mesma direcção. Carlos Nóbrega senta-se num dos bancos
junto a uma das linhas e abre um pouco do saco, vislumbrando cerca de dois
terços da lombada da obra que transportava, na certeza que encerrava nas suas
páginas todas as peças que ainda não conseguira encontrar para terminar o
puzzle do tesouro deixado em Óbidos pelos rosacrucianos alemães». In Jorge Durão, A Herança de Rosa-Cruz,
O Tesouro Perdido de Óbidos, Edição do Autor, 2013, ISBN 978-989-866-401-3.
Cortesia de JDurão/JDACT
JDACT, Jorge Durão, Óbidos, Literatura,