Cortesia de jjfilipewordpress
Os Lusitanos
«O povo desde o qual os historiadores têm tecido a genealogia portuguesa está achado: é o dos lusitanos. Na opinião desses escritores através de todas as fases políticas e sociais da Espanha durante mais de 3 mil anos, aquela raça de celtas soube sempre, como Anteu, erguer-se viva e forte; reproduzor-se, imortal na sua essência; e nós os portugueses do século XIX temos a honra de ser os seus legítimos herdeiros e tepresentantes». Com esta ironia encoberta mas grave, fustigava Alexandre Herculano os seus predecessores, historiógrafos nacionais e, segurando com valor a férula magistral, castigava o povo culpado de acreditar numa tradição que tem para o erudito, além de outros defeitos, o de ser recente. Só desde o fim do XV século o nome de lusitani começa a substituir o de portucalenses, nos livros; mas essa inovação, perpetuando-se entre os eruditos, torna-se por fim uma crença nacional e quase popular.
Cortesia de eb23cmdtconceicaosilvarcts
Que valor merece a inovação? Nenhum; e por vários motivos:
- «Tudo falta, a conveniência de limites territoriais, a identidade da raça, a filiação da língua, para estabelecermos uma transição natural entre os povos bárbaros e nós».
Ora estes argumentos, decisivos para o sábio historiador, não nos parece a nós que o sejam. Outro tanto sucede com todas as nações ou quase todas, desde que procuramos estabelecer a árvore genealógica, indo aos arcanos de um passado ignoto reconhecer a fisionomia dos mortos de muitos séculos e determinar de entre eles os primeiros avós de uma nação. Seria absurdo exigir conveniência de limites territoriais, ou por outra, identidade de fronteiras, entre a localização de uma tribo primitiva, e a de uma nação moderna: nem aos povos que hoje mais indiscutivelmente representam, pura, uma raça, poderia fazer-se tal exigência. Se há ou não identidade de raça, é exactamente o problema que deveria agitar-se; e sem isso, negá-lo é proceder dogmática e não cientificamente.
Cortesia de fisicanetcomar
Alega-se que são indecisas as noções de Estrabão com respeito às fronteiras dos lusitanos; diz-se mais que não coincidem com as que Augusto deu à província da Lusitânia. O geógrafo antigo, ora parece incluir os calaicos nos lusitanos, entendendo as fronteiras destes últimos até à costa do norte da Península, ora os separa, dando-lhes o Douro como divisória. A demarcação de Augusto adoptou esta segunda versão. As fronteiras orientais estendiam-se, quer para o geógrafo, quer, depois, para a administração romana, muito além da raia portuguesa, incluindo Salamanca, e subindo quase até próximo de Toledo. Daí para o sul, e depois para o nascente, seguindo o curso angular do Guadiana, os lusitanos de Estrabão e a Lusitânia de Augusto tinham como limite este rio, quase desde as suas fontes, e até a sua foz, na costa do nosso Algarve.
Se ligássemos pois, um valor positivo às resenhas dos antigos geógrafos, e um alcance social-histórico à identidade das fronteiras primitivas e actuais, parece-nos que poucas nações poderiam com melhores motivos achar na etnologia dos antigos o fundamento da sua vida moderna. Alargue-se a fronteira do norte ao Minho, conquista da Lusitânia sobre a Galécia, retraia-se a fronteira de leste ao Douro, conquista da Tarraconenses sobre a Lusitânia, e teremos feito coincidir os antigos com os actuais limites. In História de Potugal, Oliveira Martins, Guimarães e Cª, Editores, 12ª edição, 1942.
Cortesia de Guimarães e Cª, Editores/JDACT