quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Embaixada de D. João V de Portugal ao Imperador Yongheng, da China, 1725-1728: «A morte do soberano chinês e a subida ao trono do seu quarto filho, Yongzheng, que reinou de 1722 a 1735, veio alterar a perspectiva diplomática e o equilíbrio internacional, preocupando notavelmente a corte lusitana»

Cortesia da foriente

A História e a Diplomacia através dos Textos
Retrospectiva histórica da embaixada
«Quando o imperador Kangxi (1654-1722) enviou ao rei D. João V no dia 3 de Março de 1721 o Pe António de Magalhães (missionário em Macau desde 1696 e em Pequim a partir de 1716) em sinal de que entre Portugal e a China as relações podiam continuar no recíproco respeito e com o apoio e a protecção necessários aos jesuítas lusitanos, insinuou-se a possibilidade de reconstituir aquele tecido sociopolítico que a «questão dos ritos» e as divisões internas à mesma igreja tinham profundamente desgastado.
A morte do soberano chinês e a subida ao trono do seu quarto filho, Yongzheng, que reinou de 1722 a 1735, veio alterar a perspectiva diplomática e o equilíbrio internacional, preocupando notavelmente a corte lusitana: as circunstâncias favoráveis aos portugueses iam-se paulatinamente modificando. O desaparecimento de Kangxi e a sua sucessão acabariam por suscitar acontecimentos que produziram na China conflitos, divergências e desequilíbrios políticos.

Afirma o Pe. Magalhães, na qualidade de cronista do texto B, que «não via nos Mandarins aquellas demonstrações, que esperava, e tinha experimentado quando parti para Europa. Estava a differença em que então reynava Cam Hi, e agora Yun Chin». Portugal precisava do seu pequeno recanto de Macau como base económico-política e como ponto de irradiação religiosa para a Ásia. Este território segundo uma definição de Pe. Manuel Teixeira, «na encruzilhada de dois mundos era a charneira de dois impérios, de duas culturas e de duas políticas, profunda e fortemente impregnadas de influência luso-chinesa».

Cortesia de wikipedia

Ao mesmo tempo a Coroa lusitana não podia perder o prestígio que tinha adquirido com paciência e vigor no decurso de séculos de presença no Extremo Oriente. Para consolidar e confirmar o relacionamento com o Império Oriental, D. João V, aceitando a sugestão de António de Magalhães e já anteriormente solicitado pelo procurador de Macau, que tinha pedido ao rei de Portugal que mandasse «um embaixador ao imperador da China para lhe agradecer o bom animo que mostra em rodas as dependências dos portuguezes e consiga ao mesmo sobrano alguns novos privilegios para alguma cidade», organiza uma delicada missão ao extremo leste, que confia a um zeloso diplomata de trinta e oito anos, já secretário da embaixada de Pedro de Vasconcelos em Madrid e com incontestáveis carismas políticos: Alexandre Metelo de Sousa e Meneses.
Para alcançar os efeitos diplomáticos desejados, Alexandre Metelo, cônscio de que a sua missão não ia ser isenta de dificuldades, terá usado de calma, inteligência e prudência. Ele será definido pelo imperador como «homem polido, e sabio, e digno de estimação» e o mesmo Metelo declara que realizou a embaixada «com a mayor felicidade que pudia ser no sistema prezente».

Yongzheng, sempre segundo a narração directa de Alexandre de Sousa e Meneses, parece ter-se apercebido de que o rei «soubera escolher pessoa a prepozito, e que», é o mesmo Metelo que o afirma, «conhecendo o meu talento, me encarregara desta função, a qual eu tinha feyto bellamente, de modo que elle Imperador se achava m.to satisfeyto».
Mas os resultados, que, pela contingência histórica e dificuldades da época, não podiam esperar êxito mais favorável, não corresponderam “in toto” aos esforços empreendidos.

jdact

Um negócio de política internacional. As relações com o Brasil, a Holanda e a China
Tangencialmente às relações com o Oriente, a viagem de Metelo revelou-se também útil, graças às suas escalas técnicas, para reforçar os contactos com o Brasil (onde o grupo ficou na ida 4 meses e l8 dias; e pouco tempo no regresso) e com o governo holandês, ao qual o embaixador deixou em Batávia, actual Djacarta, onde permaneceu um mês, duas cartas da Coroa.
A paragem no Brasil, como se deduz da “Relação” feita por Francisco Xavier da Rua, foi decidida principalmente pelo capitão-de-mar-e-guerra Duarte Pereira e pelo capitão-tenente Henrique Nicolau contra as opiniões, não explicitamente declaradas, quer do embaixador quer do Pe. António de Magalhães, os quais teriam preferido chegar rapidamente à Batávia. No entanto, nesta colónia, 11 anos antes elevada a vice-reino, D. João V tinha de cultivar os interesses financeiros ligados tanto às fontes remunerativas estrangeiras como às novas explorações de metais preciosos. Ao mesmo tempo o rei precisava de manter os equilíbrios políticos internos para encarar as prolongadas guerras civis dos dissidentes locais. Enfim, também com as monarquias estrangeiras a Coroa portuguesa tinha de preservar boas relações, sobretudo para contrariar o poderio francês e holandês sempre às portas do território ultramarino. A escala na «opulenta cidade do Rio de Janeiro», como refere o texto B, tornou-se portanto útil, quer à Coroa, para o relacionamento entre a mãe pátria e a colónia brasileira, quer à embaixada, dada a oportunidade que Metelo logrou de obter subsídios substanciais destinados à prossecução da viagem.

Por outro lado, também com a Holanda D. João V tinha de manter os profícuos contactos já avançados por D. Pedro II e selados pela aliança de 1703, sem por isso ceder às pressões que o governo holandês continuava a exercer na ilha de Timor para a libertar totalmente do domínio português ou aceitar passivamente que os holandeses dominassem nos mares orientais». In Mariagrazia Russo, Embaixada de D. João V de Portugal ao Imperador Yongheng, da China, 1725-1728, Fundação Oriente, 2005, António V. Saldanha, 2005, ISBN 972-785-083-9.

Cortesia de F. Oriente/JDACT