Cortesia de livrariapoetria
Casas, viagens, memórias. Uma cartografia em forma de poema.
«Uma das leituras deste título, Arquitectura do Silêncio, aponta para que estas linhas sejam tanbém uma «construção da morte». A morte surge aqui no sentido do desaparecimento visual (a casa, o avô, a infância) mas sempre com a porta aberta à recuperação possível através da memória.
«toca a mão na madeira (direi porta?)
como se tocasse toda a substância da casa
o seu vento as suas vozes os seus cheiros
os seus objectivos a totalidade do espaço
que se adivinha para além das janelas e das paredes»
Não se trata de uma casa imóvel e vazia mas de uma casa em transformação:
- «por detrás do quotidiano a casa transforma-se, é como se reunisse em si um corpo não somente corpo mas espaço ocasionalmente encoberto sob as formas e constelações da noite».
O poeta viaja «da montanha até ao mar levando no bolso pedaços de palavras» porque a viagem é uma forma de interrogar o mundo.
«tudo o que temos é como o princípio de um cometa
entre as frases e o sabor das mãos
é como chuva fecundando o reflexo das nuvens
fruto que a sede alimenta
entre nossos corpos e a momentânea distância
de uma estrela à outra»
O poeta viaja muitas vezes num comboio e pode, por isso reclamar:
- «não nos tirem daqui esta vidraça, é comboio para um país de nevoeiros, tarde na sombra de uma vírgula ou planeta».
Cortesia de alicerces1
Noutro poema é a estrada que precipita a reflexão.«a estrada ignora a velocidade do automóvel
tal como a sombra parece ignorar a própria árvore
cada viagem por mais curta que seja
é muito mais que o simples retrato do vento».
A viagem pode ter outras formas além da geografia, pode ser uma viagem ao passado como quando o poeta recorda Agostinho da Silva no Jardim do Príncipe Real:
- «não vale a pena transformar em símbolos tudo o que um rosto tem de veio de água, a experiência conta-nos que o fogo está mais longe de mapas infinitos»
Duas «terras pequenas», Coruche e Marvão, são pontos dignos de registo da viagem, são o intervalo entre o Campo e a Cidade.
«nas terras pequenas o tempo transforma-se
o tempo faz-se verso como luva de pelica
e acaricia-nos a cara com o perfume das cores que se movimentam
no reino vegetal».
As casas que perdeu, o olhar do avô, os seus destroços pessoais». In José do Carmo Francisco.
Cortesia de speglich
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