domingo, 25 de fevereiro de 2024

Idade Média. Umberto Eco. «… o pacto firmado com os ostrogodos, só acolhidos depois da queda do império dos hunos, em 456-457, entre o rio Sava e o rio Drava. O domínio das populações germânicas sobre o território só gradualmente se torna mais completo…»

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Da Queda do Império Romano do Ocidente a Carlos Magno

A instalação dos bárbaros

«Diferente é, pelo contrário, a génese dos reinos romano-bárbaros no território continental. Estes reinos não surgem da ocupação por potências estrangeiras de uma zona precedentemente imperial, mas estabelecem-se no território na sequência de negociação de foedera, instrumentos diplomáticos em uso desde o alto império, por meio dos quais Roma se intromete nas questões internas das tribos germânicas residentes fora das estremas imperiais. A partir da época de Marco Aurélio (121-180, imperador desde 161), inicia-se, de facto, o costume de acolher, no território do império, bárbaros inquilini, isto é, cultivadores ligados à terra; no tempo de Diocleciano junta-se-lhe o uso de os receber como læti e gentiles, cultivadores semilivres, vinculados a obrigações militares e talvez instalados em terras públicas e organizados, ao contrário dos precedentes, em grupos etnicamente compactos.

De uma ulterior evolução destas práticas, que não constituíram, portanto, uma inovação tardo-antiga, resultam os foedera do século V, que preveem a instalação da população bárbara numa determinada zona do império, em que um soberano governa em vez do imperador e as tropas, bárbaras, devem para todos os efeitos ser consideradas de foederati romanos, em 451, por exemplo, os visigodos combatem ao lado dos romanos contra Átila (?-435) nos Campos Cataláunicos.

A legitimação do poder do rei provém de uma delegação imperial que se concretiza com a recepção não só do título de rex no interior das suas comunidades mas também de um cargo oficial romano que era, em geral, o de magister militum. Estas realidades só são, pois, possíveis no interior do império, onde o elemento bárbaro é sempre muito inferior numericamente ao romano. E também as estruturas fiscais e administrativas romanas são, geralmente, mantidas; a organização provincial, por exemplo, chefiada por duces, mantém-se no reino visigótico, conservando frequentemente nos seus postos os mesmos indivíduos, e, de um modo geral, é dos cargos romanos de dux e de comes que provêm os duques e condes francos e lombardos.

Entre os mais importantes foedera deste tipo são, certamente, de recordar: o que em 382 é negociado por Teodósio I com os godos, a quem é permitido instalar-se na Trácia depois do desastre de Adrianópolis; os dois pactos de 411 e 443, que dão origem aos dois reinos burgúndios; o pacto que em 418 concede aos visigodos, que já em 413 haviam sido autorizados a estabelecer-se na Gália Narbonense, a Aquitânia II, com a inclusão de alguns territórios da Novempopulânia e da Narbonense I, com capital em Toulouse, de onde se expandem até conquistar a Espanha sueva; o que em 435 é concedido aos vândalos, que depois o violam ocupando três províncias da África setentrional; e, por fim, o pacto firmado com os ostrogodos, só acolhidos depois da queda do império dos hunos, em 456-457, entre o rio Sava e o rio Drava.

O domínio das populações germânicas sobre o território só gradualmente se torna mais completo e independente do poder imperial, que continua formalmente superior no plano hierárquico: a autoridade dos reges é-lhes delegada durante todo o século V pela autoridade imperial. Isto vê-se, por exemplo, nas moedas e, em particular, na de ouro: os regna começam mais ou menos imediatamente a cunhar moeda própria, mas fazem-no em nome do imperador, e nem em caso de conflito com o império colocam nas moedas o nome do rex; quando muito, substituem o imperador da época por um dos anteriores, por exemplo, aquele que estabelecera originalmente o foedus. É o caso dos solidi ostrogodos de Totila e de Teia com o busto de Anastácio». In Umberto Eco, Idade Média, Bárbaros, Cristãos, Muçulmanos, Publicações dom Quixote, 2010-2011, ISBN 978-972-204-479-0.

Cortesia de PdQuixote/JDACT

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